Ambiente de trabalho
Licenças parentais mais longas criam desemprego ou acentuam desigualdades?
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Caro leitor,
Esta semana ficou a saber-se, finalmente, como é que o Governo contabilizou o custo da nova licença parental que está em discussão do Parlamento e que deverá ser aprovada no início do próximo ano. A medida, veio dizer o Ministério do Trabalho, terá um impacto entre 228 e 404 milhões de euros e a diferença entre os dois cenários deve-se a "efeitos de segunda ordem" que ligam o aumento da licença (de quatro para seis e de cinco para sete meses) a alterações comportamentais e a uma subida do desemprego, sobretudo quando os pais têm vínculos precários ou ligações mais frágeis ao mercado de trabalho.
Vários estudos têm demonstrado que as licenças parentais podem dificultar a criação de emprego e o regresso dos pais – sobretudo das mulheres – à vida activa.
Um relatório do Instituto Europeu para a Igualdade de Género analisa precisamente os desafios que os pais enfrentam ao reentrar na vida laboral após a licença parental, destacando desigualdades de género. O principal alerta vai para o impacto negativo que as licenças mais longas têm na carreira e no salário das mulheres ao contrário dos homens, cujas carreiras tendem a ser menos interrompidas, notando que o caminho passa por políticas que incentivem a partilha da licença. A solução estará no incentivo da partilha entre os dois progenitores.
Susana Atalaia, investigadora do Instituto de Ciências Sociais da Universidade de Lisboa, nota que em Portugal, tal como na generalidade dos países europeus, há uma associação directa entre as licenças parentais e a participação no mercado de trabalho, desde logo porque estas licenças são um direito da mãe e do pai trabalhadores. E, a partir do momento em que os vínculos são precários, há todo um problema que se cria.
A análise feita pelo Governo (que alerta para os "efeitos adversos na ligação dos progenitores ao mercado de trabalho, especialmente aqueles que detêm contratos ou situações laborais menos estáveis") pressupõe que o facto de as licenças parentais serem mais longas vai dificultar o regresso das pessoas à vida activa e aumentar as despesas com prestações sociais.
Susana Atalaia considera que essa perspectiva é uma consequência do "mercado de trabalho que temos em Portugal, maioritariamente composto por pequenas e médias empresas e em que a ausência de um determinado trabalhador é imediatamente sentida".
Para a investigadora, o problema coloca-se noutra dimensão e deve ser olhado de um outro prisma: "O que acontece é que o facto de as pessoas estarem numa situação mais precária condiciona o seu acesso às licenças. Uma coisa é o que está na lei, outra é sabermos que há pessoas que têm dificuldade em aceder aos mínimos, porque estão conscientes do impacto que isso tem na sua vida".
"Se as pessoas sabem que a medida as vai prejudicar, não vão usufruir dela", insiste, notando que uma parte significativa dos pais trabalhadores continua a não usufruir daquilo que está previsto na lei e acrescentando que o sistema português, embora progressista, é uma "manta de retalhos" de difícil compreensão.
A resposta, defende Susana Atalaia, é deixar de associar as licenças parentais à mãe e ao pai trabalhadores - note-se que o regime legal está previsto no Código do Trabalho -, e associá-las ao desenvolvimento da criança. Este é o caminho para ultrapassar as desigualdades de género, de rendimento ou sociais que, por mais que se estendam as licenças, vão persistir.
Sabia que...
A primeira licença de maternidade remunerada foi instituída na Primeira República? O Decreto de 7 de Janeiro de 1911 previa a existência de uma licença de dois meses mas que apenas se aplicava às professoras primárias.
Nas décadas seguintes e durante o Estado Novo continuou sem existir uma licença de maternidade universal (embora fosse possível faltar justificadamente ao trabalho por altura do parto, algo instituído na década de 1960) e foi preciso esperar pela Revolução dos Cravos para, em 1976, a lei atribuir "a todas as trabalhadoras o direito de faltar durante noventa dias no período da maternidade", direito que foi integrado na Lei de Bases da Segurança Social de 1985.
Só em 1995, o período de licença da mãe foi alargado para 98 dias consecutivos e foi reconhecida ao pai a possibilidade de faltar ao trabalho dois dias úteis por ocasião do nascimento do filho. A partir de 2003 houve várias alterações ao regime - que passou a designar-se de parentalidade -, com o alargamento dos direitos do pai e o incentivo da partilha, numa perspectiva de igualdade de género. Neste momento, a protecção na parentalidade rege-se pela Lei 7/2009, alterada em 2023.
Trabalho extra
Reestruturações, mesmo que necessárias, semeiam a incerteza nos trabalhadores
As reestruturações nas grandes empresas, mesmo quando têm por detrás boas razões, podem semear a incerteza nas organizações e desmotivar os trabalhadores se não forem planeadas de forma adequada.
O alerta é deixado num artigo publicado no Financial Times que cita Ashley Goodall, antiga responsável de recursos humanos na Deloitte na Cisco e autora do livro The Problem with Change.
Goodall entrevistou dezenas de pessoas que passaram por reorganizações e que mostram que uma reestruturação mal explicada e a incerteza tiveram um impacto psicológico negativo mesmo naqueles que mantiveram os seus empregos. E vai mais longe ao concluir que muitas reestruturações têm outras razões que não a sobrevivência da empresa.
Teletrabalho abrange 19,2% da população trabalhadora em Portugal
O mercado de trabalho em Portugal continua em alta. A taxa de desemprego manteve-se em 6,1% no terceiro trimestre deste ano e a população empregada atingiu o recorde de 5,14 milhões de pessoas. É neste ambiente que o teletrabalho continua a representar quase um quinto no total do emprego. Segundo o Instituto Nacional de Estatística, a proporção e o número de trabalhadores em teletrabalho baixou ligeiramente em relação ao segundo trimestre, abrangendo agora 984,5 mil pessoas que trabalham a partir de casa.
No Reino Unido, o The Guardian dá conta de uma divisão social que se acentuou desde a pandemia de covid-19 quando se trata do teletrabalho e do trabalho híbrido. De acordo com os dados oficiais, os trabalhadores com ensino superior têm 10 vezes mais probabilidades de ter um regime de trabalho híbrido do que os que não têm qualificações.