As pensões mínimas e a condição de recursos
Como é que em Portugal, um Governo do Partido Socialista, com o apoio parlamentar do BE e do PCP, pode defender tal tese?
O primeiro-ministro e mais recentemente o ministro das Finanças defenderam que as pensões mínimas deveriam estar sujeitas à aplicação de uma condição de recursos.
A Segurança Social garante uma pensão mínima, que depende da duração, mas não do montante, da carreira contributiva. Ou seja, por exemplo, quem tenha descontando muito pouco para a Segurança Social, tem direito a 263 euros por mês, se descontou menos de 15 anos, mesmo que, através das regras gerais, considerando os descontos realizados, só tivesse direito a 150 euros por mês. E se tiver descontado mais anos, tem direito a uma pensão mínima algo superior. No início de 2016, existiam 946 mil pessoas com direito a pensões mínimas.
Ou seja, não estamos a falar de montantes muito grandes de alegados “donativos do Estado”, mas estamos potencialmente a falar de um grande número de beneficiários, por conseguinte, com um “modesto” impacto nas contas públicas (duas ou três centenas de milhões de euros por ano, dá a entender o “Estudo sobre o impacto financeiro do programa eleitoral do PS”).
Ora primeiro-ministro e ministro das Finanças defenderam que alguém com um património significativo, ou alguém com rendimento proveniente do estrangeiro mas que só trabalhou poucos anos em Portugal, não deve beneficiar da pensão mínima, mas somente receber aquilo a que teria direito de acordo com a sua carreira contributiva. Contudo, a tese subjacente à medida defendida pelo primeiro-ministro e ministro das Finanças parece-me incorrecta por várias razões:
Primeiro, porque considero perigoso estender à principal política redistributiva do Estado (pensões), a condição de recursos já aplicada, na minha opinião erradamente, a demasiadas políticas sociais. A condição de recursos deveria ser sobretudo implementada através do imposto progressivo sobre o rendimento (IRS) e através de um imposto progressivo sobre o património.
A aplicação da condição de recursos através de impostos, não só é mais simples, automática e justa, como exige menos esforço do contribuinte ou do beneficiário.
Por outro lado, a condição de recursos, conhecida em inglês como “means-testing”, é uma questão muito polémica e muito debatida em países como os EUA, com vários prémio Nobel da economia, como Paul Krugman ou Joseph Stiglitz, a oporem-se a tal medida. Afigura-se que a condição de recursos põe em causa a Segurança Social tal como concebida, entre outros, por Franklin D. Roosevelt.
Em relação às pensões de reforma, as contribuições são (com algumas excepções) uma proporção constante do rendimento. A redistribuição ocorre com a atribuição das pensões: quem menos contribuiu recebe proporcionalmente mais – nesta medida é um sistema de solidariedade social, i.e., uma política redistributiva do Estado –. A Segurança Social é ainda um tipo de seguro, porque procura garantir à maioria um nível de rendimento minimamente condigno, que em parte seja um garante contra as vicissitudes da sua vida. É, devido a essas características, um programa social de extremo sucesso no combate à pobreza.
Por último, a aplicação da condição de recursos é defendida em países, como os EUA, por alguns políticos do Partido Republicano. Mas nem nos EUA esses políticos conseguiram introduzir essa alteração à Segurança Social. Os benefícios da Segurança Social nos EUA não estão sujeitos à aplicação de uma condição de recursos nem é previsível que tal venha a ocorrer.
Como é que em Portugal, um Governo do Partido Socialista, com o apoio parlamentar do BE e do PCP, pode defender tal tese?