Foi um dos momentos mais surpreendentes da América moderna: alguém matou a sangue frio o poderoso director-executivo de uma empresa de cuidados de saúde, e o assassínio foi acolhido não só com simpatia, mas até com a aprovação de alguns cantos da Internet, frustrados com o sistema de saúde norte-americano.
Como em todos os acontecimentos deste género, há uma dúvida legítima sobre o quão real e generalizado é este sentimento. As redes sociais podem dar uma imagem distorcida do que os americanos comuns sentem, porque os que têm opiniões mais extremistas tendem a dominar a conversa. A provocação reina, e elogiar ou mesmo meramente legitimar um alegado assassino vigilante é certamente provocador.
Bem, agora já foram publicadas algumas análises iniciais. E a simpatia parece de facto notavelmente real e relativamente generalizada — especialmente entre os jovens adultos.
Na terça-feira, foi dada muita atenção a uma sondagem que mostrava que os americanos com idades entre os 18 e os 29 anos estavam divididos sobre se as acções do alegado assassino eram “aceitáveis”. Mas essa conclusão baseou-se numa subamostra relativamente pequena de cerca de 140 pessoas, e é sempre melhor consultar mais do que uma sondagem.
No entanto, outras sondagens de maior qualidade também confirmam este facto.
A empresa de sondagens YouGov fez recentemente uma série de perguntas sobre o assassínio do director-executivo da UnitedHealthcare, Brian Thompson, em Manhattan, há duas semanas, e sobre o homem que foi acusado de o ter cometido, Luigi Mangione. (Mangione foi acusado na terça-feira de assassínio e terrorismo).
Muitas pessoas pareciam não estar familiarizadas com a história, não dando opiniões. Mas entre os que sabiam o que se passava, muitos jovens adultos pareciam simpatizar com o alegado assassino. E, nomeadamente, consideravam que as pessoas que os rodeavam partilhavam essa opinião.
A sondagem, que inquiriu mais de 1000 pessoas, mostrou que os americanos adultos com menos de 30 anos estão divididos de forma equilibrada quanto à opinião favorável ou desfavorável de Mangione. Os adultos com idades compreendidas entre os 30 e os 44 anos inclinam-se apenas ligeiramente para o lado negativo. (Em contrapartida, os americanos com mais de 65 anos têm uma opinião desfavorável sobre Mangione por uma margem de cerca de 15 para 1. Em geral, os americanos têm uma opinião negativa sobre Mangione de mais de 2 para 1).
De facto, os jovens adultos vêem Mangione de forma mais favorável do que o homem que alegadamente matou, Thompson.
Mas talvez o mais surpreendente seja a forma como esses jovens adultos percepcionaram as reacções das outras pessoas ao assassínio.
Quando questionados sobre o que sentiam as pessoas à sua volta, cerca de 4 em cada 10 adultos com menos de 30 anos disseram que a maioria das pessoas que conheciam aprovava o assassínio de Thompson (21%) ou que estavam divididas (18%). Apenas 30 por cento disseram que a maioria das pessoas que conheciam desaprovava.
O número de adultos com idades compreendidas entre os 30 e os 44 anos que afirmaram que as pessoas que conheciam estavam, pelo menos, divididas, foi o mesmo que afirmou que a maioria desaprovava.
(Mais uma vez, há um enorme contraste com os americanos mais velhos. Apenas 1 em cada 10 deles diz que as pessoas que conhecem aprovam maioritariamente o assassínio de Thompson ou estão divididas de forma equilibrada; 68% dizem que a maioria desaprova).
Porque é que estes números são relevantes? Porque os responsáveis pelas sondagens fazem frequentemente uma pergunta desta forma para avaliar melhor a opinião pública. Pedir às pessoas que relatem as opiniões dos que as rodeiam pode efectivamente expandir o conjunto de respostas, transformando as pessoas em “mini-antropólogos”. E, numa situação como esta — em que as pessoas que podem aprovar o assassínio podem não querer dizê-lo em voz alta (ou dizê-lo a um especialista em sondagens) —, pode ser um sinal dos verdadeiros sentimentos das pessoas.
Alguns dos resultados da sondagem são um pouco mais difíceis de enquadrar, uma vez que as opiniões das pessoas tendem a ser algo inconsistentes.
Enquanto os jovens adultos se dividem de forma equilibrada na sua opinião sobre Mangione, são menos propensos a aprovar o conceito de violência legítima de vigilantes contra empresas.
Quando questionados sobre se “alguma vez se justifica que os cidadãos recorram à violência para responsabilizar as empresas”, 55% dos adultos com menos de 30 anos dizem que nunca se justifica, enquanto 21% dizem que pode justificar-se. Os números são semelhantes para as pessoas com idades compreendidas entre os 30 e os 44 anos (apenas 2% dos seniores dizem que essa violência pode ser justificada).
Mas ainda assim, cerca de 1 em cada 5 jovens adultos americanos consegue ver-se a assinar algo como o que é possível ter acontecido em Manhattan. E isso é um comentário notável sobre o ponto em que nos encontramos enquanto sociedade.