Fundão avança com criação da primeira reserva micológica do país

A criação da primeira reserva micológica municipal do país deverá seguir para aprovação da assembleia municipal do Fundão em Dezembro. “O nosso objectivo é no início da Primavera estar a funcionar.”

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Reserva micológica municipal do Fundão deverá nascer em 2025 Sandra Monteiro / Míscaros
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Era “um sonho muito antigo”, adiado sucessivamente pela falta de legislação nacional, e que agora se cumpre sozinho: aquela que será a primeira reserva micológica municipal do país deverá ser aprovada em Dezembro e nascer nas terras do Alcaide, no Fundão, na Primavera de 2025.

“Está tudo preparado para que, na próxima Assembleia Municipal, que será em meados de Dezembro, possa ir o documento de aprovação do que é a reserva micológica municipal, e, depois, obviamente, ficará também em discussão pública”, anunciou Paulo Fernandes, presidente da Câmara Municipal do Fundão, durante a abertura do Míscaros – Festival do Cogumelo.

“O nosso objectivo é no início da Primavera, ou seja, entre Março e Abril, estar a funcionar”, revelou à Fugas o autarca, à margem do evento que decorreu na aldeia do Alcaide entre 13 e 17 de Novembro, lembrando que este “é um dos primeiros, se não mesmo o primeiro, regulamento municipal” do género no país.

A reserva micológica municipal do Fundão deverá ter “cerca de 80 hectares” na “primeira fase”, podendo “depois ser ampliada para aquilo que é o contexto a norte da serra da Gardunha”, e pretende regulamentar a nível local a colheita de cogumelos silvestres. “Não é uma perspectiva proibitiva”, garante, mas de constituição de regras, de “capacitação da comunidade” com “sinalética própria” relativamente às “boas práticas associadas à recolha e manutenção deste recurso”, e criação de “algum sistema municipal de vigilância e alguma fiscalização” no interior da reserva.

“Queremos obviamente valorizar essa tradição, esse complemento familiar que é a apanha dos cogumelos, mas que ela seja feita da melhor forma possível”, sublinhou o autarca, frisando que uma apanha “desadequada” pode “impedir que ele [cogumelo] possa voltar e isso é uma perda, eventualmente, até de biodiversidade aqui no contexto da serra da Gardunha”.

Outro dos objectivos passa por abrir caminho a uma remuneração mais justa dos colectores locais. “A riqueza micológica aqui estabelecida, ao dia de hoje, pode andar na casa dos seis, sete milhões de euros por ano”, aponta Paulo Fernandes em entrevista à Fugas. Mas o valor podia ser muito maior. “Criar esta reserva micológica pode permitir depois a constituição de marcas, sistemas de qualidade, sistemas de certificação, e também um mercado mais justo”, defende.

“Muitas vezes os colectores, que geralmente são famílias daqui, depois têm os seus compradores, geralmente do mercado espanhol, que são intermediários para o mercado final.” Cogumelos pagos aos colectores, às vezes, “a três ou quatro euros por quilo” chegam ao consumidor final a “50 ou 60€/kg”. “Isto não é um mercado justo” e “até degrada aquilo que possa ser a própria valorização dos cogumelos”.

Pode permitir, igualmente, a estruturação da oferta. “Estes chefs que cá vêm [ao festival], todo o ano pedem para a gente entregar cogumelos”, aponta Fernando Tavares, presidente da Liga dos Amigos do Alcaide, entidade que organiza o Míscaros em parceria com a autarquia. “Como ainda não temos uma base de certificação boa para fazer isso, nem uma reserva que nos garanta a quantidade desejada, não conseguimos fazer”, lamenta. “Era muito importante podermos dizer que os nossos chefs portugueses estão a confeccionar cogumelos da Gardunha e do Alcaide nos seus restaurantes. Para nós, isso era um orgulho imenso.”

A criação de uma reserva micológica no Alcaide era “um sonho muito antigo”, várias vezes referido ao longo dos últimos anos, mas aguardava a aprovação de uma legislação nacional que enquadrasse a criação de reservas micológicas em todo o país, e que apesar de ter estado prevista nunca chegou a avançar. A autarquia do Fundão decidiu agora arrancar sozinha. “Depois vamos mandar o nosso regulamento também para a Assembleia da República”, avançou Paulo Fernandes, “procurando que com ele se fomente aquilo que possa ser uma regulamentação nacional da defesa do património micológico”.

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