"Número dois" do regime khmer admite responsabilidades no genocídio do Camboja
Um quarto da população foi morta em menos de quatro anos, entre 1975 e 1979.
“Não procuro fugir às minhas responsabilidades”, disse, perante o tribunal internacional que o está a julgar em Phnom Penh. O antigo “irmão número dois” do regime, de 86 anos, tinha até agora negado todas as acusações.
“Enquanto dirigente, devo assumir a minha responsabilidade pelo prejuízo que causei ao meu país, pelo perigo a que foi exposto”, acrescentou. Nuon Chea manifestou as “profundas condolências” às testemunhas que depuseram e perderam familiares durante o regime de terror imposto pelos khmer vermelhos.
Nuon Chea minimizou, porém, o seu papel, dizendo que enquanto responsável pela propaganda e pela educação não estava a par de tudo o que se passava. “No plano da execução [das instruções de Pol Pot, o líder do regime], eu não tinha qualquer poder. E ainda que se trate do que se passou com os khmer vermelhos, há coisas que eu sabia e outras que ignorava”, disse.
O regime khmer vermelho matou um quarto da população do país em menos de quatro anos. Esvaziou cidades, suprimiu moeda, escolas e religião, e mergulhou a sociedade num clima de terror. Milhares de pessoas foram enviadas para os campos para trabalhar, milhares morreram à fome, por doença ou sumariamente executadas.
Sobreviventes do terror khmer saudaram as declarações. “É uma coisa boa. Aceitou a sua responsabilidade”, disse um deles, Bou Meng, 72 anos, um dos poucos que saiu com vida da prisão de Tuol Sleng, em Phnom Penh. “Estou contente. Finalmente assumiu os massacres e o erro.”
Pol Pot morreu em 1998 sem nunca ser julgado. O único processo até agora concluído pelo tribunal apadrinhado pelas Nações Unidas foi o de Kaing Guek Eav, conhecido como Duch, responsável pela prisão de Phnom Penh, centro de tortura do regime, condenado a prisão perpétua.
Para além de Nuon Chea, está a ser julgado o antigo Presidente Khieu Samphan. Ieng Sary, ex-ministro dos Negócios Estrangeiros, e a mulher, Ieng Thirith, antiga ministra dos Assuntos Sociais, também foram levados a tribunal, mas o primeiro morreu em Março deste ano e a viúva foi libertada - por ter perdido a razão e o tribunal entender que não estava em condições de ser julgada.
Khieu Samphan disse esta quinta-feira que ignorava na altura “o grande sofrimento dos cambojanos”. E apresentou também “desculpas sinceras” às vítimas. “Deve aceitar a sua responsabilidade. Ele e Nuon Chea são como dois dedos da mesma mão”, comentou Bou Meng.