Cartas ao director
God bless America
Estes últimos oito anos foram um autêntico pesadelo ao assistir ao clima que Trump impôs nos EUA, clima este com todos os ingredientes usados por potenciais autocratas: demagogia, mentiras compulsivas, acusações sem fundamento, chantagens, perseguições e uma enorme falta de sentido de Estado
A transferência de poder a 6 de Janeiro de 2020 foi provavelmente o episódio mais triste e vergonhoso da história da democracia americana. Pensei que, com a vitória de Biden e a saída de Trump, a situação iria serenar. No entanto, usando as mesmas armas, manteve uma enorme influência, mesmo não sendo governante, gerindo a partir de fora a agenda do Partido Republicano.
Ao contrário do que se esperava ou melhor se ansiava, a população americana decidiu não dar importância aos infames ataques à democracia, e decidiu que este mesmo homem deveria voltar à presidência. Trump teve uma vitória esmagadora, e o mais preocupante é que neste momento os radicais republicanos vão dominar a presidência, o Senado, a Câmara dos Representantes e o verdadeiro guardião da Constituição americana: o Supremo Tribunal.
Tendo em conta os exemplos que já nos deu Trump, o futuro é, no mínimo, preocupante. Não me admirava de assistir na nova presidência a um novo macarthismo. Os ingredientes estão todos lá.
Alexandre Duarte Silva, Lisboa
O que lá vem
Oito anos depois, a história repetiu-se, Donald Trump venceu as presidenciais dos Estados Unidos, desta vez turbinado com o motor da Tesla. A América é mesmo a terra da oportunidade e de cidadãos alienados, permitindo que um populista e condenado se sente na Casa Branca, ameaçando a própria soberania nacional. Regressará o ódio, o racismo, o supremacismo branco, a intolerância, o egoísmo e o nacional-radicalismo de direita que despreza os direitos das mulheres. A única coisa positiva é saber que Trump não pode concorrer a um terceiro mandato, e que nos próximos quatro anos vai acabar com as guerras, a fome e, quem sabe, até com o próprio país!
Emanuel Caetano, Ermesinde
"A rebelião das massas"
Isto mesmo. Foi o que sucedeu na eleição nos EUA e é também o título de um livro escrito pelo filósofo espanhol Ortega y Gasset em 1930, que discorre sobre a emergência desta gente, que nos EUA são designados por hillbillies (eu traduziria numa expressão pejorativa por "pacóvios"), título de um livro do eleito vice-presidente. Ortega, o homem que escreveu o aforismo bem conhecido de todos ("Eu, sou eu e a minha circunstância"), antecipou bem a emergência deste "homem-massa", muito antes das redes sociais. Aconselho a leitura. Ele escrevia muito bem e de forma acessível – é o filósofo que conheço que é mais claro nas suas ideias — e, às tantas, escreve: "O homem-massa... sentindo-se vulgar, proclama o direito à vulgaridade e nega-se a reconhecer instâncias superiores a ele." Brilhante! Isto é esta a descrição do votante em Trump, mas escrita há um século.
O homem-massa descobriu que pode dominar os "educated people" porque são muito mais. Estamos condenados a ser dominados pelo homem-massa? Talvez não. Mas apenas se conseguirmos que haja menos deles, e aí, talvez, a democracia tenha uma hipótese. Acabar com o homem-massa podia – e devia! – ser o desígnio fulcral de uma democracia que se preocupasse com este (seriíssimo) problema.
Fernando Vieira, Lisboa
Make America Great Again
O resultado das eleições presidenciais não podia deixar de ser o melhor. Os magnatas e os empresários dos negócios chegaram ao poder nos EUA. Donald Trump não se cansou de, na campanha eleitoral, insultar, ofender e injuriar Kamala Harris com frases ordinárias, básicas, soezes. Elon Musk, o homem mais rico do mundo, o magnata da indústria aeroespacial SpaceX, o fabricante de carros eléctricos, que tem um braço dedicado à Internet por satélite, a Starlink, e que em 2022 adquiriu o Twitter, depois rebaptizado como X, enfronhado em tudo que seja inovação, redes sociais e negócios, apoiou Trump. Os EUA vão entrar num admirável mundo novo. Toda a gente vai ser feliz, haverá emprego a rodos, baixarão os preços dos bens de primeira necessidade, os problemas sociais irão diluir-se, os cuidados médicos vão chegar a toda a gente. Mais: as guerras na Ucrânia e no Médio Oriente vão acabar num ápice e Trump irá meter na ordem a Rússia, o Irão e a China e, deste modo, este será “o melhor dos mundos possíveis” que Leibniz já predizia.
António Cândido Miguéis, Vila Real