Sarkozy começou a ser julgado por acusações de financiamento ilegal pela Líbia
Ex-Presidente francês terá recebido milhões de euros do regime do ditador líbio Muammar Khadafi para financiar a sua campanha eleitoral nas presidenciais de 2007, que acabaria por vencer.
O julgamento do ex-presidente francês Nicolas Sarkozy num caso que envolve alegado financiamento do regime líbio de Muammar Khadafi da campanha presidencial nas eleições de 2007 começou nesta segunda-feira, numa investigação iniciada há quase 12 anos.
Sarkozy é acusado de ter cometido os crimes de “corrupção, dissimulação de desvio de fundos públicos, financiamento ilegal de campanhas e conspiração criminosa” pelo Ministério Público francês, enfrentando uma pena de prisão que pode ir até dez anos. Segundo os procuradores, o ex-presidente francês terá alegadamente montado um pacto de corrupção com diplomatas ligados a Khadafi e membros do gabinete do então candidato presidencial pelo partido de direita União por Um Movimento Popular, que viria a ganhar as eleições nesse ano.
Para além do ex-presidente, vão a tribunal 12 outras pessoas, incluindo três antigos ministros do governo de François Fillon, ligados politicamente a Nikolas Sarkozy, assim como dois intermediários e um diplomata líbio e um ex-dirigente da Airbus.
Sarkozy referiu-se ao caso como uma “fábula” antes do julgamento e alegou não existirem provas dos actos de que é acusado.
“Uma questão permanece: como é que, se o financiamento da minha campanha pela Líbia foi tão maciço — estamos a falar de várias dezenas de milhões —, é tão óbvio, porque é que não há provas? Nem sequer o início de uma prova? Esta é a questão central deste caso”, afirmou o ex-presidente.
“Após dez anos de investigação, com uma utilização sem precedentes de recursos, escutas telefónicas, juízes a viajar para o estrangeiro, por todo o mundo, não há, obviamente, qualquer vestígio de financiamento, qualquer transferência, qualquer pagamento, nem sequer um montante para o alegado financiamento”, disse o advogado de Sarkozy, Christophe Ingrain, citado pela Reuters.
Depois da sua eleição, Sarkozy mudou a política da França face ao regime líbio, convidando Khadafi a visitar o país em 2007 naquela que foi a primeira visita do líder ao país em 34 anos e acordando a venda de aviões fabricados pela Airbus.
Foi com a entrada da França, liderada por Sarkozy, no apoio à oposição ao regime na guerra civil da Líbia que o cenário mudou. França juntou-se à intervenção internacional no país e realizou operações militares em território líbio para assistir as tropas rebeldes contra as forças do regime.
Com esta mudança de atitude da França liderada por Sarkozy face à Líbia, vários elementos ligados ao regime líbio alegaram que a razão pela qual o então líder da direita francesa foi eleito Presidente terá sido devido à ajuda da Líbia.
O primeiro a falar sobre o assunto foi Saif-al-Islam Khadafi, filho do então líder, que disse numa entrevista à Euronews que a Líbia tinha financiado a campanha de Sarkozy.
“Fomos nós que o financiámos, temos todos os pormenores e estamos prontos a revelar tudo. A primeira coisa que queremos que este palhaço faça é devolver o dinheiro ao povo líbio”, acusou Saif-al-Islam, que falou antes de o seu pai contar o mesmo numa entrevista à televisão France 3.
“Foi graças a mim que ele se tornou Presidente... Demos-lhe os fundos que lhe permitiram ganhar”, disse então Muammar Khadafi, tendo ainda insultado as capacidades do então Presidente francês. O líder líbio foi capturado e morto pelos rebeldes em Outubro de 2011.
Em 2012, o órgão de comunicação francês Mediapart, em vésperas da segunda volta das presidenciais desse ano, publicou uma reportagem de investigação em que expunha o caso e parecia corroborar as alegações dos representantes líbios, revelando um documento que aparentava prometer uma quantia de 50 milhões de euros para um apoio a Sarkozy.
A investigação policial iniciou-se no ano seguinte e, em 2018, Sarkozy foi detido e constituído arguido. No despacho que levou o ex-presidente a julgamento em 2023, lê-se que, “aparentemente, terá sido feito um pacto de corrupção entre Nicolas Sarkozy e Muammar Kadhafi para financiar a primeira eleição do Presidente francês”.
Sarkozy foi recentemente condenado a três anos de prisão, com um dos anos passados em prisão domiciliária, por ter subornado um alto magistrado do Tribunal de Cassação para obter informações sobre outros casos em que estava envolvido, incluindo um outro relacionado com financiamento ilícito da sua campanha eleitoral às presidenciais de 2007 e do qual o presidente foi absolvido. Apesar de condenado, a pena ainda não foi aplicada, pelo que Sarkozy não foi ao julgamento desta segunda-feira com a pulseira electrónica.