Chineses da TAP autorizados a lançar primeiro voo directo para Portugal
Bloqueios à entrada da Capital Airlines, detida pela HNA, foram superados pela via diplomática. Depois de quase 20 anos de promessas, nova rota entre Lisboa e Hangzhou será inaugurada ainda este ano.
Os chineses da HNA, que vão entrar no capital da TAP, já têm luz verde para lançar uma rota para Portugal. Depois de quase duas décadas de promessas de uma ligação directa à China, os voos para Lisboa deverão ser inaugurados ainda este ano, graças aos esforços diplomáticos do Ministério dos Negócios Estrangeiros e à coordenação entre as autoridades reguladoras dos dois países. Neste momento, estão já a ser discutidos os valores dos incentivos a atribuir pelo Turismo de Portugal à nova rota.
Os voos serão operados pela Capital Airlines, detida pela HNA, a partir de Hangzhou, a menos de 200 quilómetros de Xangai. O pedido de autorização deu entrada na Administração de Aviação Civil da China (CAAC, na sigla em inglês) há alguns meses, mas só recentemente foi comunicada a autorização ao Governo e ao supervisor português, a Autoridade Nacional da Aviação Civil (ANAC). Jorge Costa Oliveira, secretário de Estado da Internacionalização, que esteve envolvido directamente nas negociações, confirmou ao PÚBLICO que “em meados de Maio o Ministério dos Negócios Estrangeiros recebeu um telegrama diplomático enviado pela CAAC dando conta da aceitação”. Isto depois de ter reunido com a HNA em Janeiro, que lhe deu conta “da entrada do pedido de autorização para a Capital Airlines operar voos directos para Portugal”.
Já a ANAC, a quem, ao que o PÚBLICO apurou, também foi enviada a autorização da congénere chinesa, referiu que “foi informada pela CAAC de que a Capital Airlines pretende iniciar serviços aéreos reguladores” entre a China e Portugal. O regulador referiu que cabe agora à transportadora aérea “solicitar à ANAC a autorização para a operação dos serviços aéreos, apresentando para o efeito o programa de exploração pretendido, bem como documentação” da companhia e das aeronaves.
O processo não foi fácil, já que existe desde 1999 um acordo de transporte aéreo entre Portugal e a China que dava à Air China, a companhia de aviação de bandeira do país, o exclusivo nos voos directos para Portugal. Apesar desta “licença” e de ter chegado a fazer estudos, a intenção da Air China de lançar voos entre Lisboa e Pequim nunca passou do papel, exactamente porque a transportadora concluiu que não teriam viabilidade económica. Mas, ainda assim, manteve o estatuto de única empresa autorizada a operar rotas para território nacional. Chegou a equacionar-se uma alteração ao acordo de 1999, mas, além de moroso, esse passo poderia revelar-se complexo, já que teria passar pelo crivo da Comissão Europeia.
O secretário de Estado explicou que “se o Governo tivesse optado por alterar o acordo aéreo com a China, que estabelece a designação única à Air China, o processo teria de ser validado por Bruxelas, passo que, além de mais demorado, exigiria provavelmente o cumprimento de novas cláusulas”. Além disso, ainda está neste momento em negociações o acordo aéreo global entre a União Europeia e a China, “pelo que não faria sentido haver uma alteração circunscrita a um Estado-membro”.
Governo vê potencial
A alternativa foi selar um entendimento, numa “base temporária e excepcional”, para permitir que a companhia do grupo HNA passe a operar esta rota. Ou seja, haverá agora um processo administrativo, com passagem obrigatória pela ANAC, em que a Capital será autorizada a operar determinados voos por cada temporada (Verão e Inverno). Ainda de acordo com Jorge Costa Oliveira, ficou igualmente concertado que o prazo temporário a atribuir terá um horizonte global de “pelo menos três a cinco anos”. Neste campo, a ANAC explicou que uma segunda transportadora aérea chinesa "poderá ser designada após alteração do acordo aéreo". No entanto, referiu que "uma vez que a realização de consultas e a conclusão do processo negocial são demorados", pode "autorizar excepcionalmente serviços aéreos", em função dos "méritos de cada pedido, designadamente no que releva ao reforço da conectividade e à captação de fluxos turísticos".
De acordo com a publicação Travel Daily, que esta semana noticiou o pedido que a Capital Airlines remeteu à CAAC, a intenção da transportadora é operar o voo num Airbus A330, com 33 lugares na classe executiva e 178 na económica. A companhia já tem voos regulares para Copenhaga e Madrid e está a avaliar a abertura de uma nova rota para Birmingham.
Os voos para Lisboa terão de partir de Hangzhou, com passagem por Pequim, uma vez que “não existem neste momento slots disponíveis” nesta última cidade, referiu o secretário de Estado, que salientou o “papel muito importante” que a Embaixada da China em Portugal teve para que este dossier fosse desbloqueado. “Neste momento, falta finalizar com o Turismo de Portugal o valor dos incentivos a atribuir à rota a lançar pela Capital Airlines, até porque haverá um défice operacional durante algum tempo”, acrescentou. Este organismo público tem, em conjunto com a gestora aeroportuária ANA, um programa de incentivos atribuídos a voos considerados de interesse estratégico.
Para o secretário de Estado, “além da rota em si, o grupo HNA poderá trazer outras mais-valias a Portugal, seja porque têm uma das principais agências de viagens da China, o que fomentará o turismo, seja porque controlam um dos maiores operadores de handling do mundo, a Swissport, o que poderá estimular a passagem do tráfego de carga por território nacional”. Além disso, referiu Jorge Costa Oliveira, “o histórico mostra-nos que para onde voam fazem investimentos, como aconteceu em Madrid com a cadeia hoteleira NH. Em Portugal também terão interesse em fazer investimentos, nomeadamente nesta área”.
Além da Air China, a TAP também mostrou, por diversas vezes, interesse em voar para Pequim, mas o objectivo foi sendo adiado. Em 2010, a companhia firmou um acordo de code-share (partilha de voos) com a transportadora chinesa. Mas agora deverá mudar de rumo com os voos da Capital Airlines, já que a HNA vai entrar no capital da TAP.
O novo contrato de venda da companhia nacional, assinado a 21 de Maio e que devolve ao Estado 50% do capital, prevê que a HNA fique com 7% da Atlantic Gateway, o consórcio privado de Humberto Pedrosa e David Neeleman que ficará com 45% a 50% da TAP (dependendo da adesão dos trabalhadores aos 5% que lhes estão reservados). Mas o grupo chinês terá ainda uma posição indirecta de 13% no consórcio. Isto porque detém 23,7% da Azul, a companhia de David Neeleman que investiu 90 milhões na TAP, através de um empréstimo obrigacionista.