Sangue novo ajuda a rejuvenescer corpo velho... pelo menos no ratinho

Três estudos concluem que o sangue de ratinhos novos permite reverter os efeitos do envelhecimento em ratinhos idosos. E dois deles identificam a substância que poderá estar por trás destes benefícios.

Reconstituição 3D dos vasos sanguíneos do cérebro "rejuvenescido" de um ratinho idoso
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Reconstituição 3D dos vasos sanguíneos do cérebro "rejuvenescido" de um ratinho idoso Lida Katsimpardi
Reconstituição 3D dos vasos sanguíneos do cérebro de um ratinho idoso não tratado
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Reconstituição 3D dos vasos sanguíneos do cérebro de um ratinho idoso não tratado Lida Katsimpardi
Reconstituição 3D dos vasos sanguíneos do cérebro de um ratinho novo
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Reconstituição 3D dos vasos sanguíneos do cérebro de um ratinho novo Lida Katsimpardi

A proteína GDF11 é um “factor de crescimento” que existe naturalmente no organismo dos ratinhos – e também dos seres humanos. E sabe-se que a concentração de GDF11 no sangue dos ratinhos novos é muito mais elevada do que no sangue de ratinhos de idade mais avançada.

Amy Wagers e Richard Lee, do Instituto de Células Estaminais da Universidade Harvard (HSCI), nos EUA, líderes de um dos estudos agora publicados na Science e co-autores do outro, já tinham mostrado, em 2013, o efeito rejuvenescedor do sangue de ratinho jovem sobre o músculo e a função cardíacos de ratinhos mais velhos, lê-se num comunicado do HSCI. E tinham, a seguir, identificado a GDF11 como sendo a potencial responsável deste efeito “anti-idade”.

Regenerar os músculos

Mas agora, eles e a sua equipa descobriram que os benefícios da proteína não parecem limitar-se ao coração. “O nosso trabalho mostra que a GDF11 é activa em múltiplos órgãos e tipos de células”, diz Amy Wagers, citada no mesmo documento. Os cientistas mostraram que a GDF11 vinda de ratinhos mais novos melhora a função das chamadas “células-satélite” dos ratinhos mais velhos, ao contribuir para a reparação do material genético destas células. ­Ora, são as células-satélite que asseguram a regeneração dos músculos de todo o corpo ao longo da vida – e o seu desempenho diminui com a idade.

Pelo seu lado, a equipa liderada por Lee Rubin, também do HSCI, autora do segundo estudo na Science, interessa-se pelas doenças neurodegenerativas ligadas ao envelhecimento. E descobriu agora que a GDF11 dos ratinhos novos também faz aumentar a quantidade de vasos sanguíneos cerebrais que alimentam as células precursoras das células nervosas. O que, por sua vez, estimula a geração de novos neurónios.

As duas equipas utilizaram as mesmas duas técnicas experimentais. Por um lado, ligaram o sistema circulatório de um ratinho novo e de um ratinho idoso (com uma idade equivalente, nos seres humanos, a 70 anos), fazendo circular o sangue do animal novo pelo corpo de ambos; por outro, administraram injecções diárias de sangue de ratinho novo a ratinhos velhos.

No caso do cérebro, ambos os “tratamentos”, aplicados às áreas cerebrais associadas ao olfacto, devolveram nos ratinhos idosos uma acuidade perdida. “Os ratinhos mais novos têm um faro muito apurado, explica Rubin. "E quando testámos esses ratinhos novos, eles evitavam o cheiro a mentol, ao contrário dos animais mais velhos. Porém, quando expusemos os mais idosos ao sangue dos mais novos, os mais velhos também passaram a discriminar o cheiro a mentol" e a ter a mesma reacção.

Todos estes autores acreditam que, se tudo correr como previsto, a GDF11 poderá começar a ser ensaiada no ser humano daqui a três a cinco anos. “Pensamos que, pelo menos em princípio, deve ser possível reverter parcialmente o declínio associado ao envelhecimento com uma única proteína, que poderá ser a GDF11 ou uma molécula semelhante”, declara Rubin, especulando "não estar fora de questão que a GDF11 (ou algo parecido) possa vir a ser útil no tratamento da doença de Alzheimer”. Quanto a Wagers, a investigadora diz-se disposta a “apostar que os resultados destes trabalhos irão dar origem a um ensaio clínico e a um tratamento”.

Recarregar o cérebro

O artigo publicado na Nature Medicine, quanto a ele – da autoria de Tony Wyss-Coray, da Universidade de Stanford (EUA), e colegas – , não aponta para uma substância em particular. Mas confirma, mais uma vez no ratinho, a existência de factores sanguíneos capazes de combater os estragos do tempo.

Estudos anteriores já mostraram que certas substâncias presentes no sangue de ratinhos velhos podem, ao ser injectadas em ratinhos novos, perturbar as suas funções cognitivas. Mas o inverso – o facto de existirem substâncias no sangue dos mais novos que pudessem melhorar o desempenho cognitivo dos mais velhos – não era claro, explica a revista britânica.

Agora, a equipa de Stanford administrou repetidas doses de sangue de ratinhos novos (com três meses de idade) a ratinhos idosos (com 18 meses de idade) e observou uma melhoria do desempenho dos mais velhos em tarefas de aprendizagem e de memória. Para mais, este efeito rejuvenescedor também foi visível ao nível estrutural e molecular do cérebro dos animais tratados. Pelo contrário, quando os cientistas administraram sangue jovem, mas previamente aquecido, aos animais mais idosos, nada aconteceu. Segundo eles, isso indica que uma das substâncias do sangue jovem responsáveis pelo efeito terá sido destruída pelo calor.

“Mostrámos que pelo menos algumas deficiências da função cerebral ligadas ao envelhecimento são reversíveis”, diz o co-autor Saul Villeda em comunicado da universidade californiana. “É como se esses velhos cérebros tivessem sido recarregados pelo sangue novo”, diz por seu lado Wyss-Coray.

Quanto a saber quais serão as substâncias responsáveis, estes cientistas especulam que uma delas poderá ser uma proteína, chamada Creb, que se activa em particular no hipocampo – uma estrutura cerebral importante para a memória. “Estamos a trabalhar intensivamente para descobrir quais poderão ser os factores [sanguíneos envolvidos] e quais são exactamente os tecidos do organismo que os produzem”, acrescenta Wyss-Coray.

Embora ainda não saibam se os resultados se estendem aos seres humanos, estes cientistas também esperam testar essa hipótese a curto prazo através de ensaios clínicos. E também especulam que venham um dia a dar origem a novos tratamentos contra demências como a doença de Alzheimer.
 

   

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