Coreia do Sul ordena inspecção de emergência a todas as operações depois de acidente aéreo
Desastre aéreo com mais vítimas mortais em solo sul-coreano matou 179. Ministério dos Transportes começará por inspeccionar todos os 101 Boeing 737-800 operados por companhias aéreas nacionais.
"Um pássaro está preso na asa. Não podemos aterrar. Devo escrever as minhas palavras de despedida?", escreveu numa mensagem de texto um dos passageiros que seguiam no voo 2216 da Jeju Air, não imaginando que, para quem estava a ler, estas seriam mesmo as suas últimas palavras. A SMS foi enviada pouco antes das 9h deste domingo. Meros minutos depois, ao aterrar no Aeroporto Internacional de Muan, no Sudoeste da Coreia do Sul, o avião deslizou na pista e colidiu com uma parede de betão, incendiando-se de imediato e matando 179 pessoas que seguiam a bordo.
Já é o desastre aéreo com mais vítimas mortais de 2024 e o pior de sempre em solo sul-coreano, matando dezenas de pessoas que voltavam de férias na Tailândia. Os únicos dois sobreviventes são membros da tripulação, um homem e uma mulher, que estão hospitalizados. O voo da Jeju Air, uma companhia low-cost sul-coreana, partiu de Banguecoque já depois da meia-noite (hora local). Às 8h54, já muito próximo da Coreia do Sul, a tripulação recebeu um aviso relativo a aves no espaço aéreo próximo. Os pilotos, que já faziam uma aproximação programada, confirmaram uma colisão com as aves. Minutos depois, o avião declarou mayday à torre de controlo do aeroporto de Muan. Depois de uma primeira tentativa falhada, o avião tenta aterrar mas, às 9h03, derrapou sobre a pista ao longo dos 2800 metros e embateu na parede de betão, explodindo numa bola de fogo.
Em 13 minutos, as autoridades declararam uma emergência de nível 3, mobilizando 80 bombeiros, apoiados por 32 viaturas e equipas de resgate de toda a região. Durante 43 minutos longos minutos, os bombeiros lutaram contra as chamas, que foram contidas às 9h46. A causa oficial do acidente ainda não é conhecida.
O presidente em exercício da Coreia do Sul, Choi Sang-mok já ordenou uma inspecção de segurança de emergência a todas as operações aéreas do país. A prioridade máxima nesta altura é identificar as vítimas, apoiar as suas famílias e tratar os dois sobreviventes, disse Choi numa reunião de gestão de catástrofes em Seul. "Mesmo antes dos resultados finais, pedimos que os funcionários divulguem de forma transparente o processo de investigação do acidente e informem prontamente as famílias que estão em luto", apontou.
O Ministério dos Transportes, segundo anunciou, vai começar por realizar uma inspecção especial a todos os 101 Boeing 737-800 operados por companhias aéreas sul-coreanas e que operam em voos domésticos. Depois, as autoridades deverão realizar uma investigação de segurança de emergência a todo o sistema de operação aéreo para evitar a recorrência de acidentes aéreos”, disse Choi Sang-mok.
Os investigadores estão a examinar a colisão com as aves, se algum dos sistemas de controlo do avião foi desactivado e a aparente pressa dos pilotos em tentar aterrar pouco depois de declararem emergência como possíveis factores do acidente, disseram os bombeiros e as autoridades de transportes. Os peritos afirmam que subsistem muitas questões, incluindo a razão pela qual o avião, equipado com dois motores CFM 56-7B26, parecia estar a viajar a grande velocidade e porque é que o trem de aterragem parecia não estar baixado quando o avião derrapou na pista de "barriga para baixo".
As autoridades também irão a investigar o papel que a antena localizadora, situada no final da pista para ajudar na aterragem e instalada em cima da parede de betão com que o avião colidiu, desempenhou no acidente, disseram funcionários do Ministério dos Transportes numa conferência de imprensa.
"Faça o que fizer a minha filha não vai voltar"
No terminal do aeroporto, várias famílias que aguardavam a chegada de entes queridos assistiram horrorizadas às imagens que mostravam a aeronave em chamas. Às 12h55, como descreve o The Guardian, Choi Sang-mok chegou ao aeroporto e foi imediatamente cercado por pessoas desesperadas por respostas e boas notícias. Quando o chefe dos bombeiros de Muan, Lee Jeong-hyun, revelou que a "maioria dos 181 passageiros foram dados como mortos”, a sala de reunião explodiu em choros e gritos de tristeza.
O acidente matou sobretudo residentes locais que regressavam de férias na Tailândia, tendo morrido também dois cidadãos tailandeses. "Só posso aceitar e fazer as pazes com a situação", disse Boonchuay Duangmanee, de 77 anos, pai de uma das vítimas tailandesas. "Tenho de pensar que foi um acidente, que pode acontecer a qualquer um. Já me conformei, faça o que fizer a minha filha não vai voltar."
Nesta segunda-feira, enquanto o país inicia o segundo dia de luto oficial e as bandeiras estavam a meia-haste, as autoridades continuam a trabalhar para identificar dezenas de corpos. Park Han-shin, que perdeu o irmão no acidente, disse ter sido informado pelas autoridades que o corpo tinha sido identificado, mas que não o poderia ver.
As caixas negras do avião já foram recuperadas: o gravador de dados de voo foi encontrado às 11h30, cerca de duas horas e meia após o acidente e com alguns danos, e o gravador de voz do cockpit às 14h24, segundo o Ministério dos Transportes. O gravador foi transportado para Seul e a análise começará quando uma equipa do National Transportation SafetyBoard (NTSB) dos EUA e funcionários da Boeing chegarem ao país nesta segunda-feira.
Embora a investigação do acidente se vá concentrar no modelo do avião, as atenções virar-se-ão inevitavelmente para a operadora do voo, a Jeju Air. A transportadora low-cost já afirmou que fará tudo o que puder para apoiar as famílias das vítimas, inclusive com ajuda financeira. O presidente-executivo, Kim E-bae, disse numa conferência de imprensa que assume "total responsabilidade" pelo acidente, independentemente da causa. Sublinhou também que a empresa não identificou nenhum problema mecânico com a aeronave depois de feitas verificações regulares e que esperará pelos resultados das investigações do Governo, que podem demorar meses.
O Aeroporto Internacional de Muan permanece encerrado até quarta-feira, mas os restantes aeroportos internacionais e regionais do país, incluindo o principal Aeroporto Internacional de Incheon, continuam a funcionar como previsto. Choi, que está a supervisionar os esforços de recuperação e a investigação, tornou-se líder interino há apenas três dias, depois de o Presidente ter sido destituído devido à imposição de uma lei marcial no país.