A exploração de trabalhadores em Portugal é um problema que, embora não seja novo, parece cada vez mais esquecido. Nos setores do comércio, serviços e logística, as condições de trabalho são frequentemente precárias: longas jornadas, baixa remuneração e a pressão constante para se “vestir a camisola” e colocar os interesses da empresa acima dos próprios. Com o aumento do custo de vida e a estagnação salarial, muitos trabalhadores portugueses enfrentam uma luta contínua para sobreviver dignamente. Ao mesmo tempo, o marketing dessas empresas promove uma imagem de empoderamento e inclusão, vendendo um "propósito" que, na realidade, está longe de ser vivido internamente.
O marketing, na sua essência, é uma ferramenta poderosa para ligar marcas a consumidores. No entanto, em muitos casos, transforma-se num instrumento para camuflar práticas laborais que se aproximam da exploração moderna. As marcas promovem campanhas emocionantes que apelam a valores como justiça social, igualdade e diversidade. Vemos empresas que proclamam a importância da sustentabilidade, enquanto, ao mesmo tempo, recorrem a práticas internas que desgastam os próprios trabalhadores. Essas campanhas criam uma imagem de “marca consciente” e servem para atrair consumidores que valorizam responsabilidade social, mas pouco se fala sobre o que acontece nos bastidores.
Esta tendência comum no marketing moderno chamado de "propósito corporativo" – a ideia de que uma marca deve representar algo maior do que apenas vender produtos. No entanto, essa procura por um “propósito” frequentemente revela-se numa estratégia de marketing vazia. Empresas que publicitam o seu compromisso com causas sociais e ambientais muitas vezes ignoram os próprios trabalhadores, mantendo-os em condições desfavoráveis e sem o mínimo de estabilidade. A moda, por exemplo, é um setor onde se vê constantemente esta contradição. As grandes marcas promovem campanhas de inclusão e respeito ambiental, mas os seus trabalhadores, principalmente em lojas e armazéns, enfrentam turnos cansativos, baixos salários e a constante incerteza de contratos temporários.
Em Portugal, essa realidade não é diferente. No retalho e noutros setores de serviços, é comum que trabalhadores sejam pressionados a trabalhar horas extras e a assumir responsabilidades a mais sem a devida compensação. Ao mesmo tempo, o marketing dessas empresas celebra valores de "resiliência" e "trabalho em equipa", como se essas características fossem voluntárias e benéficas para todos. No entanto, a "dedicação" exigida muitas vezes vem com um preço alto para o trabalhador, que sacrifica tempo, saúde e bem-estar para sustentar uma empresa que o vê mais como recurso do que como pessoa.
Empresas que dependem de baixos salários e da disponibilidade total dos trabalhadores reforçam uma cultura em que esses indivíduos são vistos como meras engrenagens. Esses trabalhadores, invisíveis nas campanhas, são fundamentais para o sucesso da marca, mas raramente recebem o devido reconhecimento. A ironia é que o marketing explora essa "disponibilidade total" como uma vantagem, promovendo-a como um valor de dedicação, enquanto, na prática, significa jornadas longas, baixa remuneração e falta de condições dignas de trabalho.
Em Portugal, onde o desemprego jovem é elevado e o custo de vida nas grandes cidades disparou, muitos trabalhadores acabam por aceitar essas condições por falta de opções melhores. A precariedade dos contratos, o uso excessivo de trabalho temporário e as poucas oportunidades de crescimento criam uma situação onde o trabalhador é, em muitos casos, substituível. Enquanto isso, o marketing vende uma imagem de empresa inclusiva e consciente, que apoia causas nobres, mas que não oferece condições justas a quem realmente a sustenta.
Uma marca que verdadeiramente deseja ser consciente e responsável deve investir nos seus trabalhadores, oferecer condições de trabalho dignas e sustentáveis e transformar o propósito corporativo numa realidade que beneficie a todos. Afinal, a integridade de uma empresa começa na base e, sem justiça e respeito para com os trabalhadores, qualquer campanha de “propósito” será apenas uma fachada vazia.