Louça com design dos índios kaiapós entre as mais vendidas da Vista Alegre

Desde 2018, a coleção Amazônia está todos os meses entre as três mais vendidas do mais tradicional fabricante português de porcelanas. Empresa tem várias coleções feitas por designers brasileiros.

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Numa loja de Lisboa, peças da coleção Amazônia, da Vista Alegre Vicente Nunes
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Conhecida como uma marca de prestígio, não se espera que a Vista Alegre, uma empresa tradicional, com mais de 200 anos, tenha peças de porcelana em que indígenas brasileiros participaram da decoração. Mas a coleção Amazônia, cujos desenhos tiveram a decisão final dos índios kaiapós, tem sido, desde o seu lançamento, em 2018, mês após mês, uma das mais vendidas da marca portuguesa.

O motivo do sucesso, segundo o administrador da Vista Alegre Nuno Barra, é o fato de as louças serem diferentes da maior parte das que estão disponíveis. “Os clientes adoram a coleção. Em todos os mercados, ela é muito procurada. Existe um fascínio muito grande pela Amazônia, e a coleção tem uma grande diversidade de cores, e traz a riqueza da fauna e da flora brasileiras. Isso cria grande curiosidade nas pessoas”, explica.

Barra conta como conseguiram a colaboração dos kaiapós de Mato Grosso para as louças da Vista Alegre: “Nós temos um programa em que recebemos designers do mundo inteiro, que ficam trabalhando conosco por três a seis meses. Recebemos uma proposta para trabalhar com os kaiapós da organização não-governamental EcoArts Amazônia, que se dedica ao apoio às comunidades indígenas e iniciativas de reflorestação da região”.

Segundo o acordo com a EcoArts, parte das receitas da coleção são utilizadas no reflorestamento da região Amazônica do Mato Grosso com árvores frutíferas nativas, com o objetivo de recuperar a flora e, em consequência, a fauna.

Até a escolha dos motivos que decoram a coleção Amazônia foi um longo processo. “Foi feita uma pesquisa da fauna e da flora da Amazônia para a escolha de frutos e flores originárias da região, além de imagens de animais. A partir daí, foi consultado o acervo histórico das primeiras missões por parte dos portugueses para conhecer a Amazônia, no século XVIII”, explica Barra.

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Bandeja da coleção Amazônia Divulgação

Franceses

O executivo refere-se à Viagem Filosófica de Alexandre Rodrigues Ferreira, naturalista do Museu da Ajuda que, em 1783, foi para o Brasil para conhecer a fauna e a flora do país. Durante cerca de 10 anos, até 1792, ele enviou desenhos, espécimes e artefatos para Lisboa.

A quantidade de exemplares de animais era tão grande que, quando ocorreram as invasões francesas em Portugal, em 1808, boa parte dos animais ainda não tinha sido catalogada. Mais: o acervo foi vítima de saques pelas tropas invasoras e muitos animais brasileiros acabaram por ser descritos como descoberta de novidade por naturalistas franceses.

Em 2018, um grupo de kaiapós esteve nas instalações da Vista Alegre em Ílhavo para a decisão final a respeito dos desenhos da coleção de porcelanas. “Eles trabalharam com os pintores da Vista Alegre para preparar as novas decorações”, lembra o administrador da empresa.

Segundo ele, esta foi a primeira coleção que cruzou as três marcas do grupo: a Vista Alegre, que trabalha porcelana, vidro e cristal; a Bordalo Pinheiro, de faiança; e a Casa Alegre, de grés. “Cada material tem características próprias. A faiança tem cores mais vivas e relevos, o grés é mais resistente e tem tons de terra”, explica.

A coleção Amazônia tem cerca de 100 peças. A mais barata é um prato que custa 16 euros (R$ 101) e a mais cara é um jarro com relevo que lembra uma graviola, ao preço de 650 euros (R$ 4.130).

Outros brasileiros

Esta, porém, não é a única coleção da Vista Alegre com participação de brasileiros no design. As porcelanas desenhadas pelo carioca Brunno Jahara, na coleção Transatlântica, também estão entre as cinco mais vendidas da empresa.

Jahara mistura o imaginário português e o brasileiro nessas criações. “São peças baseadas nos azulejos portugueses, mas que ele cruzou com elementos da cultura brasileira. Todas são em azul, branco e ouro”, observa Barra.

Percurso diferente teve a designer paulistana Beatriz Lamana. Em 2010, ela estava fazendo um mestrado no Instituto Europeu de Design, de Madri, e propôs um desenho para a Vista Alegre. “A idea era apresentar a cidade de Lisboa segundo o olhar da designer. Depois, ela também fez desenhos do Porto, de Vizeu, de Braga, de Coimbra, de Sintra e de Aveiro”, diz Barra. A coleção cresceu e incluiu cidades de outros países: Maputo, capital de Moçambique, Madri e Rio de Janeiro.

O desenho de Beatriz se refere às características das cidades, mas não ao que os portugueses consideram que elas têm de mais importante. “Por exemplo, em relação a Lisboa, o prato principal da coleção mostra a cidade vista do outro lado do rio”, conta o administrador.

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