REVISTA_2
Nunca a Agência Espacial Europeia se tinha deixado ver assim
O trabalho de Edgar Martins pode ser descrito como uma cirurgia fotográfica, porque, tal como o cirurgião, procura a precisão máxima com os instrumentos mais adequados. A ESA abriu as portas a Edgar Martins e agora The Rehearsal of Space & the Poetic Impossibility to Manage the Infinite permite-nos espreitar lá para dentro.
Edgar Martins gosta de lugares difíceis. Melhor: de lugares de acesso difícil e sem registo visual para lá daquele que está relacionado com a sua mais restrita natureza. A Agência Espacial Europeia (ESA) era um desses lugares. Em 2012, o fotógrafo português pediu licença para entrar e as portas foram-lhe abertas. Foi a primeira vez que um artista teve acesso sem restrições a tudo quanto dá forma à ESA, desde instalações secretas onde fazem testes às plataformas de lançamento e centros de treino de astronautas. O resultado de quase dois anos de viagens por mais de 15 locais diferentes em todo o mundo onde a ESA opera está em The Rehearsal of Space & the Poetic Impossibility to Manage the Infinite, um ensaio que tem por ambição “fazer o levantamento fotográfico mais completo alguma vez produzido sobre uma organização líder na exploração científica do espaço”.
As imagens The Rehearsal of Space… situam-se na linha criativa das últimas séries de Edgar Martins (A Metaphysical Survey of British Dwellings, 2010, The Time Machine, 2011,…), onde uma faceta neutral, fria e descritiva se cruza com leituras mais especulativas, cénicas e puramente geométricas. Neste exercício hiper-realista, no qual Edgar Martins vai cunhando a sua produção artística, há intenção de proporcionar não só uma visão da representação de um espaço que está contido nas imagens, mas também fornecer “um portal para o espaço em si”. Ou seja, a fotografia a funcionar como mecanismo de acesso e a criar “a ilusão de transparência”.
Num dos episódios da série Entre Imagens (que passou ao longo dos últimos meses na RTP2 e que mostrava 13 criadores portugueses que usam a fotografia na sua arte), foi possível ver Edgar Martins durante uma sessão deste trabalho. De bata e touca azuis, movia-se com cautela, carregado com uma câmara de grande formato (10X8 polegadas) por entre a parafernália de instrumentos, sinais, tubos e cabos que enxameiam as salas. A sua prática pode ser descrita como se de uma cirurgia fotográfica se tratasse, porque, tal como o cirurgião, procura a precisão máxima com os instrumentos mais adequados.
A principal motivação, explicou o fotógrafo, era “fazer a cartografia da tecnologia das instalações e dos programas de pesquisa da ESA” de forma a tentar perceber “quais são as novas políticas de exploração espacial” e como “os princípios utópicos de exploração espacial dos anos 60 foram sofrendo uma erosão”. Quis perceber ainda “o impacto de toda esta tecnologia sobre a nossa psique individual e social”. Mas não sem deixar de lado a ficção, o espectacular e o fantástico: “O que está representado nestas imagens não são apenas os meios e os mecanismos que nos permitem explorar o mundo, os planetas e o cosmos, mas também aquilo que nos permitem sonhar.”
O livro The Rehearsal of Space… acaba de ser lançado numa co-edição entre a espanhola La Fábrica e a Moth House, chancela criada por Edgar Martins. Depois da estreia na galeria londrina The Wapping Project Bankside, a exposição segue para a Galeria Melanie Rio, em Nates, França, onde ficará até 26 de Julho.