PSD na Câmara do Porto é a primeira baixa do caso Selminho

Concelhia do Porto do PSD retirou confiança política ao vereador Amorim Pereira, por "total ausência de lealdade". O vereador diz que "agradece".

Foto
"Quero fazer tudo ao contrário do que fazem na concelhia, porque estão a destruir o PSD do Porto”, disse Amorim Pereira Diogo Baptista

A concelhia do PSD do Porto retirou, esta terça-feira, a confiança política ao vereador Amorim Pereira, eleito pelo partido à Câmara do Porto, depois de mais um incidente na reunião do executivo. Amorim Pereira não esteve presente na reunião, mas garantiu que não seria substituído por Andreia Júnior, que anunciara a intenção de questionar o presidente da autarquia, Rui Moreira, sobre o processo que envolve o município e a empresa Selminho, de que o autarca é proprietário com a família. Amorim Pereira diz que a confiança já lhe fora retirada há muito e que até “agradece”. O comunicado assinado por Miguel Seabra, líder da concelhia, justifica a decisão com “a total ausência de lealdade” e ”falta de respeito pela democracia representativa” que atribui ao jurista.

A reunião do executivo da Câmara do Porto arrancou com Ricardo Almeida (PSD) a pedir a Rui Moreira que autorizasse a substituição de Amorim Pereira, ausente, por Andreia Júnior, presente na sala. Só que o presidente, munido de um e-mail enviado, no dia anterior, por Amorim Pereira, disse que não o faria, já que o vereador social-democrata garantia, naquela mensagem, que iria estar presente. Incrédulo, Ricardo Almeida disse que Amorim Pereira estava “no estrangeiro”, mas sem consequências. No final da reunião, em declarações aos jornalistas, Andreia Júnior reiterou aquela informação, acrescentando que o vereador ausente estaria “a fazer mergulho”. Os dois disseram ainda que Amorim Pereira dera indicações, na passada sexta-feira, para ser substituído. “Só que nessa altura ainda não havia o caso Selminho”, disse Andreia Júnior, em referência às declarações que fez à Lusa, no sábado, em que referia a intenção de levar o caso ao executivo.

Ao PÚBLICO, Amorim Pereira diz ser “absolutamente falso” que tenha solicitado a substituição ou que estivesse sequer ausente no estrangeiro. O vereador diz que chegou a pensar que não poderia estar presente na reunião por “impedimentos profissionais”, mas que, resolvido esse problema, foi a saúde que acabou por ditar a sua ausência. Garantindo que “mal se podia mexer” na terça-feira de manhã não pediu, nessa altura, nem anteriormente, qualquer substituição e classificou todo o caso de “fait-divers”, afirmando: “Não tenho nada a ver com os meninos do PSD da concelhia do Porto, que já trataram de se afastar de mim e do vereador Ricardo Valente [o outro eleito pelo PSD]”.

Ao final da tarde, em comunicado, o PSD/Porto formalizava o que já fora pedido por Andreia Júnior – a retirada de confiança política a Amorim Pereira. A decisão, diz-se no documento, “culmina três anos de crescente afastamento e divergência” do vereador. O “ponto de ruptura de confiança absoluta” foi o episódio desta terça-feira. Em reacção a esta decisão, Amorim Pereira diz que “agradece”: “Significa que estou no bom caminho. Quero fazer tudo ao contrário do que fazem na concelhia, porque estão a destruir o PSD do Porto”, disse.

A crise no interior da vereação social-democrata acabou por abafar a declaração política que Rui Moreira leu, antes da agenda do dia, e na qual disse estar a ser alvo de “um ataque” político e eleitoralista pelos que fazem “política mesquinha e insidiosa”. Em causa estavam as notícias da agência Lusa vindas a público este sábado, dando conta que o autarca, já enquanto presidente de câmara, passara uma procuração aos advogados da autarquia, para o representar numa audiência do processo judicial envolvendo a Selminho. Esta procuração, de 2013, foi anterior ao presidente ter mandatado a vice-presidente Guilhermina Rego para assumir a responsabilidade do caso, por este envolver uma empresa da família de Moreira.

Na declaração que leu, Rui Moreira afirmou que assinou a procuração por indicação do então seu chefe de gabinete e actual ministro da Defesa, Azeredo Lopes, e fez distribuir uma análise do director municipal dos serviços jurídicos da autarquia, José Correia de Matos, na qual este defende que “não foi praticada qualquer ilegalidade pelo Dr. Rui Moreira”.

No mesmo documento, Correia de Matos diz que na audiência a que se referia a procuração passada por Rui Moreira, os advogados se limitaram “a requerer novo período de suspensão do processo” e justificou o facto de esta procuração não constar do dossier que se encontra na câmara e que foi facultada, para consulta, aos deputados municipais, “por lapso”, já que o advogado a entregara em mão no tribunal, não fazendo, como devia, uma cópia.

Rui Moreira recebeu a “absoluta solidariedade” dos vereadores do PS Manuel Pizarro e Tiago Barbosa Ribeiro e contou também com o apoio do social-democrata Ricardo Valente, que considerou: “[O acordo com a Selminho] Não cria nenhum direito especial, adia uma decisão. A procuração é um não evento, não produziu nenhum efeito substantivo.”

Posição idêntica assumiu Amorim Pereira em declarações ao PÚBLICO, afirmando que a procuração não passa de uma “bagatela jurídica”, que resulta “da pobreza das políticas de oposição agora que se aproximam as eleições”.

Já Andreia Júnior não teve oportunidade de apresentar ao presidente da câmara as seis perguntas que preparara para a reunião em que julgava ir participar. E o vereador da CDU, Pedro Carvalho, avisou que os deputados municipais do seu partido ainda estão a analisar todos os documentos do processo, que consultaram na câmara.

Rui Moreira dedicou grande parte da sua declaração a elencar a forma como a Lusa noticiou o caso Selminho e outros. O autarca avaliou mesmo as opiniões ouvidas pela Lusa, em reacção à notícia da procuração. E mostrou estar bem informado sobre a actuação da agência, revelando que tendo uma jornalista da casa consultado o processo Selminho em 2014 e tido escrito uma notícia, os responsáveis da agência optaram por não a publicar na altura, por não lhe encontrar qualquer relevância noticiosa.

Rui Moreira conclui, de tudo isto, que "usando a redacção do Porto [da Lusa], foi montado para uso político" o que considera ser "um não caso".

O acordo entre o município e a Sleminho, alcançado em 2014 para um processo iniciado em 2010 (ainda no tempo da presidência de Rui Rio) estabelece que a câmara “compromete-se a, no processo de revisão do PDM do Porto […], diligenciar pela alteração da qualificação do solo do terreno da Autora [Selminho], seja pela alteração da tipologia da qualificação do solo actualmente prevista, seja pela alteração das regras que conformam a utilização do solo de acordo com a qualificação actualmente prevista”. “A referida alteração” – continua a transacção judicial – “deverá garantir à Autora um nível de edificabilidade equivalente ao que detinha antes da entrada em vigor do PDM actualmente vigente, ou, caso tal não seja possível, a integração do terreno descrito […] em mecanismos de perequação compensatória adequados às restrições existentes ou outras que vierem a ser estabelecidas pela revisão do PDM[…]”.

Sugerir correcção
Comentar