Poroshenko anuncia cessar-fogo “em breve” mas tensão na Ucrânia mantém-se
Depois de ter falado com Putin, Presidente ucraniano anunciou trégua unilateral e mudou ministro. Moscovo considera a proposta “boa”. Separatistas reagiram com desconfiança.
“O plano de paz começa com a minha ordem de cessar-fogo unilateral”, disse Poroshenko, citado pela agência Interfax-Ucrânia. “Imediatamente após, deveremos receber apoio para esse plano de paz de todas as partes envolvidas. Isso deverá acontecer muito depressa.”
Citado pela AFP, o ministro da Defesa, Mikailo Koval, disse que o cessar-fogo poderia ser confirmado dentro de “alguns dias”. Um porta-voz da presidência afirmou à BBC que será anunciado em “horas ou dias”.
O anúncio da intenção de cessar-fogo insere-se num plano de paz que Poroshenko discutiu telefonicamente com o líder russo, Vladimir Putin, na noite de terça-feira. O Kremlin anunciou então que os dois dirigentes falaram sobre uma eventual trégua e sobre a morte de dois jornalistas da televisão pública russa – duas das cerca de três dezenas de vítimas mortais dos confrontos do dia. “A conclusão de um possível cessar-fogo na zona de operações militares no sudeste da Ucrânia foi evocada”, informou a presidência russa.
Ainda que abra uma perspectiva de evolução negociada, a declaração de Poroshenko não significa que o caminho esteja livre de obstáculos. O Presidente ucraniano promete uma amnistia “aos que depuseram as armas e aos que não tenham cometido crimes graves” mas não deixou de afirmar que a trégua abriria a possibilidade aos “mercenários russos” de deixarem o país.
Mesmo assim, o ministro dos Negócios Estrangeiros russo, Serguei Lavrov, considerou que se trata de uma “boa proposta”, embora tenha ressalvado que “por um lado se fala de cessar-fogo e por outro a agressão continua”. Reclamado também negociações com os separatistas pró-russos.
Putin tem garantido que não controla os rebeldes e que Kiev terá de dialogar directamente com eles. E a primeira reacção do porta-voz da autoproclamada república de Donetsk foi tudo menos encorajadora para a via negocial. “Por que é que devemos depor as armas? Não confiamos em Poroshenko. Isto não é mais do que um estratagema”, disse Miroslav Rudenko, citado pela Interfax.
A própria Rússia mantém distâncias em relação a Kiev e anunciou, também nesta quarta-feira, uma investigação ao papel do ministro do Interior ucraniano, Arsen Avakov, e do governador da região de Dnipropetrovsk, pela “morte intencional” de civis. Mais de 300 pessoas foram mortas desde que as forças ucranianas lançaram, em meados de Abril, uma ofensiva contra a insurreição pró-russa no Leste.
Ministro sacrificado
Quase ao mesmo tempo que anunciava o cessar-fogo unilateral para data a confirmar, Poroshenko informou ter decidido substituir o ministro dos Negócios Estrangeiros, Adrii Dechtcitsa, cuja situação se tinha tornado insustentável num cenário de diálogo entre Kiev e Moscovo. No que terá sido uma mal conseguida tentativa para acalmar os ânimos de manifestantes que se preparavam para atacar a embaixada russa em Kiev, Dechtcitsa insultou, no fim-de-semana passado, Putin, chamando-lhe, por exemplo, “parvalhão”.
Dechtcitsa será substituído, depois da aprovação pelo Parlamento do nome do sucessor, por Pavlo Kimlin, que tem representado a Ucrânia nas negociações que têm sido mantidas com a Rússia – outro sinal da importância atribuída ao diálogo com Moscovo. Diplomata experiente, antigo embaixador em Berlim, defensor, tal como Poroshenko, da vida europeia para Ucrânia, o próximo ministro conhece bem a Rússia, onde se formou em Física, no ano do colapso da União Soviética, 1991.
O afastamento de Dechtcitsa era inevitável num quadro de diálogo entre os dois países vizinhos, como tinha observado Lavrov, que afirmou “não saber como” poderia ele conversar com a Rússia depois do episódio do fim-de-semana.
Durante a conversa de terça-feira à noite com Putin, Poroshenko prometeu, segundo o Kremlin, uma investigação às circunstâncias das mortes dos jornalistas russos que terão sido apanhados por combates entre forças ucranianas e separatistas pró-russos.
O cenário de diálogo que a declaração de Poroshenko parece abrir acontece depois de desenvolvimentos que comprometeram as perspectivas negociais criadas após os primeiros contactos entre os dois dirigentes, designadamente a morte de 49 ucranianos no derrube de um avião militar por separatistas pró-russos.