Ucrânia pede ajuda internacional para combater "entrada de tropas russas"

Separatistas têm agora como objectivo a cidade de Mariupol, no Sudeste. NATO divulga novas imagens do que diz ser a presença militar russa em território ucraniano.

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Bombardeamentos em Donetsk nesta quinta-feira fizeram pelo menos 15 mortos FRANCISCO LEONG/AFP
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Imagens da Reuters mostram o que a agência diz ser veículos militares russos a saírem da Ucrânia Maria Tsvetkova/Reuters
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Novas imagens divulgadas do que a NATO diz ser um comboio de veículos militares russos na Ucrânia NATO
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Duas campas na região russa de Pskov que alguns habitantes locais acreditam conter corpos de pára-quedistas russos que combateram na Ucrânia Dmitri Markov/Reuters
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Funionários do Governo russo distribuem ajuda humanitária a refugiados ucranianos na Rússia ANDREI KRONBERG/AFP
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Manifestação anti-Rússia em Mariupol ALEXANDER KHUDOTEPLI/AFP

As acusações dos principais líderes ucranianos surgiram depois de uma entrevista do novo primeiro-ministro da autoproclamada República Popular de Donetsk, Aleksander Zakharchenko – um ucraniano que há três semanas substituiu nesse cargo o russo Aleksander Borodai.

Em declarações ao canal público russo Rossiya 24, Zakharchenko revelou que entre 3000 e 4000 soldados russos combateram ao lado dos separatistas desde o início da guerra no Leste da Ucrânia, em inícios de Abril, mas voltou a usar uma linguagem cuidadosa para não implicar no conflito o Presidente Vladimir Putin.

"Há soldados [russos] no activo que preferiram passar as suas férias a combater entre nós, entre os seus irmãos, do que na praia", disse o líder separatista – há uma diferença entre dizer que há soldados russos a combater de forma voluntária e soldados russos a combater por ordem directa do Presidente russo, o que permite a perpetuação da discussão sobre o que pode ser considerado uma interferência directa da Rússia.

Para além da guerra no terreno, há também uma guerra de informação e desinformação que torna difícil saber por onde anda a verdade, enquanto morrem centenas de civis e centenas de milhares são obrigados a procurar refúgio ou na Rússia ou em regiões ucranianas longe de Donetsk e Lugansk, até agora palcos dos combates mais sangrentos – ainda nesta quinta-feira, pelo menos 15 civis foram mortos em bombardeamentos em Donetsk.

Já em finais de Maio, durante uma batalha pelo controlo do aeroporto de Donetsk, pelo menos três dezenas de cidadãos russos foram mortos quando lutavam contra o Exército ucraniano, mas a versão oficial dos separatistas e do Kremlin tem sido sempre a mesma: se há russos a combater no Leste da Ucrânia, eles estão lá por sua livre vontade – são voluntários; quando as forças ucranianas capturaram dez pára-quedistas russos, na segunda-feira passada, foi porque eles se perderam e entraram em território ucraniano "sem intenção".

Devido à sua situação precária, o Exército ucraniano é também ajudado por voluntários, que combatem em vários batalhões, como o Donbass, o Azov ou o Dnipro. Apesar de a esmagadora maioria destes voluntários ser de origem ucraniana, no dia 20 de Agosto foi notícia a morte de Mark Gregory Paslawsky, de 55 anos, um antigo militar norte-americano nascido em Nova Iorque e que vivia na Ucrânia há duas décadas.

Novo objectivo é Mariupol
Não obstante os indícios de que o Exército ucraniano estava a alcançar uma superioridade militar em Donetsk e Lugansk, a verdade é que os separatistas lançaram, nos últimos dias, uma ofensiva mais a sul, conquistando uma parte importante da cidade de Novoazovsk.

É a partir desta cidade com cerca de 13.000 habitantes, situada na costa do mar de Azov e a apenas 20 quilómetros da fronteira com a Rússia, que os separatistas pretendem forçar o seu caminho até Mariupol, uma cidade com meio milhão de habitantes que tem servido de base às forças ucranianas na província de Donetsk.

Foi o próprio primeiro-ministro da autoproclamada República Popular de Donetsk quem confirmou essa estratégia, na entrevista ao canal Rossiya 24: "Se tomarmos Mariupol, a segunda maior cidade da região de Donetsk, isso permitir-nos-á expandir as nossas unidades com mais 5000 ou 7000 pessoas."

Com um eventual sucesso militar em Mariupol, os separatistas poderiam depois seguir mais para oeste, em direcção à Crimeia, a península anexada pela Rússia em finais de Março, o que lhes daria o controlo do petróleo e das riquezas naturais de todo o mar de Azov.

Este cenário – mas, acima de tudo, a acusação da Ucrânia, dos Estados Unidos e da NATO de que a Rússia tem soldados e equipamento militar em território ucraniano – deixa a União Europeia numa posição delicada, poucos dias depois de a chanceler alemã, Angela Merkel, ter ido a Kiev dizer que não há uma solução militar para este conflito e que todas as partes devem cessar de imediato as hostilidades, num apelo implícito a um cessar-fogo que o Presidente ucraniano continua a recusar.

