Acordo transatlântico beneficiaria comércio português, diz Vital Moreira
O político português defende a assinatura do tratado comercial entre os Estados Unidos da América e a União Europeia.
O ex-eurodeputado Vital Moreira defendeu esta quinta-feira que Portugal seria "um dos primeiros beneficiados" com o acordo comercial entre União Europeia e Estados Unidos, nomeadamente nas áreas do calçado e vestuário.
Intervindo na segunda edição das Conferências de Lisboa, que decorrem esta quinta e sexta-feira na Fundação Calouste Gulbenkian, o antigo presidente da comissão de comércio internacional do Parlamento Europeu afirmou que "Portugal seria um dos primeiros beneficiados, estranhamente", de acordo com dois estudos independentes sobre o impacto do Acordo de Parceria Transatlântica de Comércio e Investimento (TTIP, na sigla em inglês).
"A posição de Portugal é particularmente confortável: aquilo em que nós somos competitivos é aquilo em que os EUA têm tarifas mais altas, como o calçado e o vestuário", referiu. Vital Moreira sugeriu mesmo que, dada a centralidade de Portugal no Atlântico, caso o acordo seja alcançado, deverá ser assinado nos Açores, mais concretamente na capital, Ponta Delgada.
"Simbolicamente, já sugeri que o Governo português proponha que o acordo seja assinado em Ponta Delgada, não só porque os Açores ficam no coração do mercado transatlântico, mas também para fazer esquecer um tristemente célebre encontro nos Açores há uma dúzia de anos", disse, referindo-se à cimeira das Lajes, em 2003, que ditaria o início da intervenção militar contra o regime de Saddam Hussein, no Iraque.
Por outro lado, "Portugal é periférico na União Europeia, mas é central no Atlântico" e o acordo "será vantajoso para Portugal para reequilibrar a face atlântica da União Europeia", que pendeu mais para Leste devido ao alargamento aos países do leste europeu.
Além disso, permitiria contrariar a deriva norte-americana para o oceano Pacífico e "não há nenhuma vantagem em que a União Europeia deixe que os Estados Unidos se inclinem para o Pacífico".
No entanto, há questões por resolver, a Europa já traçou as suas "linhas vermelhas" e o acordo "não está em vésperas de ser concluído", considerou o constitucionalista, que defendeu contudo que "seria estúpido e irresponsável não empenhar todos os esforços" na sua conclusão.
Pelo lado norte-americano, Claire Reade, que colaborou com a administração norte-americana em matéria de comércio internacional, lembrou que a relação entre EUA e UE "representa 30% do comércio mundial".
"É necessário avançar com esta relação comercial incrível para aumentar a cooperação", sustentou, mas avisou que os dois blocos "são demasiados próximos, são familiares e infelizmente podem estar permanentemente às turras em vez de cooperar", algo que a China "adoraria que acontecesse".
Muito crítica em relação ao acordo, a investigadora Eveline Herfkens, da universidade Johns Hopkins, alertou para os impactos para os países em desenvolvimento, nomeadamente na África subsaariana. O TTIP quer "remodelar a governação mundial" e fazer com que Europa e América "sejam o padrão", o que significa "capitular ou ser excluído", considerou.
Lembrando que a agricultura é a oportunidade para muitos países africanos, a antiga representante permanente nas Nações Unidas e na Organização Mundial do Comércio avisou que, caso não se pense naquele continente, "o acesso ao mercado será terrível e deixará muitas pessoas na pobreza".
Entre esta quinta e sexta-feira, a segunda edição das Conferências de Lisboa vai debater as dificuldades atuais na União Europeia, a globalização e as ameaças de segurança, contando com a presença de cerca de 30 oradores nacionais e internacionais.
O programa do encontro, que decorre na Fundação Calouste Gulbenkian, em Lisboa, tem quatro painéis: "Conceitos Globais: Desenvolvimento Sustentável e Globalização", "Políticas Globais: Reconfigurações geoeconómicas e Entre biliteralismo e proteccionismo", "Geografias Globais: Um Norte-Sul de fronteiras difusas e Ameaças de segurança", e "Atores Globais: A União Europeia numa encruzilhada".
As Conferências de Lisboa são uma iniciativa conjunta da Gulbenkian, Câmara Municipal de Lisboa, Câmara de Comércio e Indústria Portuguesa, Fundação Portugal-África, ISCTE - Instituto Universitário de Lisboa, União das Cidades Capitais de Língua Portuguesa (UCCLA), Sofid e Instituto Marquês de Valle Flôr.