Clinton pede desculpa pelos e-mails, desta vez sem nenhum "mas"
A campanha da candidata à nomeação pelo Partido Democrata para concorrer às presidenciais continua marcada pelo uso de um servidor pessoal para enviar e receber mensagens nos anos em que foi secretária de Estado.
"Foi um erro. Peço desculpa e aceito toda a responsabilidade. Estou a tentar ser o mais transparente possível", disse Hillary Clinton no programa ABC World News Tonight.
A pressão a que o Partido Republicano e a opinião pública em geral estavam a sujeitar Clinton sobre este assunto já indicava que o pedido de desculpas teria de chegar mais cedo ou mais tarde, para que a principal candidata do Partido Democrata pudesse concentrar-se nos seus principais temas de campanha – numa sondagem divulgada pela Universidade Quinnipiac no dia 27 de Agosto, as três palavras que os inquiridos mais associaram a Hillary Clinton foram "mentirosa", "desonesta" e "desleal".
Em Março, quando o New York Times revelou que Hillary Clinton usou um servidor pessoal, instalado na sua mansão em Chappaqua, no estado de Nova Iorque, para enviar e receber e-mails na qualidade de secretária de Estado, entre 2009 e 2013, a primeira reacção da agora candidata à Casa Branca foi desvalorizar a questão, dizendo que essa história não passava de uma distracção.
À medida que a pressão foi aumentando – e que se começou a perceber que o assunto iria persegui-la por todos os locais de campanha por onde passasse –, a estratégia foi mudando. Na sexta-feira, numa entrevista ao canal NBC, Clinton pediu desculpas, mas "pelo facto de o tema estar a confundir as pessoas e por ter levantado muitas questões".
Ainda assim, o pedido de desculpas sem reservas, apresentado esta terça-feira, foi uma surpresa porque surgiu um dia depois de uma outra entrevista, à agência Associated Press, em que Hillary Clinton voltou a dizer que tudo não passava de uma distracção, e que não iria pedir desculpas: "O que eu fiz era permitido. Era permitido pelo Departamento de Estado. O Departamento de Estado confirmou-o."
A decisão de tentar atirar o assunto para trás das costas, com um pedido de desculpas sem rodeios, terá sido tomada depois de os seus conselheiros de campanha terem mostrado as imagens de uma conferência de imprensa de Hillary Clinton, realizada no dia 26 de Agosto, a um grupo de independentes e eleitores do Partido Democrata – segundo o New York Times, as pessoas que ouviram a resposta de Clinton sobre a polémica dos e-mails disseram que ficaram pouco satisfeitas e que queriam mais explicações.
Hillary Clinton entregou aos actuais responsáveis do Departamento de Estado 30.000 dos 60.000 e-mails que foram enviados e recebidos através da sua conta pessoal hdr22@clintonemail.com. Considerou que 30.000 estão relacionados com o seu trabalho e mandou apagar os outros 30.000, que incluiriam apenas assuntos privados, como os preparativos para o casamento da sua filha ou para o funeral da sua mãe.
O problema é que no lado do Partido Republicano – acicatado pela campanha presidencial em curso – ninguém se conformou com o método usado por Hillary Clinton para decidir o que era trabalho e o que era pessoal: a sua própria escolha, sem a verificação de uma terceira parte independente.
Apesar de ninguém questionar a legalidade do uso de um endereço de e-mail pessoal (algo que também foi feito por antigos secretários de Estado republicanos, como Colin Powell e Condoleezza Rice), a polémica tem sido aproveitada pela oposição para questionar o seu carácter e aptidão para governar o país: "Em centenas de ocasiões, as ridículas tentativas de Hillary Clinton para tornear as leis relativas à transparência governamental puseram a segurança nacional em risco", criticou o presidente do Comité Nacional Republicano, Reince Priebus.
No início do mês, o Departamento de Estado divulgou 4368 e-mails, 125 dos quais foram classificados como confidenciais. Esta questão foi aproveitada pelos críticos de Clinton para dizer que ela mentiu quando disse que nenhum dos e-mails que enviou e recebeu através do seu endereço pessoal era confidencial. Mas o Departamento de Estado confirmou que essas mensagens não eram confidenciais no momento em que foram trocadas.
No entanto, no início desta semana, uma segunda avaliação dos e-mails confirmou que pelo menos duas mensagens já estavam na altura classificadas como top secret, uma delas relacionada com o programa nuclear da Coreia do Norte.
Para além da questão da segurança das comunicações, o facto de altos responsáveis do Governo norte-americano usarem servidores pessoais pode pôr em causa o trabalho dos arquivos nacionais dos EUA, que têm como tarefa preservar os documentos oficiais.