O crítico e o fazedor

Mas ele não queria apenas escrever sobre teatro, queria praticá-lo. Foi assim que Carlos Porto o substitui nas páginas daquele jornal, enquanto Benite partia para a aventura do Grupo de Teatro de Campolide. O agrupamento era “amador”, mas estritamente apenas em termos do estatuto profissional, já que em termos concretos de práticas cénicas se inscreveu no decisivo florescimento dos grupos de teatro independentes no início dos anos 1970, com Os Bonecreiros, a Comuna, a Cornucópia e os Cómicos.

Especialmente importante nessa altura foi a sua colaboração com o escritor e dramaturgo Virgílio Martinho, mormente em Filopopulus, espectáculo sobre o poder autocrático e a sua demagogia, de tantas ressonâncias no Portugal então ainda da ditadura.

Veio o 25 de Abril e, primeiro, o Grupo de Campolide profissionalizou-se, e mais tarde transferiu-se de Lisboa para a Margem Sul, vindo a tornar-se na Companhia de Teatro de Almada. Dir-se-á que o sítio é ainda o da área metropolitana da capital, mas Benite foi construindo uma companhia, um teatro e um público próprios. Se é pouco provável que o público de Almada viesse a Lisboa ver teatro, ou para isso ficasse depois do trabalho, passou a ocorrer o contrário: foi público de Lisboa que se foi acostumando a ir ver teatro a Almada.

E em 1984 surgiu por sua iniciativa o Festival de Teatro de Almada, que mantendo aí o seu epicentro se alargaria a Lisboa, e que tão decisivamente mudou a nossa percepção das contemporaneidades teatrais, rasgando horizontes de cosmopolitismo, com tantos e tantos espectáculos de encenadores maiores.

Joaquim Benite dirigiu, entre muitos outros, um texto de Thomas Berhardt, O Fazedor do Teatro. É a designação mais apropriada para ele próprio que, partindo da crítica, de tantos modos foi um exemplar fazedor de teatro. 
 
 

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