Mais de um terço dos médicos internos não voltaria a escolher Medicina

Maioria dos médicos internos que responderam ao Inquérito de Satisfação do Internato Médico voltariam a escolher a mesma especialidade, mas 36% não voltaria a escolher o curso de Medicina.

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Médicos internos Paulo Pimenta
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A maioria dos médicos internos que respondeu ao Inquérito de Satisfação com o Internato Médico estão satisfeitos com a especialidade e com o orientador, mas desiludidos com a falta de apoio para investigação e o excesso de horas de trabalho.

Mais de um terço dos inquiridos admite que não voltaria a escolher esta profissão por dificuldades em conciliar a carreira com a vida familiar, falta de tempo para estudar no horário laboral e condições de trabalho.

"Embora 79% dos inquiridos (1233) reportem que voltariam a escolher a mesma especialidade, apenas 64% (999) voltaria a escolher o curso de Medicina", revela o inquérito promovido pelo Conselho Nacional do Médico Interno da Ordem dos Médicos (CNMI), em parceria com o Conselho Nacional do Internato Médico e a Administração Central do Sistema de Saúde. O inquérito foi enviado a 8642 médicos internos mas apenas 18% (1561) responderam. A idade média dos inquiridos situou-se nos 30 anos.

O estudo, a que a agência Lusa teve acesso, refere que, "de um modo global, se mantém a tendência dos últimos anos de satisfação positiva com o internato médico, havendo, contudo, uma margem considerável para melhoria".

"Já a satisfação mais reduzida, ainda que positiva, com o serviço de formação deve alertar para a necessidade de maior investimento nas condições laborais e formativas de cada instituição", salienta o estudo.

Neste aspecto, diz ser notória a insatisfação com a ausência de tempo protegido no horário laboral para estudo autónomo (1,65 numa escala de 1 a 4), "de onde decorre que o médico interno é forçado a ocupar o seu tempo livre para tarefas como elaboração de trabalhos científicos ou preparação para avaliações".

Destaca-se também a pontuação negativa atribuída à participação em actividade formativa (1,81), a insuficientes recursos científicos como biblioteca e acesso a literatura actualizada (2,13) e ao equilíbrio entre o trabalho e a vida pessoal (2,37).

Os médicos internos revelam maior satisfação com a especialidade (pontuação de 3,02) e com o orientador de formação (3,28), mas a satisfação com o serviço de formação é mais reduzida (2,82).

Comentando as conclusões do estudo à agência Lusa, o presidente do CNMI, José Durão, disse que não o surpreendem, porque espelham "os desabafos" dos jovens médicos.

"A maior parte está há mais de dez anos, 11, 12 anos desde que iniciou o curso até chegar a esta fase de começar a vida de especialista, com a expectativa de que vai ter um determinado nível de vida e perspectivas de carreira e aquilo que encontram já durante o internato é de que não existe aquele apoio e incentivo à formação e que as exigências laborais não estão em equilíbrio com as exigências formativas", relatou.

Além disso, não conseguem equilibrar a vida profissional com a vida pessoal, uma exigência das novas gerações que, neste momento, "não está a ser possível" na Medicina em Portugal, por todas as circunstâncias que afectam actualmente o Serviço Nacional de Saúde, onde está a grande maioria dos internos.

Segundo o presidente do CNMI, o SNS exige "muito desta força de trabalho mais jovem, que depois não consegue nem ter tempo suficiente para cumprir com as suas obrigações formativas", nem para tudo o resto.

"Todos estes factores somados geram esta insatisfação, que é diária, e este sentimento de que poderia estar a ser útil e se calhar com outro nível de satisfação noutras áreas", sublinhou.

Para combater esta situação, defendeu medidas concretas assentes em três eixos: tempo, espaço e pessoa. "Tempo no horário laboral, três, quatro, cinco horas no máximo, para as pessoas estarem dedicadas só à sua formação teórica e também para os seus orientadores terem esse tempo semanal protegido para formar os médicos internos", explicou.

José Durão disse que já ouviu relatos de médicos internos que fizeram quase mil horas extraordinárias ao fim de um ano, alertando que esta carga tem "repercussões brutais no bem-estar e a saúde mental das pessoas" e não se está "a ligar o suficiente a isso".