As duas faces de Capoulas Santos
Só posso constatar que Portugal perdeu um excelente eurodeputado e ganhou um mau ministro da Agricultura.
A recente decisão, pelo Ministério da Agricultura, de retirar a proposta de reprogramação do Plano de Desenvolvimento Rural 2020 apresentada à Comissão Europeia pelo anterior Governo vem colocar em causa o investimento na Agricultura, em Portugal. Esta é uma situação com gravíssimos contornos e consequências para o sector, numa primeira instância, e para o desenvolvimento sustentado do nosso país, numa segunda. Com esta posição, Portugal deixa de aplicar 200 milhões de euros no PDR2020, que são fundamentais para permitir o alargamento do número de beneficiários, o apoio ao rejuvenescimento e inovação no sector, e revelam-se essenciais para que não se comprometa o investimento agrícola assumido para com os Agricultores e as respectivas Associações. Este facto é tão ou mais grave se se tiver em linha de conta que o sector agrícola foi o mais resiliente na recente crise económica, financeira e social do nosso país, e um dos que mais contribuíram para o aumento das exportações nacionais.
Este putativo “buraco” de 200 milhões que Capoulas Santos menciona, é apenas um facto político, criado pelo seu próprio Governo PS, que aloca esses montantes a outras áreas que não a Agricultura e que sabe, também, que estamos numa fase inicial de execução deste programa, havendo necessariamente folga financeira para acomodar esta situação. Sem dúvida que se trata de uma diferente orientação das políticas agrícola e orçamental deste Governo PS, o que é legítimo, mas importa salientar que estamos perante uma contradição que tem de ser assumida pelo Ministro da Agricultura, uma vez que foi o próprio Capoulas Santos que garantiu, em plena campanha eleitoral para as legislativas de 2015, que pagaria “com gosto a factura” associada ao investimento programado pelo Governo PSD/CDS-PP. Capoulas Santos, que foi apresentado por António Costa como o rosto da prioridade do PS na Agricultura, dá o dito pelo não-dito e logra as expectativas corroboradas pelo próprio junto dos profissionais e empresários agrícolas portugueses.
Num período em que estamos perante uma generalizada crise agrícola europeia, fruto do embargo russo e do termo das quotas leiteiras, o Governo de Portugal desiste da Agricultura e, pela segunda vez em menos de dois anos, o PS evidencia não entender que a Agricultura deva constituir uma prioridade. Numa fase em que se lança, na Europa, o Semestre Europeu que visa um crescimento sustentável assente no relançamento de investimentos públicos e privados, o Governo português segue em contra-corrente e gera um desinvestimento generalizado na Agricultura em Portugal.
Na audição pela Comissão de Agricultura e Mar, Capoulas Santos tem de assumir com que face se apresenta perante os portugueses. Espero que não o faça com a face que permite que o seu Governo aplique os primeiros cortes orçamentais precisamente ao sector que representa, tanto mais, quando esse mesmo Governo garante estar em condições de poder aumentar as despesas com diversos sectores e entidades económicas portuguesas. Ao Ministro da Agricultura exige-se que se apresente com a face potenciadora do investimento, assegure o pagamento de todos os compromissos assumidos, dê continuidade ao processo de reestruturação das explorações agrícolas portuguesas e incentive a competitividade neste sector estruturante da nossa economia e tão relevante na fixação da população nas Regiões mais rurais.
A manter-se assim, só posso constatar que Portugal perdeu um excelente eurodeputado e ganhou um mau ministro da Agricultura.
Eurodeputada (PSD), membro da Comissão de Agricultura e Desenvolvimento Rural