Gatos fluorescentes podem dar pistas para o combate à sida
O FIV (sigla em inglês para Vírus de Imunodeficiência Felina) está para os gatos como o HIV está para os humanos. É um vírus que mina o sistema imunitário dos felinos e que os torna susceptíveis a fungos, bactérias ou outros vírus. Os humanos e os macacos – que sofrem de uma doença semelhante – não contraem este vírus dos gatos (assim como os gatos não contraem o HIV, por exemplo) provavelmente devido à TRIMCyp, uma proteína que se pensa que reconhece a capa do FIV e ordena o sistema imunitário matar o vírus.
Os cientistas decidiram inserir nos gatos este gene para tentar obter o mesmo tipo de protecção no felino. Mas em conjunto com este gene, inseriram outro pedaço de ADN que codifica uma proteína que emite fluorescência.
“Fizemo-lo para encontrar mais facilmente as células quando as observamos ao microscópio ou quando projectamos uma luz no animal”, disse citado pela BBC News Eric Poeschla, da Clínica Mayo, em Rochester, nos Estados Unidos. O cientista é um dos responsáveis pelo estudo e um dos autores do artigo da Nature Methods, que juntou investigadores norte-americanos e japoneses.
A utilização da GFP (a sigla inglesa para a Proteína Fluorescente Verde) é comum na ciência, mas nunca tinha sido aplicada a um carnívoro. Baseia-se na inserção do gene da GFP numa célula fecundada de um animal – neste caso de um gato – juntamente com o gene da proteína que se quer estudar.
Se tudo correr bem, quando uma célula do organismo geneticamente modificado produz a nova proteína, também produz a GFP. E aos cientistas, basta submeter as células a um certo tipo de luz para ver a fluorescência e confirmar que se está a dar a produção da proteína que se quer estudar.
No caso dos gatos, a inserção dos genes nas células fecundas foi feita com um vírus e a técnica foi um sucesso. Quase toda a descendência dos gatos onde foram inseridos os genes produzia a proteína contra o FIV, e em todo corpo, como se pode ver na fotografia. Os cientistas tentaram depois infectar com o FIV células sanguíneas destes gatos, mas não tiveram sucesso.
“Isto dá uma capacidade sem precedentes de estudar os efeitos da protecção de um gene num animal vulnerável [devido a uma doença parecida com a sida]”, disse Poeschla à Reuters, sublinhando que só os felinos e os macacos é que sofrem de uma doença semelhante ao dos humanos.
Ao Guardian os professores Helen Saug e Bruce Whitelaw deixaram um alerta. “Isto tem um valor potencial, mas o uso de gatos geneticamente modificados como modelos para doenças humanas é muito provavelmente limitado e só se justifica se outros modelos não forem adequados”, disseram os investigadores do Instituto Roslin da Universidade de Edimburgo, onde em 1996 a ovelha Dolly foi clonada.
Mas uma descoberta no combate ao FIV também poderá trazer utilidade terapêutica aos felinos que sofrem com esta doença. A equipa de Poeschla vai agora testar se os gatos geneticamente alterados passaram a ser imunes ao FIV ou se são mais resistentes a desenvolverem a versão felina da sida.