Reinserção de menores que cometam crimes preocupa partidos mas dispensa de queixa não tem consenso
CDS preocupado com a possibilidade de haver magistrados a aplicar medidas tutelares sem ouvirem os técnicos de reinserção social. PS e PSD querem aumento da duração mínima de internamento dos jovens em regime aberto e semiaberto. Projectos de alteração à Lei Tutelar Educativa são votados nesta sexta-feira na Assembleia da República.
No debate na AR, Teresa Anjinho, do CDS, frisou que o número de jovens no sistema tutelar não tem diminuído, mas, segundo dados da Direcção-Geral de Reinserção Social que citou, o número de relatórios pedidos pelos juízes aos técnicos de reinserção social sobre jovens acusados de algum tipo de crime tem decrescido, desde 2010, o que pode indicar que haja magistrados a “aplicar medidas tutelares sem para tal ouvirem previamente os técnicos de reinserção social”.
Entre as propostas, há pontos coincidentes. Por exemplo, tanto o PSD como o PS consideram que se deve elevar a duração mínima de internamento dos jovens em regime aberto e semiaberto de três para seis meses. O projecto do PS estabelece a duração máxima de dois anos.
Os socialistas propõem também “a adopção do instituto do ‘cúmulo jurídico’ na aplicação de medidas tutelares educativas, em substituição do regime de acumulação”. A deputada socialista Isabel Oneto explicou que se pretende “aplicar ao jovem uma só medida que lhe permite um projecto tutelar educativo uniforme, coerente com a gravidade dos crimes praticados”.
Também Paula Cardoso sublinhou que o PSD defende “a existência de um cúmulo jurídico” e “não a mera soma das medidas tutelares aplicáveis que era o que acontecia”. O CDS propõe igualmente o “cúmulo das medidas aplicadas em vários processos, em caso de cumprimento sucessivo”. Isto significa que se um jovem tiver vários processos a decorrer em paralelo, será aplicada uma única medida de cada natureza.
Isenção de taxa
Isabel Oneto acrescentou que o PS defende também “a isenção de taxa moderadora aos jovens que, encontrando-se à guarda do Estado, precisam de cuidados de saúde”: “Não é legítimo que estes jovens, retirados do seu ambiente, por necessidades de educação para o direito, não possam ter, ou tenham de ter a seu custo ou cargo, daquilo que é o seu abono de família, pagar do seu bolso a taxa moderadora de saúde”, afirmou.
Quanto à integração do jovem, o PSD defende a criação de unidades residenciais de transição destinadas a jovens saídos de centros educativos. O PS propõe a criação de “uma supervisão intensiva na fase de regresso do jovem à família e à comunidade, sob a supervisão dos serviços de reinserção”. Precisa-se, entre outros aspectos, que “a supervisão intensiva é executada em meio natural de vida ou, em alternativa, em casa de autonomia sob orientação dos serviços de reinserção social”.
O CDS também propõe a criação de uma medida de apoio ao regresso do menor ao meio natural de vida, após o internamento, e quer ainda eliminar a necessidade de autorização do jovem maior de 14 anos para a submissão a uma medida de tratamento. Teresa Anjinho justifica que, em causa, pode estar a necessidade de o jovem tratar problemas mentais ou até dependência do álcool ou estupefacientes.
Polémica
Mais polémica é a “dispensa de denúncia por parte do ofendido” proposta pelo PSD. Cecília Honório, do BE, avisou logo que considera a “dispensa da queixa do ofendido em crimes semipúblicos e particulares” algo “absolutamente desnecessário”.
O PSD entende que “a prática de qualquer facto qualificado pela lei como crime possa dar origem à intervenção tutelar educativa, consagrando-se, desta forma, a irrelevância da queixa do ofendido nos crimes semipúblicos e particulares”. Defendem que “qualquer pessoa” possa “denunciar ao Ministério Público ou a órgão de polícia criminal facto qualificado pela lei como crime, independentemente da natureza deste, praticado por menor com idade compreendida entre os 12 e os 16 anos”.
O PSD quer também acabar com os fins-de-semana de internamento: “Na situação da medida de internamento em regime semiaberto, em que o menor era condenado a um ou quatro fins-de-semana e, portanto, era uma espécie de castigo, em que iria passar o fim-de-semana a um centro tutelar, nós propomos a eliminação”, disse Paula Cardoso, considerando que a medida não tem “qualquer eficácia de correcção” e que até origina “situações caricatas” como, no “caso das regiões autónomas, em que o menor” tem de deslocar de avião acompanhado por uma entidade policial.
Já o PCP propõe a criação de equipas multidisciplinares constituídas por “médico, psicólogo, assistente social e autoridade policial” que “avaliem a eficácia e resultado da execução da medida e acompanhem a sua execução”.
Rita Rato, do PCP, alertou para “a inexistência de meios humanos em número suficiente que garantam o acompanhamento efectivo de cada jovem e sua família” e a “inexistência ou dificuldades graves de acompanhamento regular do jovem após o cumprimento do programa delineado”. Os projectos que forem aprovados nesta sexta-feira seguirão para o debate na especialidade.