A Venezuela pós-Chávez começa na sexta-feira
Venezuelanos vão ter de escolher o "digno herdeiro", em eleições. A dúvida é que país vão querer. Nicolás Maduro e Henrique Capriles são as apostas do momento.
Nicolás Maduro, de 50 anos, antigo líder sindicalista e actual vice-presidente, disse que o próximo Presidente da Venezuela tem de ser “um digno herdeiro de um gigante”.
Nas eleições presidenciais, que segundo a Constituição devem realizar-se num prazo de 30 dias após a morte do chefe de Estado, será ele, Maduro, o candidato-herdeiro. Hugo Chávez assim o designou ao partir, pela última vez, para Cuba, onde fez os tratamentos ao cancro que o matou na quarta-feira, aos 58 anos.
Foi Maduro quem teve de dizer ao país e ao mundo que o líder morrera. “Ele é um verdadeiro revolucionário, com grande capacidade de trabalho e de liderança, é um homem para as situações mais difíceis”, disse Chávez do seu delfim.
Os analistas disseram, na altura, que Chávez quis proteger ao máximo o seu “eleito” da inevitável rivalidade dentro do Partido Socialista Unido da Venezuela, após o seu desaparecimento. E quis deixar as “pontas atadas” no sentido de o próximo chefe de Estado (e caso ganhe as eleições) ser um chavista puro, e não o representante de uma corrente dentro do socialismo que foi unido enquanto Chávez foi o líder forte e carismático.
O jornal The Guardian diz que Maduro, cujo rosto de bigode farto se tornou reconhecível em todo o mundo porque foi catapultado para a frente das câmaras durante a crise da doença de Chávez, é um homem calmo e que, em privado, tem um bom sentido de humor. Costumava viajar até à Índia (com a mulher, que conheceu através de Chávez) para ouvir os ensinamentos espirituais do guru Sathya Sai Babaa, que morreu em 2011. “Do ponto de vista do discurso, ele não é um homem ‘que fale alto’. Tem mais a personalidade de um diplomata, sempre aberto ao diálogo”, disse à BBC o cientista político Ricardo Sucre, da Universidade Central da Venezuela.
Sendo um negociador, os analistas dizem que é provavelmente o homem capaz de “atar” as facções, mantendo-as unidas. Para já, tem o apoio declarado dos militares, essenciais na revolução socialista de Chávez e que se mantêm presentes no conselho revolucionário que junta políticos e tropas.
No campo da oposição, a escolha parece também ser óbvia, mas podem surgir surpresas. Unidos numa frente, a Mesa da União Democrática, os principais partidos e grupos da oposição deram início nas últimas semanas a sessões de debate para escolher um candidato unificador numas futuras presidenciais. O favorito é o governador Henrique Capriles, que enfrentou Chávez nas eleições de Outubro de 2012. Foi derrotado, mas conseguiu a mais alta percentagem de votos de um candidato que enfrentou Chávez; 55% contra 44%.
Chávez foi reeleito em Outubro e, apesar de não ter tomado posse na data prevista, o Supremo Tribunal entendeu que, por já estar em exercício, poderia ser empossado mais tarde. O poder não chegou assim a transitar então para o presidente do Parlamento, o que só agora, com a morte de Chávez, irá acontecer.
Capriles foi quem deu a cara pela oposição após a notícia da morte de Chávez. “A minha solidariedade vai para a família e para os seguidores do Presidente Hugo Chávez, defendemos a unidade dos venezuelanos neste momento.” Um comentário curto, mas que obrigou Maduro a reagir, considerando-o apropriado e educado. “Em momentos difíceis, devemos demonstrar o nosso profundo amor e respeito pela Venezuela”, disse ainda Capriles, já um tom de pré-campanha.
Chávez será sepultado na sexta-feira. No dia seguinte, a cordialidade começará a desaparecer; quando for marcada a data das eleições, o tom irá adensar-se e a campanha eleitoral será dura. Maduro contra Capriles é o cenário mais provável e um deles será o “digno herdeiro”. Maduro, herdeiro de Chávez, pode beneficiar da galvanização que a morte do comandante deu à sua revolução. Caprilles, o anti-herdeiro, é representante da percentagem de venezuelanos cansados da revolução socialista e que sonham com um modelo que não sabem bem qual é.