Polícia inglesa já identificou 18 casos de crianças britânicas vítimas de abusos no Algarve

Scotland Yard dá mais uma conferência de imprensa sobre os desenvolvimentos do caso de Madeleine McCann e queixa-se da inexistência de uma equipa de investigação conjunta

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Menina inglesa desapareceu em Maio de 2007 Foto: AFP

Estes seis casos juntam-se a outros 12 já assinalados e foram descobertos após um apelo público feito através da comunicação social, em Março. O detective inspector chefe Andy Redwood confirmou esta quarta-feira, em conferência de imprensa, que existe um "número suficiente de características comuns", nomeadamente o método ou hora, para fazer acreditar que estas situações estejam relacionadas. "O intruso não força a entrada nas casas e nada ou quase nada foi roubado", exemplificou o responsável que adiantou ainda que desde Março as autoridades inglesas receberam mais de 500 novos telefonemas.

Assim, ao todo, a Scotland Yard tem registo de 18 casos que envolvem crianças inglesas com idades entre os seis e 12 anos, dos quais nove foram ataques sexuais concretizados. Três tiveram lugar na Praia da Luz, entre 2005 e 2010, cinco no Carvoeiro, entre 2004 e 2006, nove entre a Praia da Galé, Vale de Parra e São Rafael, no concelho de Albufeira, entre 2004 e 2008, e um em Vilamoura, em 2005.

A Polícia Judiciária (PJ) recusa comentar as informações avançadas pela Scotland Yard revelando apenas que tem conhecimento de mais casos de abusos envolvendo crianças britânicas no Algarve. A questão, adianta uma fonte contactada pelo PÚBLICO, é de saber se as características de cada caso apontam ou não para um suspeito comum.

Andy Redwood, que chefia a "Operação Grange" (a investigação do desaparecimento de Madeleine McCann a cargo da Polícia Metropolitana britânica), adiantou que quatro dos casos não tinham sido reportados às autoridades portuguesas e mostrou-se interessado em saber pormenores sobre um incidente em particular, verificado no centro da Praia da Luz com uma criança de 10 anos.

"Não voltei a Portugal desde o último apelo, em Março. Claramente, uma das coisas que estarei interessado em fazer no próximo encontro com a equipa de investigação [da Polícia Judiciária] do Porto é saber o que fizeram com toda esta informação", afirmou.

O responsável garantiu que todas estas novas descobertas foram partilhadas com a PJ, mas que só teve acesso a alguns dos processos de investigação das autoridades portuguesas, e admitiu que existam processos "perdidos" nas polícias locais que não sejam conhecidos pela PJ. "Queremos consultar todos os processos para acrescentar à nossa investigação", justificou.

 

Na altura do apelo público feito pela Scotland Yard em Março, fonte da PJ confirmou que a pista de um alegado pedófilo "corresponde à linha de investigação descoberta pela equipa da PJ liderada por Helena Monteiro" e que "a reabertura do inquérito" judicial surgiu na sequência da investigação de um suspeito. "Essa linha de investigação foi dada a conhecer à polícia inglesa e aos pais de Maddie [Gerry e Kate McCann], em reunião realizada em Outubro de 2013, nas instalações da PJ, em Lisboa", referiu a mesma fonte.

 

Em Outubro, a Scotland Yard deu conta de uma série de linhas de investigação e retratos-robô, nomeadamente de um homem visto a transportar uma criança pequena nos braços na noite do desaparecimento na Praia da Luz e de uma série de homens de cabelo claro vistos a rondar as imediações do apartamento onde a criança inglesa estava alojada. Porém, não obteve qualquer informação que permitisse esclarecer aqueles avistamentos, nem descobrir quem levou a cabo uma série de roubos no complexo turístico naquele ano.

Investigação conjunta recusada
Segundo a Scotland Yard, a PJ recusou uma investigação conjunta ao desaparecimento de Madeleine McCann, mas a polícia britânica está "cautelosamente optimista" em avançar com diligências em Portugal em breve, adiantou o vice-comissário adjunto, Martin Hewitt. "O ideal seria uma investigação conjunta, mas a polícia portuguesa entende que não é necessário", disse. Fonte da PJ não comenta a informação, mas recorda que em Portugal quem dirige os inquéritos é o Ministério Público. 

Hewitt garantiu serem "normais dentro da estrutura europeia" este tipo de investigações conjuntas e referiu lembrar-se de "três ou quatro exemplos" no Reino Unido, entre a polícia britânica e forças policiais estrangeiras. Ainda assim, Martin Hewitt, que é responsável pela divisão de Crime Organizado e Operações, disse estar "optimista" e espera uma resposta positiva às três cartas rogatórias com pedidos para diligências e para agentes britânicos acompanharem os polícias portuguesas nestas acções. As cartas foram enviadas para Portugal entre Outubro e Fevereiro à Procuradoria-Geral da República, que remete os documentos ao procurador titular do caso que decide a realização ou não das diligências pedidas.

Hewitt, que em Março se manifestou "frustrado" com a lentidão do processo, adiantou ter a noção de que alguns pedidos serão recusados, mas que estes "não são fatais" para a investigação. "Estou cautelosamente optimista em conseguir avançar com as linhas de investigação em Portugal. Estou confiante de que até ao final da semana teremos uma resposta escrita e que a maior parte dos pedidos serão aceites", adiantou. O vice comissário adjunto explicou que, após a formalização desde deferimento, será iniciado o planeamento e calendarização das diligências.

Ingleses gastaram mais de 6 milhões de euros
A investigação britânica começou em 2011, na sequência de um apelo público dos pais de Madeleine McCann, ao primeiro-ministro britânico, David Cameron, para lançar uma revisão "independente, transparente e completa" de toda a informação relativa ao desaparecimento da filha. A 12 de Maio de 2011, a ministra do Interior, Theresa May, com o apoio de Cameron, pediu à Polícia Metropolitana para iniciar uma revisão ao caso, invocando o "elevado interesse público" e "dimensão internacional".

Em Abril de 2012 a polícia britânica deu conta dos primeiros resultados da investigação, ao identificar "195 novas oportunidades de investigação" e a 4 de Junho anunciou a abertura de um inquérito formal. Em Junho do ano passado o diário Telegraph  noticiava que os dois anos de investigação tinham custado à Scotlad Yard cinco milhões de libras (cerca de seis milhões de euros). 

Madeleine McCann desapareceu poucos dias antes de fazer quatro anos, a 3 de Maio de 2007, do quarto onde dormia juntamente com os dois irmãos gémeos, mais novos, num apartamento de um aldeamento turístico na Praia da Luz, no Algarve.