Black Bananas é o nome da banda, Jennifer Herrema é o ícone que a lidera

Conhecemo-la no final dos anos 1980 nos Royal Trux e encontrámos nela alguém que dava voz e corpo ao rock enquanto existência marginal, intensa, excessiva. Estreia-se em Portugal com outra banda, os Black Bananas. Na ZDB este sábado.

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Os Black Bananas com Jennifer Herrema, Kurt Midness e Brian McKinley dr

Herrema, que depois do fim dos Royal Trux, fundou em 2004 os RTX, rebaptizados Black Bananas em 2012, é a voz que se impõe com charme blasé, cool como tudo, é a melómana que sabe citar de cor todas as edições dos Isley Brothers, que conhece todas as bootlegs dos Rolling Stones e toda a discografia metal que (lhe) interessa, é a dona de uma história em que parece ter vivido todas as biografias do rock’n’roll.

Anita Pallenberg e Brian Jones, Betty Davis e os Parliament, Nico e Lou Reed, todos misturados, todos transformados por uma criadora incapaz de seguir o caminho mais próximo entre dois pontos: “Julgo que criei e defini muitos sons diferentes, o género lo-fi e por aí fora. Mas assim que os agarro, abandono-os e sigo em frente. Deixo quase sempre também o público e os fãs. Há fãs e públicos que se mantêm, curiosos com o que virá a seguir. A maioria só quer aquele som preciso de uma canção ou álbum de que decidiram que gostavam”, diz ao PÚBLICO em entrevista por email. Para ela, tudo se resume a esta simples proposição. “Música foi a minha primeira paixão e deu-me a oportunidade de trabalhar nos mais diversos campos criativos, mas a constante é sempre a música”.

Sim, é a música que define Jennifer Herrema em tudo. Há nela um romantismo por toda a iconografia e pela forma como os discos certos e os sons certos podem servir de guias de vida. E por isso Herrema, além de cantora e compositora, foi ao longo dos tempos (ou é ainda) artista plástica, colunista, designer de joalharia ou modelo (foi a heroin chic da Calvin Klein nos anos 1990, quando era literalmente uma heroin chic). Tudo extensões daquela paixão primeira.

Em Jennifer Herrema não há máscara ou filtro. É exactamente a que vemos nas capas dos discos e nos palcos, a que vemos nas fotos de promoção ou em entrevistas em lojas de discos a falar dos N.W.A. ou dos Funkadelic. Será ela, exactamente ela, acompanhada por Kurt Midness e Brian McKinley, que veremos este sábado na Galeria Zé dos Bois (22h, 10€, primeira parte a cargo do noise-rock dos Putas Bêbadas).

Tem agora 42 anos. O mundo mudou e o que aconteceu aos Royal Trux nos anos 1990 quando as editoras nadavam em dinheiro, ou seja, passarem da independente Drag City para a multinacional Virgin, receberem um avanço milionário e construírem com ele um estúdio caseiro, não parece possível. Ao longo dos anos, a sua música foi-se transformando. Sem cedências. Herrema abomina aquele que é o bom gosto instituído. O bom gosto constrói-o ela, alheia a convenções. ”Estou aberta a todos os sons e se um que nunca usei antes é necessário para completar uma canção irei utilizá-lo sem fazer julgamentos sobre o que simboliza”, diz. “Quando comecei os RTX muitas pessoas detestavam hair-metal e metal no geral, mas tinha sido uma grande influência para mim enquanto crescia e não tive receio em reconhecê-lo. Fomos definitivamente gozados e postos de lado em certos circuitos. Agora muita gente decidiu que esses géneros são cool e, apesar de esses elementos ainda estarem presentes na nossa música, já andámos em frente. Tem sido sempre assim comigo”.

O segredo está em não olhar para trás. Jennifer Herrema até nos confessa que ouviu recentemente os seus velhos discos dos Royal Trux (“são melhores do que guardava na memória”) mas estava apenas a cumprir uma obrigação (foram reeditados e havia que autorizar as novas edições). E fala-nos de um projecto baseado na samplagem da sua obra passada, mas isso é trabalho para a reforma, “quando for muito mais velha e estiver preparada para ver a minha vida como uma viagem com uma longa história. Mas ainda sou muito jovem para olhar para trás”.

É curioso como esse trabalho que projecta para o futuro, baseado na sua própria música, nos soa tão próximo daquele que parece ser o seu método criativo. De certa forma, Jennifer Herrema aborda a música como um trabalho de colagem. Rad Times Express IV, o penúltimo álbum, soava a gloriosamente desalinhado cruzamento entre ataque hard-rock desavergonhado e P-funk geneticamente modificado por descarga eléctrica. O último Electric Brick Wall, aquele que será apresentado na ZDB, junta à equação um polvilhado de brilhantes T. Rex (se Marc Bolan se tivesse apaixonado pelo hip hop clássico) e desavergonhado plástico pop. Nunca a vimos assim e, no entanto, nem por um momento duvidamos. Jennifer Herrema permanece. “Que eu prossiga sempre com descontracção e entusiasmo advém da exploração, de acrescentar novos sons e sabores e de combiná-los em novas formas”. Mais tarde, acrescentará: “Nunca pertenci a nenhuma cena ou nenhum grupo específico, portanto nunca senti a pressão de ouvir um determinado tipo de música ou de vestir o uniforme de um género em particular. Criei a amálgama de sons e estilo que me é única”.

Herrema não tem um entusiasmo particular pelo cenário musical actual. “Existe mais gente que nunca a fazer música enquanto mercadoria destituída de relevância, porque há hoje maior procura por música casual e funcional para redes socais e marketing “. Acredita, porém, que as pessoas se fartarão e que tudo isso implodirá. Ela continuará. Talvez a preparar o seu álbum de auto-samplagem. Talvez ainda com os Black Bananas, esses que veremos agora pela primeira vez em Portugal.

“Vamos tocar as canções [do Electric Brick Wall] mas não exactamente como no álbum. Serão mais longas e haverá improvisação em cada uma delas. As canções estarão reconhecíveis, mas não serão tocadas certinhas”. Não desejaríamos outra coisa. Surpreender é preciso. E Jennifer Herrema, que conhecemos tão bem, sabe como fazê-lo.

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