“Deixem-nos trabalhar”. Trabalhadores da Trust in News pedem continuação dos títulos
Dezenas de trabalhadores da Trust in News (detentora de 16 títulos, como a Visão e o Jornal de Letras) manifestaram-se para denunciar a crise vivida na empresa, que foi declarada insolvente.
“Sem jornalismo não há democracia”, entoaram as dezenas de trabalhadores do grupo Trust in News (TIN) que se manifestaram em Lisboa para denunciar a crise vivida na empresa, dona de 16 títulos, como a Visão, o Jornal de Letras ou a Caras. No dia em que a empresa foi declarada insolvente, os trabalhadores mantêm esperança na possibilidade de preservar as publicações e os 140 postos de trabalho em risco.
Às 18h00 desta quarta-feira, foram vários os jornalistas do grupo TIN que ocuparam os degraus da estátua do Largo Camões, em Lisboa, erguendo cartazes em que se podiam ler frases como "deixem-nos trabalhar", "os teclados não pararão" ou "para que a democracia não morra na escuridão não deixem morrer a Visão".
“Acreditamos que é possível manter os títulos e os trabalhadores”, diz ao PÚBLICO Clara Teixeira, delegada sindical da Visão, sublinhando que as publicações têm assinantes, vendas em banca e publicidade.
Reconhecendo que a situação do grupo “é muito difícil”, a jornalista explica que os trabalhadores organizaram a concentração para lançar o apelo a "toda a sociedade, aos leitores, a anunciantes e também a potenciais compradores" para que avancem e invistam no grupo.
“Sempre que se encerra um título, é pluralismo que se perde”, nota Clara Teixeira.
“Temos esperança” que as publicações se possam manter, declara Manuel Halpern, jornalista do Jornal de Letras, acrescentando que “já apareceram algumas propostas para alguns títulos”.
Os trabalhadores do grupo acreditam que há condições para manter os títulos e não se mostram disponíveis para desistir das publicações em que trabalham. Foi essa a mensagem que a moldura humana que ocupou os degraus do Largo Camões quis passar. “Não baixaremos os braços”, repetiram em diversas intervenções.
Poucas horas antes de começar a concentração dos trabalhadores da TIN, a empresa era declarada insolvente pelo Tribunal Judicial da Comarca de Lisboa Oeste. Uma decisão que não surpreende os trabalhadores, já que o grupo viu o Plano Especial de Revitalização (PER) ser reprovado, pelo fisco e pela Segurança Social, a 5 de Novembro e a administração anunciou a intenção de apresentar um plano de insolvência no dia 12 do mesmo mês.
Na sequência da declaração de insolvência, André Fernando de Sá Correia Pais foi nomeado pelo tribunal como administrador de insolvência.
“O administrador de insolvência vai decidir se mantém a publicação dos títulos” até à eventual chegada de um novo comprador, explica Clara Teixeira.
“Está tudo em aberto, tudo pode acontecer”, nota Manuel Halpern. “Não fazemos a mínima ideia do que vai fazer o administrador de insolvência, que tem poder para tudo, pode despedir pessoas e fechar títulos”, mas “esperamos que seja alguém com bom senso”, diz.
A dívida da TIN ascende a mais de 32 milhões de euros, sendo que mais de metade é ao Estado, e os atrasos no pagamento de salários e subsídios aos funcionários começaram em Novembro do ano passado.
Em retrospectiva, Manuel Halpern considera que os trabalhadores do grupo deviam ter protestado mais cedo, o que não aconteceu porque “houve um engodo por parte da anterior administração”, liderada pelo ex-jornalista Luís Delgado e que foi afastada a pedido dos trabalhadores, reunidos em plenário. “Houve uma promessa de injecção de capital que não se concretizou” e um “conjunto de mentiras” da administração, aponta o jornalista.
“Luís Delgado prometeu fazer uma injecção de capital na empresa”, tendo depois “alegado diversas dificuldades”, frisa Clara Teixeira.
Aos trabalhadores do grupo, juntaram-se leitores, jornalistas de outros meios de comunicação e figuras políticas, como António Filipe, deputado do PCP, João Ferreira, vereador do PCP na Câmara Municipal de Lisboa, Francisco Louçã, antigo coordenador do Bloco de Esquerda, Mara Lagriminha, deputada do PS, e Filipa Pinto, parlamentar do Livre.
Em declarações ao PÚBLICO, João Ferreira considerou que os trabalhadores chegaram a uma “situação limite”, com “salários em atraso” e condições “laborais inaceitáveis”.
“Com cada situação destas que acontece, o pluralismo mediático - que já não é extraordinário - fica ainda mais empobrecido”, argumenta, acrescentando que o empobrecimento do pluralismo mediático tem “repercussões na qualidade da informação que é produzida” e tem “impacto na qualidade da própria democracia”.