Salmão transgénico no menu dos americanos pode estar para breve

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O objectivo da criação transgénica é encurtar o tempo de crescimento dos salmões Foto: Pedro Cunha

Filetes de salmão transgénico para o jantar, talvez com suave molho de pesto por cima? Ora, vá lá, não se vai notar nada, tem três cadeias de ADN em vez das duas normais, mas o sabor é igualzinho, a carne é rosada como o salmão tradicional e até deve ter custado menos - afinal, cresce duas vezes mais rápido do que os peixes que não têm genes alterados para terem características comercialmente mais interessantes.

A Food and Drug Administration (FDA), a agência norte-americana que regula o mercado dos alimentos e dos medicamentos, promove hoje um debate público sobre o salmão AquAdvantage - o primeiro animal com genes de outro, introduzidos pelo engenho científico do homem que parece ter reais possibilidades de em breve chegar aos nossos pratos.

Trata-se de um salmão do Atlântico com um gene de uma espécie do Pacífico, o salmão-rei, aquele que comanda a produção do factor de crescimento semelhante à insulina tipo 1 (IGF-1), uma proteína que regula o crescimento das células musculares. Outro gene alheio à sua espécie foi colhido pelos cientistas ao peixe-carneiro-americano, e promove a actividade do gene IGF-1, para que os peixes cresçam durante todo o ano, e não apenas durante uma época determinada. O resultado é um salmão que pesa um quilo em apenas 18 a 24 meses, em vez dos três anos normais.

A Aqua Bounty, a empresa do Massachussets proprietária do salmão AquAdvantage, garante que todos os peixes que chegariam ao mercado seriam fêmeas - para reduzir ao máximo o risco de se reproduzirem - e estéreis: é esse o motivo pelo qual as suas células têm três cópias das cadeias de ADN, em vez das duas habituais. Para fazer com que fiquem com este número anormal de cromossomas, os ovos são submetidos a altas pressões.

Problemas ambientais

O Centro de Medicina Veterinária da FDA já emitiu um relatório favorável sobre o salmão transgénico produzido pela empresa do Massachusetts ao longo dos últimos 14 anos, apesar das críticas que continuam a fazer-se ouvir, por parte de cientistas, ambientalistas e organizações de consumidores. Mas está-se a apostar na aprovação, em breve, da comercialização deste salmão modificado.

A ter licença para entrar no mercado, as maiores preocupações que o salmão AquAdvantage suscita nem são propriamente acerca do perigo que representa a sua carne, apesar da IGF-1, que é uma proteína normalmente existente no nosso organismo, ser suspeita de envolvimento em alguns cancros. É que, tal como a insulina, quando ingerida, é digerida pelos ácidos do estômago.

Mas os possíveis problemas ambientais causados pelo salmão com genes modificados - se alguns escaparem para o ambiente natural e conseguirem cruzar-se com animais normais, não transgénicos - são imprevisíveis, embora se possam imaginar algumas consequências bastante trágicas. Por exemplo, a extinção de espécies selvagens de salmão, se os híbridos tiverem alguma vantagem reprodutiva, ou tornarem-se uma espécie exótica que expulsa outra do seu habitat.

A empresa do Massachusetts tem dois centros de produção: os ovos de salmão são criados no Canadá e daí viajam para o Panamá, onde são criados em viveiros longe do mar, e de outros cursos de água - uma medida de segurança para evitar que fujam para a natureza. Mas, se a Aqua Bounty começar a comercializar o seu salmão, e se tiver de facto sucesso, começará a vender também os seus ovos de salmão para outras companhias - norte-americanas, porque a autorização da FDA vale apenas para os Estados Unidos - e não poderá garantir que todas criarão os peixes com as mesmas cautelas.

Não há pedidos de autorização para comercializar animais transgénicos como alimentos na União Europeia, adianta a revista Nature, e a Autoridade Europeia para a Segurança Alimentar está ainda a elaborar regulamentos nesse sentido.

Outras experiências

Muitos olhos estão focados neste momento no salmão transgénico, porque este deve ser o primeiro a chegar ao mercado.

Mas há vários outros animais que são normalmente usados na nossa alimentação que estão a ser alvo da atenção dos cientistas para serem tornados mais interessantes comercialmente - com a ajuda de um gene ou outro.

Há por exemplo o Enviropig, desenvolvido pela Universidade de Guelph, no Canadá - que também já foi submetido para aprovação à FDA - que consegue absorver melhor o fósforo da sua alimentação e, por isso, produz estrume com menos quantidade deste elemento químico, que ao chegar aos cursos de água potencia o desenvolvimento de algas e bactérias.

Uma empresa norte-americana está a tentar desenvolver vacas transgénicas resistentes à doença das vacas loucas e vários cientistas, em várias partes do mundo, estão a criar várias outras espécies de peixes transgénicos. Peixe-gato, carpa e truta são alguns dos exemplos.

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