As zonas vermelhas para os cristãos no mundo ficaram ainda piores

Dos 18 países do relatório da Fundação AIS, apresentado esta quarta-feira, só um deles, o Vietname, melhorou ligeiramente nos últimos dois anos. Moçambique e Burkina Faso entre os mais afectados.

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Manifestação de cristãos em Karachi contra os ataques a igrejas e lugares de culto em Jaranwala Akhtar Soomro/ REUTERS
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O 16 de Agosto de 2023 “assombrará para sempre” os cristãos de Jaranwala, na província paquistanesa do Punjab. Em apenas 12 horas, 80 cristãos morreram queimados e 25 igrejas e locais de culto foram profanados naquele que a Conferência Episcopal Católica do Paquistão considera como “o pior incidente contra os cristãos” na história do país.

O Paquistão, como a Índia, a China, o Sudão, a Eritreia, a Nigéria, o Burkina Faso e Moçambique, é um dos países do mundo onde a situação dos católicos piorou nos últimos dois anos, de acordo com o novo relatório sobre a perseguição religiosa dos cristãos no mundo elaborado pela Fundação AIS (Apoio à Igreja que Sofre) e esta quarta-feira apresentado ao final da tarde, em Lisboa, numa sala do MUDE – Museu do Design.

Uma iniciativa englobada na Semana Vermelha (Red Week) da Fundação AIS, que termina no dia 22, destinada a chamar a atenção para a perseguição dos cristãos no mundo através da iluminação de vermelho de monumentos nos 20 locais do mundo onde a organização católica tem escritórios. Em Lisboa, foi escolhida a estátua de D. José, na Praça do Comércio.

No Paquistão, os ataques contra as minorias religiosas e locais de culto tem aumentado significativamente desde 2023, com perseguições, falsas acusações e discriminação nos tribunais, nas escolhas e nos empregos. Sendo “os mais pobres dos pobres”, como refere o relatório Perseguidos e Esquecidos?, os cristãos paquistaneses são especialmente susceptíveis de serem perseguidos.

A situação de pobreza é também comum a outros territórios onde a vida dos cristãos piorou nestes dois anos, como sejam a Nigéria, o Sudão, a Eritreia, o Burkina Faso e Moçambique, onde insurreições jihadistas e ou situações de guerra civil trouxeram como consequência um aprofundar de perseguições religiosas a minorias, nomeadamente das minorias cristãs.

Como refere no relatório D. António Juliasse, bispo de Pemba, a capital provincial de Cabo Delgado, onde jovens do movimento Ansar al-Sunna, mais conhecido por Al-Shabab, travam uma guerra de insurgência contra as forças do Estado desde Outubro de 2017, “a pobreza endémica e a falta de educação” são “os motores da insurreição islamista, e não a religião”.

Desde que o Daesh estabeleceu ligação com os Al-Shababos, como são conhecidos em Moçambique, já a insurreição ia adiantada, o lado religioso acentuou-se até na designação de Estado Islâmico de Moçambique com que os Estados Unidos os integraram na sua lista de organizações terroristas mundiais: daí que Moçambique surja entre os países onde piorou a situação dos cristãos.

“A situação é mais sensível do que no ano passado, porque agora os cristãos começam a ser visados e a guerra está a assumir uma dimensão mais religiosa”, refere uma fonte diocesana não identificada no relatório.

O mesmo se passa no Sahel, nomeadamente no Burkina Faso, um dos países onde os jihadistas controlam partes do território e que é actualmente alvo de uma “campanha de solidariedade” da Fundação AIS que procura angariar ajuda para os cristãos daquele país da África Ocidental. Daí estar presente o padre burquinês Jacques Sawadogo para apresentar o estado da situação no seu país.

Um país onde há zonas ocupadas pelos jihadistas (os grupos ligados à Al-Qaeda controlam mais de 40% do território, de acordo com o relatório) e localidades onde só se chega por terra com escolta militar e brigadas de minas e armadilhas e a presença das instituições do Estado se limita a grandes conglomerados urbanos e, mesmo esses, ligados ao resto do território apenas por helicóptero, a perseguição dos cristãos e outras minorias tem vindo em crescendo.

“A lei da Sharia não está instituída”, diz ao PÚBLICO o padre Jacques Sawadogo sobre essas áreas controladas pelos grupos jihadistas, “mas não há liberdade religiosa, ou abraças a filosofia deles ou sais”.

Dos 18 países analisados pelo relatório só um, o Vietname, apresentou uma ligeira melhoria para os cristãos nos últimos dois anos, enquanto em dez deles a situação está hoje pior que há dois anos e só no Iraque e na Eritreia se classifica essa deterioração como ligeira. Índia, Irão, China, Sudão e Nigéria juntam-se aos referidos Paquistão, Moçambique e Burkina Faso na alteração para pior do estado dos cristãos e, em geral, das minorias religiosas.

E não estranha que, sendo mais preciso que o relatório, ao dizer que “o epicentro da violência militante islamista deslocou-se do Médio Oriente para África”, na verdade é no Sahel, a faixa central do continente africano que marca a transição das zonas desérticas sarianas e a que pertencem quatro desses países de menos liberdade religiosa, onde estão os principais perigos para os cristãos e outras minorias religiosas.

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