Foi neste contexto que Petro Poroshenko decidiu nesta quinta-feira cancelar uma visita oficial à Turquia e anunciar uma reunião de emergência do seu Conselho de Defesa e Segurança Nacional.

"Tomei a decisão de cancelar a minha visita de trabalho à República da Turquia devido ao acentuado agravamento da situação na região de Donetsk, particularmente em Amvroiivka e Starobeshev, porque foram trazidas tropas russas para a Ucrânia", lê-se num comunicado do Presidente ucraniano.

No final da reunião do Conselho de Defesa e Segurança Nacional foi anunciado que a Ucrânia irá reintroduzir o recrutamento obrigatório, salientando que os futuros convocados não serão enviados para a frente de batalha no Leste do país.

Ao longo do dia foram várias as declarações de responsáveis ucranianos com apelos ao endurecimento da posição dos Estados Unidos e da União Europeia – o embaixador da Ucrânia na UE, Konstantin Elisseiev, chegou a pedir "uma ajuda militar urgente".

Mais ciente do caminho que os seus parceiros ocidentais estão dispostos a trilhar, o primeiro-ministro interino, Arseni Iatseniuk, manteve-se longe de apelos bélicos, mas pediu algo que também não será fácil de alcançar: "Instamos a União Europeia e os Estados Unidos a congelarem todos os bens russos até que a Rússia retire as suas forças, o seu Exército, e ponha fim ao envio de equipamento para os grupos liderados pelos russos."

Na mesma comunicação, no final de uma reunião do Conselho de Ministros, Iatseniuk descreveu a situação dos combates no terreno em forma de mensagem aos líderes europeus e dos EUA: "A situação no Leste da Ucrânia deteriorou-se substancialmente. A Rússia enviou [para a Ucrânia] vários veículos militares, tanques e tropas. Podemos confirmar que há soldados russos no território ucraniano. As forças ucranianas têm capacidade para lidar com os guerrilheiros liderados pelos russos, mas para nós é muito difícil lutar contra a Rússia e o seu Exército."

O reforço das sanções à Rússia é um cenário cada vez mais certo – a chanceler alemã disse que irá discutir essa possibilidade na reunião extraordinária do Conselho Europeu no sábado: "Deixámos claro em Março que, no caso de uma nova escalada, teriam de ser discutidas novas sanções."

Outros líderes europeus foram mais longe, como o ministro dos Negócios Estrangeiros da Suécia, Carl Bildt, que descreveu as acções russas como uma "invasão não declarada". "Acho que não existe a mínima dúvida sobre o que está a acontecer. Lembrem-se da Crimeia. Ele [Vladimir Putin] negou tudo em relação à Crimeia até ao último momento", disse o ministro sueco, citado pela BBC.

Já o primeiro-ministro italiano, Matteo Renzi, denunciou a "entrada de tropas russas na Ucrânia", classificando-a como uma "escalada intolerável que irá ter consequências muito graves".

Preocupado com os mais recentes desenvolvimentos na Ucrânia, o Governo da Lituânia convocou para esta quinta-feira uma reunião de emergência do Conselho de Segurança das Nações Unidas.

Quanto aos Estados Unidos, não se nota qualquer alteração ao discurso oficial: os responsáveis norte-americanos há muito que têm acompanhado a NATO na condenação do que dizem ser a interferência directa da Rússia nos combates no Leste da Ucrânia. 

Na conferência de imprensa de quarta-feira, a porta-voz do Departamento de Estado norte-americano, Jen Psaki, mostrou-se preocupada com "a falta de vontade do Governo russo para dizer a verdade, mesmo que os seus soldados sejam encontrados 50 quilómetros dentro da Ucrânia".

"A Rússia está a enviar os seus jovens para a Ucrânia, mas não lhes diz para onde vão, nem diz aos seus pais o que é que eles vão fazer", acusou a porta-voz do Departamento de Estado norte-americano.

NATO divulga novas imagens
Ao fim da tarde desta quinta-feira, a NATO divulgou novas imagens que classifica como provas de que a Rússia tem tropas e veículos militares na Ucrânia, em particular unidades de artilharia.

"Ao longo das duas últimas semanas notámos um aumento significativo no número e na sofisticação da interferência militar da Rússia na Ucrânia. As imagens de satélite reveladas constituem mais uma prova de que soldados russos, equipados com armamento pesado sofisticado, estão a operar em território soberano da Ucrânia", disse o brigadeiro-general Nico Tak, citado num comunicado da NATO.

Em resposta a esta acusação, o major-general russo Igor Konashenkov, do Ministério da Defesa, disse que as alegações da NATO "não têm qualquer relação com a realidade". "Registamos o lançamento de uma campanha internacional de boatos e vemo-nos obrigados a desapontar os seus autores no estrangeiro e os seus poucos defensores na Rússia", disse o responsável à agência Interfax.


 

   

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