Situação política nos Açores não permitiu acordo sobre o ferry Atlântida
Augusto Santos Silva não considera que recusa do navio para as ligações entre as ilhas açorianas, em 2009, “foi o caixão fechado” sobre os Estaleiros de Viana do Castelo
“Os governos não se entenderam, foi uma pena que a situação política nos Açores não permitisse tal entendimento pois havia uma comissão de inquérito no Parlamento regional” e a líder da oposição [Berta Cabral, do PSD] "estava muito activa", disse Santos Silva. “É esta a minha opinião”, destacou.
Opinião que foi expressa após quatro horas e meia de perguntas dos deputados, com o antigo titular da Defesa do último executivo de José Sócrates a manter-se fiel à sua declaração inicial. Na qual elencou os cinco pontos que marcaram a sua acção política para os estaleiros de Viana, empresa sob o controlo da Empordef, a holding tutelada pelo Ministério da Defesa.
A resolução do conflito do Atlântida, recusado pelo armador, a empresa pública açoriana Atlânticoline, por nos testes de mar lhe faltar um nó de velocidade, era o primeiro dossier. “Os estaleiros cometeram um erro crasso na questão da velocidade”, assumiu o antigo ministro. Em nenhum momento, se referiu aos motivos técnicos que motivaram o não cumprimento da velocidade estipulada contratualmente. “Nós, o Estado português e a empresa falhámos”, sintetizou de forma sonora.
Foi por ter esta opinião que, juntamente com o ministro Teixeira dos Santos, das Finanças, Augusto Santos Silva autorizou o endividamento da Empordef em 37 milhões de euros, quando já existia um processo em tribunal. Seguindo indicações da Secretaria de Estado do Tesouro foi aconselhado um acordo extra judicial. Desta forma, a empresa pública ENVC devolvia ao armador público açoriano as verbas já por este pagas para a construção do ferry.
“A derrota dos estaleiros de Viana seria perder o processo judicial, devolver o dinheiro ao armador mais as indemnizações que constavam do contrato”, disse. Uma opinião que contrariou dois pareceres dos juristas António Pinto Monteiro e António Menezes Cordeiro, de Novembro de 2009, que foram então solicitados pela administração dos estaleiros.
“Assumo plenamente toda a responsabilidade, tudo o que tenha ocorrido enquanto fui ministro da Defesa Nacional, quer conhecesse pareceres ou não”, salientou por diversas vezes. “É da minha responsabilidade política tudo o que aconteceu, não é da minha culpa”, referiu. O facto do contrato da Atlânticoline com os ENVC ser anterior à sua gestão da pasta da Defesa, de 2006, não serviu a Augusto Santos Silva para se demarcar: “Em 2006 também era membro do Governo e os membros do Governo são solidários, por isso sou responsável.”
Do mesmo modo, refutou uma acção à margem do âmbito institucional com as autoridades açorianas dado os governos de Ponta Delgada e de Lisboa serem ambos socialistas. “Não me poderia ir entender por debaixo da mesa por sermos camaradas ou companheiros, por eu estar na direcção do PS e também Carlos César [presidente do Governo regional]”, exemplificou.
No entanto, o antigo ministro admitiu que a forma como concluiu o dossier Atlântida – com a devolução do navio a Viana – e mais tarde o cancelamento da encomenda do ferry Anticiclone, provocou “custos reputacionais”. Por isso, assinalou que a construção do navio patrulha oceânico Viana do Castelo e, mais tarde, do gémeo Figueira da Foz, eram parte do relançamento da ENVC. Uma via que, recordou, foi travada pelo cancelamento das encomendas da Marinha efectuado pelo ministro da Defesa José Pedro Aguiar-Branco.
“Corremos um sério risco do ponto de vista de estratégia de Defesa Nacional”, criticou. “ Numa situação de emergência, como a de repatriar cidadãos portugueses, as fragatas podem estar em processo de manutenção em estaleiros sob controlo de entidades sobre as quais o ministro da Defesa, seja ele qual for, não tem autoridade”, exemplificou.
Por fim, Santos Silva defendeu o processo de reestruturação dos ENVC de 2011, não sem antes salientar que o problema dos estaleiros não eram os trabalhadores mas dificuldades técnico-estruturais, de gestão comercial, técnico e de pessoal. Admitiu que então existiam demasiados trabalhadores para as encomendas e considerou tal plano “uma opção de travar o calvário”. E, mais uma vez, garantiu: “Se foi um erro a decisão foi minha.”