Renegociação, reestruturação, perdão: é só a semântica que divide os partidos?

Miguel Frasquilho, deputado do PSD, admite que condições podem ser melhoradas mas nunca pode ser uma iniciativa de Portugal. Todos os partidos querem melhores condições para o pagamento da dívida pública, mas com tonalidades diferentes.

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Todos querem melhores condições para pagar a dívida, mas com tonalidades diferentes PÚBLICO

No argumentário do Governo e da maioria contra a renegociação ou reestruração da dívida está sempre um mesmo ponto: essa iniciativa enviaria aos mercados a mensagem errada. A mensagem de que Portugal reconhece que não conseguirá cumprir as suas obrigações. Coisa diferente é se o caminho for deixado aberto por outro país e a iniciativa pertencer aos próprios credores.

Foi o que já aconteceu quando, na Primavera de 2013, foi concedido a Portugal e à Irlanda uma extensão das maturidades de sete anos dos empréstimos, um benefício que veio à boleia da Grécia. E é o que pode voltar a acontecer quando, após as eleições europeias, se discutir um terceiro resgate à Grécia, admite Miguel Frasquilho, vice-presidente da bancada do PSD.

“Haverá um tempo próximo para que a condições de reembolso da dívida pública portuguesa na posse dos fundos de resgate europeus e do BCE possam ser (de novo)  melhoradas, alongando novamente maturidades e descendo juros”, afirmou ao PÚBLICO, reiterando o que escreveu num artigo do Jornal de Negócios há duas semanas em que questionou: “E até quem sabe? Beneficiando de um período de carência no pagamento dos juros”. 

Assumindo que o primeiro-ministro fez bem em rejeitar o Manifesto dos 74 sobre a reestruturação da dívida, o economista defende que estas negociações não se fazem na praça pública. E muito menos antes das eleições europeias de 25 de Maio.

No PS, desde o início houve uma palavra que a direcção evitou quando falava da dívida. Essa palavra era “reestruturação”. Ao longo dos últimos três anos, António José Seguro, Óscar Gaspar e Eurico Dias, optaram sempre por falar em “renegociação”, para separar a sua posição dos que defendiam o chamado “haircut”, ou seja perdão da dívida ou de parte dela.

Na passada semana, o secretário-geral do PS fez questão sublinhar essa diferença. “Nós devemos pagar até ao último cêntimo, mas devemos fazê-lo através de uma estratégia credível", sustentou quando a actualidade era marcada pelo Manifesto dos 74.

O que os socialistas defendem é, portanto, renegociar “as condições” para o pagamento da dívida do país. Ensaiando a baixa dos juros, revendo prazo a partir do qual se passa a pagar, e alargando o período de anos da obrigação do vencimento da dívida.

A par desta renegociação, Seguro já defende há mais de um ano que a solidariedade europeia para com Estados-membros em dificuldades se concretize com a assunção do princípio da mutualização das dívidas soberanas quando estas atinjam valores superiores acima dos 60% do Produto Interno Bruto (PIB).

PCP quer renegociação total
A renegociação da dívida em montantes, juros e alargamento dos prazos é também a proposta do PCP, que apresentou esta quinta-feira um projecto de resolução já anunciado em Fevereiro, antes de ser conhecido publicamente o Manifesto dos 74, e que retoma uma iniciativa no mesmo sentido de Abril de 2011. Na altura, ainda com um governo de Sócrates, o projecto foi rejeitado pelo PS, PSD e CDS.

Na resolução, a bancada comunista pretende que sejam assumidas as “componentes ilegítimas da dívida”, que têm a ver com negócios ou especulações feitos no privado, de que são exemplos os contratos Swap (de alto risco).

Mas o PCP não se coloca na posição do ‘não pagamos’. “Recusar o pagamento do que foi assumido pelo Estado não é coisa de gente séria”, afirmou o líder da bancada parlamentar, João Oliveira. Por outro lado, o projecto de resolução associa a renegociação à criação de condições para o crescimento económico. A iniciativa será discutida em plenário no próximo dia 16, antes do agendamento da petição lançada pelos autores do Manifesto dos 74, que ainda não deu entrada na Assembleia da República.  

Já o Bloco de Esquerda considera que é preciso reduzir a dívida pública para os 60% do PIB, fórmula que permitiria criar folga para o investimento público e para a criação de emprego. O líder parlamentar Pedro Filipe Soares explicou ao PÚBLICO que a negociação, feita directamente com os credores institucionais e com o privado, afectaria todo o montante da dívida, mas também os juros e os prazos.

As novas obrigações do Tesouro, que resultariam deste processo, teriam uma moratória de juros até 2020. O país poderia assim respirar com a indexação dos juros da dívida à evolução das exportações de bens e serviços. Nestas condições, acreditam os bloquistas, a dívida estaria paga em 30 anos.

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