Lei do apadrinhamento civil apenas habilitou cinco padrinhos em dois anos
O apadrinhamento civil existe desde 27 de Dezembro de 2010 e visa crianças que não podem ser adoptadas, mas ainda é pouco conhecido.
O apadrinhamento civil, que entrou em vigor a 27 de Dezembro de 2010, pretende ser uma solução para os casos em que os menores não reúnam as condições para a adopção ou os pais não a permitem. Através de um procedimento mais leve e simplificado, os padrinhos assumem as responsabilidades parentais sem que a criança rompa os laços com a família.
Dados do Instituto de Segurança Social enviados à agência Lusa, indicam que em 2011 foram realizadas 11 entrevistas a candidatos a padrinhos, tendo sido formalizadas seis candidaturas e habilitado um padrinho. Nos primeiros dez meses de 2012, foram realizadas nove entrevistas, formalizadas seis candidaturas e habilitados quatro padrinhos, estando dois candidatos inscritos em bolsa.
Apesar de haver poucos candidatos, existem crianças para serem apadrinhadas: 70 em 2011 e 58 em 2012, disse Ana Rita Alfaiate, do Centro de Direito da Família e do Observatório Permanente da Adopção (OPA). “Esta diferença de número pode justificar-se por alguma criança ter atingido a maioridade ou ter sido encaminhada para outra solução que não a adopção, porque nestes casos a adopção está posta de parte”, disse Ana Rita Alfaiate.
Para o autor da lei e director do OPA, a fraca adesão de candidatos a padrinhos deve-se à falta de divulgação da lei. “Quando estávamos a preparar este instrumento de protecção estávamos de acordo com os dirigentes da altura de que era preciso uma grande divulgação da medida porque era uma novidade, mas os dirigentes saíram, o dinheiro acabou e as coisas acabaram por não se concretizar”, lamentou Guilherme de Oliveira.
O resultado é que “ninguém conhece” a legislação: “Tenho notícias surpreendentes de pessoas que estão no centro da protecção das crianças, que têm vidas inteiras dedicadas a isso e nunca ouviram falar do apadrinhamento civil e não tem noção do que é preciso fazer, o que faz pena”. O apadrinhamento civil “morreu à nascença. Não se conhece, não se aplica, não se sabe se é bom ou mau”, lastimou o director do OPA.
O procurador Rui do Carmo contou, por seu turno, que os “poucos casos” de apadrinhamento que os tribunais decidiram foram de pessoas que já tinham uma relação de proximidade com a criança ou uma relação de facto com o menor. Segundo o magistrado, quando se pede à Segurança Social que indique as pessoas que querem ser padrinhos, a resposta tem sido de que não há padrinhos inscritos.
“Eu não encontro resposta para esta situação de inexistência de pessoas interessadas. Penso que não foram mobilizados os meios adequados para captar pessoas interessadas em assumir este papel, porque não acredito que haja tão grande falta de solidariedade”, frisou. Existem muitas pessoas que acolhem informalmente crianças e o apadrinhamento civil seria uma forma de poder regularizar muitas destas situações, adiantou o procurador.
Rita Alfaiate sublinhou que as entidades que estão no terreno para aplicar o apadrinhamento civil - comissões de protecção e tribunais - ainda “não estão suficientemente esclarecidas” sobre este instrumento. Ao não se elucidar as comissões de protecção, que são quem tem o maior contacto com as crianças, as famílias e os potenciais padrinhos, está-se “a perder um nicho de pessoas capazes de impulsionar” o apadrinhamento, frisou. “Se uma criança for desinstitucionalizada à custa do apadrinhamento civil já terá valido a pena”, acrescentou.