Negociações sobre nuclear iraniano - um jogo cheio de alçapões

Acordo preliminar de Genebra vai ser testados nos primeiros meses do ano.

Foto
Kerry entendeu-se com os iranianos em Genebra AFP

As negociações dos próximos meses serão como um jogo em que, cada passo mal dado, pode abrir um alçapão sob os pés do jogador. E se este é um jogo com vários intervenientes — o Irão negoceia com o Grupo 5+1, que além dos membros permanentes do Conselho de Segurança inclui a Alemanha — as chaves para o sucesso (ou as receitas para o fracasso) estão em Washington e Teerão. Ambos assumem ter interesse estratégico num acordo, mas as alianças regionais divergentes e a complexidade dos seus sistemas políticos vão dificultar discussões melindrosas e muito técnicas: quanto urânio poderá o Irão enriquecer, que centrais terá de encerrar, a que ritmo serão levantadas as sanções?

As ruas e os bastidores políticos mostram que o Presidente iraniano, Hassan Rohani, se reforçou com o acordo preliminar de 24 de Novembro, que suspendeu parte do programa nuclear. “A sua autoridade é maior do que qualquer dos seus antecessores”, escreveu na Foreign Affairs Suzanne Maloney, analista da Brookings Institution, explicando que além “de cumprir a promessa de pôr fim ao impasse nuclear” e conseguir um primeiro alívio das sanções, Rohani lidera um governo de unidade e conta com o “apoio fervoroso dos iranianos e explícito do Supremo Líder”.

Um apoio que abafou as críticas da ala mais dura do regime. Mas ninguém acredita que “os conservadores, incluindo os poderosos e omnipresentes Guardas da Revolução, aceitem de ânimo leve um plano que impeça a sua ambição de ter armas nucleares, como acordo definitivo terá de fazer”, antecipa a Economist.
O tempo corre, por isso, contra Rohani — a demora no levantamento das sanções, a degradação da economia vão minar o seu capital político e dar armas à ala dura . O comandante dos Guardas da Revolução lembrou esta semana que a sua missão é a defesa do regime e se “a principal ameaça à revolução está na arena política, os Guardas não ficarão em silêncio”.

O Presidente Barack Obama também ganhou o primeiro embate face aos “falcões”. Fez valer o timing da abertura diplomática ao Irão. E até Israel, que denunciou Genebra como o “acordo do século para o Irão”, admite que o inimigo ficou um pouco mais longe da bomba atómica. Mas para Obama selar um acordo precisa de ter o apoio do Congresso, até aqui mais empenhado em votar novas sanções do que em aliviar as existentes. “Obama precisa de uma estratégia para vencer a campanha dos ´falcões’” Leslie H. Gelb, presidente emérito do Council on Foreign Relations, aconselhando a Administração a assumir uma “postura agressiva” e a publicitar os méritos desta primeira vitória diplomática.

Marc Lynch, professor da Universidade George Washington, comparou num artigo para a Foreign Policy o acordo de Genebra ao de Camp David, negociado entre Israel e o Egipto, sublinhando que em 1978 “tal como agora, as duas lideranças viram um enorme interesse estratégico em chegar a um acordo, apesar da significativa oposição interna e regional”. Para além da paz mútua, o acordo mudou os equilíbrios na região, o mesmo efeito que poderá ter a pacificação das relações entre Washington e Teerão.

Mas o analista avisa que os negociadores devem também “olhar para as lições dos Acordos de Oslo”, que em 1993 tentaram lançar as bases para a paz entre israelitas e palestinianos, mas que foram rapidamente minados “pelas acções provocatórias e a retórica de ambos”.

“A política em redor das negociações cria um ambiente excepcionalmente rico em episódios que podem destruir a confiança [..] quanto mais as equipas de Obama e Rohani sentirem a necessidade de provar que estão a ganhar as conversações, mais provável é que as negociações falhem”.
 
 

Sugerir correcção
Comentar