Artur Jorge na final da Libertadores, contra o que só acontece ao Botafogo

Depois de Jorge Jesus e Abel Ferreira, o ex-treinador do Sp. Braga pode tornar-se no terceiro técnico português a vencer a Champions da América do Sul.

Foto
Artur Jorge, técnico do Botafogo Agustin Marcarian / REUTERS
Ouça este artigo
00:00
04:15

“O Botafogo é diferente”, escreveu em tempos Nelson Rodrigues. “Dir-se-ia que o êxito exige de si uma maior abundância de suor e lágrimas. Tudo é mais difícil para o Botafogo e o povo, com o seu instinto agudo, costuma dizer, ‘Há coisas que só acontecem ao Botafogo’.” O grande escritor brasileiro escreveu estas linhas em 1957, tempo de glória para um “Fogão” que tinha Garrincha, Nilton Santos e Didi. Esta frase de Nelson Rodrigues (que era do Fluminense) fez sentido nas últimas décadas (já lá iremos), mas há um português disposto a romper com o fatalismo que envolve o clube conhecido pelo melancólico nome “Estrela Solitária”.

Artur Jorge, antigo central e ex-treinador do Sp. Braga, está no comando deste Botafogo que pode fechar 2024 a ganhar tudo. Neste sábado (20h, SPTV3), no Monumental de Buenos Aires, o Botafogo vai começar por enfrentar os seus fantasmas numa final da Taça Libertadores frente ao Atlético Mineiro. Já não é novidade nenhuma haver um português nesta decisão do título de campeão sul-americano e têm tido 100% de aproveitamento em todas as finais que disputaram: em 2019, Jorge Jesus venceu pelo Flamengo; em 2020 e 2021, Abel Ferreira foi bicampeão com o Palmeiras.

A verdade é que as últimas décadas de vida do clube carioca têm sido mais de acordo com a frase de Nelson Rodrigues. Já vai em quase 30 anos sem um título importante (venceu o Brasileirão pela última vez em 1995), nunca esteve numa final da Libertadores (chegou duas vezes às “meias”) e até já perdeu uma eliminatória da Taça do Brasil na moeda ao ar – foi nos “oitavos” de 1967, precisamente frente ao Atlético Mineiro, mas nem se sabe de que lado caiu a moeda, porque os mineiros festejaram antes de esta cair ao chão.

E não é preciso ir tão atrás no tempo para encontrarmos “coisas que só acontecem ao Botafogo”. Em 2023, numa época em que teve dois treinadores portugueses (Luís Castro, que saiu para o Al-Nassr, e Bruno Lage, que só venceu quatro jogos em 15), o Botafogo esteve na frente entre a 3.ª e a 33.ª jornada, fechou a primeira volta com 13 pontos de vantagem, mas apenas conseguiu três vitórias na segunda metade e ainda desceu para quinto, a seis pontos do campeão Palmeiras, com Abel.

Apesar do fracasso, John Textor continuou a olhar para Portugal e para os treinadores portugueses e chegou a Artur Jorge, que estava quase a terminar a sua segunda época completa como treinador principal do Sp. Braga, o clube onde quase sempre jogara e treinara (começara na formação e passara pela equipa B, antes de chegar aos seniores). A saída de Braga não foi pacífica, António Salvador queixou-se de abandono, mas recebeu alguns milhões pelo incómodo. E lá foi Artur Jorge rumo ao Rio de Janeiro, onde, para não variar, foi recebido com a mesma desconfiança que os seus compatriotas Jesus e Abel tinham sido recebidos.

Mas o ex-central não levou muito tempo a conquistar os adeptos do “Fogão”. Depois de duas derrotas a abrir, na Libertadores, e para o Brasileirão, avançou para uma época em que pode ganhar os dois títulos mais importantes, a Libertadores e o Brasileirão, cuja conquista está cada vez mais próxima depois de ter derrotado há poucos dias o Palmeiras por 3-1 – a duas jornadas do fim, os cariocas têm três pontos de vantagem sobre o “verdão”, com o melhor ataque (56 golos marcados) e a melhor defesa (28 sofridos).

Foi essa vitória convincente sobre o ainda campeão Palmeiras e todo o percurso que tem feito este ano que leva Artur Jorge a encarar com confiança o “jogo mais importante da sua carreira”. “Esta equipa nunca me falhou, os jogadores são extraordinários. Claramente é a melhor equipa de trabalho e o melhor grupo que já trabalhei. Estou confiante”, declarou o técnico de 52 anos, que tem apenas um título como treinador, uma Taça da Liga conquistada em 2024 pelo Sp. Braga.

Com um grupo que inclui alguns “velhos” conhecidos do futebol português, como os ex-FC Porto Alex Telles e Tiquinho Soares, o Botafogo tem, entre si e o fim do jejum, um Atlético Mineiro que não está propriamente num bom momento - já não ganha um jogo há mais de um mês, com seis derrotas e quatro empates nos últimos dez jogos e segue no 10.º lugar do Brasileirão. Para a equipa de Belo Horizonte, que tem o ex-portista Hulk como uma das principais figuras, será uma oportunidade de redenção para a época e de reedição de um título que conquistou em 2013.

Sugerir correcção
Comentar