Observatório da ILGA recebeu 112 denúncias de crimes motivados pelo ódio
Observatório da Discriminação recebeu um total de 258 denúncias, sendo os crimes de ódio contra pessoas homossexuais, bissexuais ou transgénero os mais comuns.
O Observatório da Discriminação em função da Orientação Sexual e Identidade de Género arrancou em 2013 com vista a monitorizar e denunciar crimes e incidentes motivados pelo ódio contra pessoas homossexuais, bissexuais ou transgénero e divulga agora o seu primeiro relatório. Os dados dizem respeito a factos ocorridos entre 1 de Janeiro e 31 de Outubro, período durante o qual 164 pessoas, através de questionário online ou directamente nos serviços da ILGA, denunciaram situações ocorridas com elas próprias ou de que foram testemunhas.
Segundo os dados do Observatório, foram recolhidos 164 questionários válidos, sendo que o tipo de crime e/ou incidente mais frequentemente cometido contra pessoas LGBT (Lésbicas, Gay, Bissexuais e Transgénero) em Portugal são insultos e abusos verbais (123 denúncias), seguindo-se as ameaças e violência psicológica (69) e a violência física extrema (37).
Como os formulários permitiam a escolha de mais do que um tipo de crime/incidente, o Observatório recebeu 258 denúncias, 112 das quais que "muito claramente constituem crimes motivados pelo ódio", segundo as definições da Organização para a Segurança e Cooperação na Europa (OSCE). O presidente da ILGA Portugal apontou que os 112 casos de crimes motivados pelo ódio representam "um número muito elevado" e apontou que na sua maioria são mulheres.
No entanto, um dos dados que Paulo Corte-Real mais destaca é a elevada percentagem de pessoas (96%) que não apresentaram queixa junto das autoridades competentes. "Há várias razões para isso: desde o medo de represálias até à falta de provas ou a falta de coragem ou alguma vergonha", apontou, acrescentando que estas pessoas não confiam no Estado para as proteger e não confiam na justiça.
O dirigente apontou que os dados do Observatório mostram que houve situações de recusa no acesso a bens e serviços, o que o leva a pedir que haja mais formação de uma forma geral e nos serviços que o Estado disponibiliza, entre segurança, saúde, justiça ou segurança social. Lembrou, a propósito, o "péssimo exemplo" dado por parte do Parlamento nacional quando chumbou a proposta relativa à co-adopção, defendendo que "teve um impacto negativo em termos de legitimação da discriminação e legitimação de acidentes violentos".
Relativamente ao grau de abertura da vítima face à sua orientação sexual, Paulo Corte-Real destacou que só cerca de 16% contou no local de trabalho e pouco mais de 20% contou a toda a família. "Há claramente uma experiência de discriminação, que é a experiência do silêncio que impede o pleno usufruto de direitos", sendo que a experiência do silêncio "bloqueia a luta pela integração, nomeadamente a discriminação no local de trabalho", defendeu.
Violência extrema provocada por adolescentes
Sobre os casos de violência extrema, a ILGA adiantou que foram contabilizados 37, na maior parte das situações levados a cabo sobretudo por jovens adolescentes, com idades entre os 16 e os 18 anos. Dentro destas 37 situações, 54% eram relativas a violência física, 24% a assédio sexual, 11% a violação, 5% a outro tipo de assédio sexual, enquanto 3% tinham a ver com ferimentos com arma e os restantes 3% foram relativos a tentativas de homicídio.
A maioria dos casos de violência extrema reportados ocorreu em Lisboa e arredores, durante a tarde ou noite e em espaço público (24%), na escola (19%) e em casa (11%). "Relativamente à caracterização da pessoa agressora, trata-se de uma pessoa em nome individual que atua em grupo (49%), geralmente desconhecida da vítima e com uma idade entre os 16 e os 18 anos (24%) ou os 25 e os 40 anos (22%) ", lê-se no documento. Já em relação à vítima, os dados do Observatório mostram que são maioritariamente mulheres (54%) com uma média de idades entre os 14 e os 20 anos.
O presidente da ILGA Portugal apontou que a juventude actual "é claramente ensinada a ser homofóbica e transfóbica" e lembrou o "caso marcante" que foi a morte da transexual Gisberta. "Temos uma lei relativa à educação sexual que menciona a necessidade de abordar as diversas orientações sexuais, mas na realidade isso não acontece na maior parte das escolas do país", apontou Paulo Corte-Real.
Nesse sentido, o dirigente da ILGA defendeu que tem de haver uma mobilização muito generalizada de toda a sociedade contra este tipo de visão e pediu uma campanha de sensibilização dirigidas sobretudo às escolas "para garantir a educação para a cidadania e para os direitos humanos e a educação contra a discriminação, nomeadamente em função da orientação sexual e da identidade de género". Paulo Corte-Real realçou que isso implica uma participação de todas as escolas e não só de algumas e que esse trabalho tem de ter carácter de urgência.
Ainda em relação às vítimas de violência física extrema, a maioria (65%) não procurou qualquer tipo de apoio (médico ou psicológico), mesmo tendo sofrido ferimentos e apesar de admitir que o crime e/ou o incidente de que foi vítima teve um impacto negativo na sua vida pessoal ou social.
A 17 de maio assinala-se o Dia Internacional de Luta contra a Homofobia.