Escócia e Inglaterra: Séculos de rivalidade acabaram num casamento sem amor

No passado a Escócia também foi uma nação dividida quanto à sua união com o vizinho grande do sul

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Muitos escoceses consideram a união com Inglaterra "um acordo ilegítimo" Suzanne Plunkett/Reuters

Grande parte da história escocesa foi escrita no confronto com o seu maior vizinho. E aconteça o que acontecer no dia 18 de Setembro, dia do referendo, a Escócia vai continuar a ter a Inglaterra a influenciar-lhe o destino.

Embora seja difícil definir exactamente a quando remonta a origem da Escócia, sabe-se que os romanos ergueram a Muralha de Adriano no ano 122 para se protegerem das tribos caledónias e marcar a fronteira norte da Inglaterra.

Cerca de 700 anos depois, face à crescente força ameaçadora dos vikings, Kenneth MacAlpin ou Kenneth I, conseguiu unir os Pictos e os Escotos e ficou para a história como o fundador da monarquia escocesa.

Chamado a arbitrar a sucessão dinástica escocesa, o rei de Inglaterra, Eduardo I proclama a sua suserania e invade a Escócia em 1296, dando o tiro de partida para as guerras da independência que vão durar até 1357, já depois da vitória esmagadora do exército escocês liderado por Robert Bruce contra os ingleses na batalha de Bannockburn, em 1314. A Escócia recupera a sua independência.

Em 1502, o tratado de paz perpétua, assinado por James IV da Escócia e Henrique VII de Inglaterra, tem por objectivo por termo aos combates esporádicos entre os dois Estados. Para selar o pacto, Henrique VII oferece em casamento a sua filha Margarida ao rei da Escócia.

Cem anos depois, em 1603, o rei James VI da Escócia torna-se também James I de Inglaterra, sucedendo a Isabel I. Proclamando-se rei da Grã-Bretanha, o monarca escocês instala-se em Londres, embora as duas nações permaneçam independentes.

Foi por interesse
No início do século XVIII, depois de longas negociações, o Tratado da União que dá à luz o Reino Unido é assinado, em 1707. Chris Whatley, professor de História escocesa na Universidade de Dundee, explica que o debate sobre esta união foi tão intenso na altura como está a ser agora.

“A Escócia é hoje uma nação dividida. Na altura, estava também profundamente dividida sobre a sua relação com Inglaterra”, explica. “Penso que havia boas razões para selar a união em 1707. Não foi uma decisão popular na altura, mas foi tomada tendo em conta os interesses da Escócia.”

“Havia uma profunda preocupação, entre as classes dirigentes escocesas, de que a Escócia ficasse atrasada em relação ao resto da Europa”, num contexto de desenvolvimento do comércio internacional. Isto porque “os escoceses não tinham uma marinha capaz de dar assistência aos seus navios mercantes em alto mar (…). Eles não tinham também um império colonial, a Inglaterra sim.”

Se a Escócia não retirou imediatamente frutos da adopção da bandeira britânica, também não teve que esperar demasiado para prosperar muito para além do que se poderia esperar, visto o seu tamanho.

Para além do importante papel que desempenhou na conquista e administração do império britânico, o engenho dos escoceses conduziu à invenção do telefone, da televisão, da penicilina, do radar, dos motores a vapor e dos impermeáveis Mackintosh… para citar apenas alguns exemplos.

No entanto, na opinião pública ao longo dos anos, a união manteve-se sempre como “um acordo ilegítimo, imposto aos escoceses por políticos desonestos”, acrescente o professor Whatley.

Tom Devine, um dos mais prestigiados historiadores escoceses, pensa que com o fim do Império britânico, o declínio do protestantismo e os poderes que já foram transferidos para Edimburgo, a necessidade de uma união anglo-escocesa já não tem razão de ser.

“A união da Inglaterra e da Escócia não foi um casamento por amor. Foi um casamento por interesse. Foi uma decisão pragmática”, disse Devine em declarações ao jornal Guardian. “Entre 1750 e 1980 a relação foi estável. Mas hoje em dia, as bases que fizeram essa estabilidade desaparecerem ou estão muito desvanecidas”, conclui o historiador.

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