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Chipre: resgate pode "acabar com a confiança no sector bancário da noite para o dia"

Os analistas criticam a solução encontrada pela zona euro para resgate de Chipre. Acordo é “desleal, míope e autodestrutivo”.

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O Carnaval cipriota está na rua e não esqueceu a crítica europeia Yiannis Kourtoglou/AFP

Tim Worstall alerta para este perigo, na Forbes, recorrendo à explicação que Milton Friedman e Anna Schwartz encontraram para a Grande Depressão norte-americana. Segundo os dois economistas, esta não teria acontecido, apesar do crash de 1929 e da consequente recessão, sem a intervenção da Reserva Federal, que dizem ter gerado uma corrida aos depósitos.

Como se estancou nessa altura a corrida aos bancos? Garantindo que o dinheiro dos depositantes estaria seguro. “Ora, o que fizeram em Chipre? Acabaram com a garantia dos depósitos. Portanto, acabaram com a defesa contra as corridas aos bancos e as falências em cascata”, escreve.

O facto de os líderes europeus dizerem que a medida não será aplicada noutro país, defende Worstall, é indiferente. “Se os cidadãos acharem que já não têm os seus depósitos garantidos (…), veremos mais levantamentos em massa e mais bancos a falirem. E falências de bancos em cascata são exactamente o que nos fará cair numa nova depressão.”

“Não é um disparate, mas é ainda assim um fracasso”, tempera a britânica The Economist. Num artigo intitulado “Desleal, míope e autodestrutivo”, a revista analisa a questão apontando três razões pelas quais a solução encontrada para o quinto resgate na zona euro é “um erro”. Primeiro: “reaviva o risco de contágio”. “A probabilidade de acontecerem movimentos desestabilizadores de importantes montantes (em dinheiro, se não para outros bancos) acabou de disparar.”

“O segundo erro é de equidade.” A Economist argumenta que “não há qualquer imperativo moral para taxar as viúvas cipriotas e deixar os detentores de obrigações bancárias intocados, como parece ser o caso”, ou para proteger as operações gregas nos bancos cipriotas. A terceira razão é “estratégica”. “O acordo cipriota não tem coerência num contexto mais amplo”. “O preço político de entrar num programa [de resgate] acabou de subir”, lê-se ainda.

“O que estamos aqui a ver é o Governo cipriota a ser forçado a quebrar uma das suas mais importantes promessas – a promessa de que se pusermos o nosso dinheiro no banco, e os nossos depósitos forem inferiores a 100 mil euros, estaremos seguros”, acrescenta Felix Salmon, da Reuters. “Mais, não há uma boa razão para os depósitos com garantia serem atingidos desta maneira: a mesma quantia poderia ser conseguida aplicando aos depósitos sem garantia uma taxa ligeiramente superior”, sublinha.

O acordo prevê que os depósitos inferiores a 100 mil euros paguem um imposto extraordinário de 6,75% e que aos que ultrapassem esse valor seja aplicada uma taxa de 9,9% (além de prever um aumento dos impostos sobre as empresas, que pode chegar aos 12,5%). Felix Salmon considera que a tributação em dois escalões serve apenas o propósito de não aplicar uma taxa de dois dígitos aos depósitos mais altos. Seria para não hostilizar os maiores investidores?

Segundo a análise de Raúl Ilargi Meijer, no Business Insider, a eventual preocupação é desnecessária. Isto porque “este acordo de aspecto muito curioso tem a capacidade de acabar com a confiança no sector bancário da União Europeia da noite para o dia”. “Se os depósitos bancários em Chipre não estão garantidos (mesmo que só até determinado valor), não há qualquer razão para que as pessoas noutros países da zona euro acreditem que os seus depósitos serão tratados de forma diferente.”

O que terá então levado os líderes europeus a tomar esta decisão? Stephen Fidler, que é mais comedido nas críticas, lembra no Wall Street Journal que estes acordos são “geralmente conseguidos no último minuto por ministros sob privação de sono”. “É confuso”, escreve. Fidler defende que é tempo de o Banco Central Europeu assumir as questões relacionadas com o sector bancário e que os governos europeus devem intervir cada vez menos.

“Eu diria que é mais provável que os 37% de depósitos ‘estrangeiros’ em Chipre, isto é, russos em grande parte, tenham empurrado os políticos europeus para uma decisão populista – punir os criminosos! – que os fez negligenciar consequências mais vastas”, contrapõe Meijer. Na BBC, Gavin Hewitt concorda: os alemães “suspeitavam que metade dos depósitos nos bancos da ilha pertencia a russos com muita lavagem de dinheiro [envolvida]” – e, por isso, não estariam dispostos a dar-lhes mais dinheiro.

Mas a solução encontrada é, como diz Hewitt, “sensível”. E prova disso mesmo é que o Reino Unido decidiu compensar todos os que se encontram em Chipre ao serviço do Governo e do Exército britânicos. “A Comissão Europeia disse que não haverá implicações para os bancos em Espanha e Itália, mas a mensagem está dada”, continua Hewitt, sublinhando que os recentes números apresentados para Portugal, em consequência da austeridade, deveriam ter feito os decisores políticos “parar para pensar”. Em vez disso, “voltaram a arriscar”.

“Fora isto”, ironiza a Economist, “é realmente um bom negócio.”

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