À boleia do novo livro, o culto de Pinto da Costa encheu a Alfândega do Porto

Azul até Ao Fim é a quinta obra do agora ex-presidente do FC Porto. Diagnosticado com cancro na próstata, fala com naturalidade da morte e do funeral: “Quero ver-vos vestidos de azul”

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Jorge Nuno Pinto da Costa, ex-presidente do FC Porto durante o lançamento do seu livro JOSE COELHO / LUSA
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"Nunca li um livro na vida. Só o Pinto da Costa e o FC Porto para me meterem a ler". Com uma cópia da nova obra assinada por Pinto da Costa na mão, a frase foi proferida por um jovem com a camisola dos Super Dragões. O comentário inusitado é rastilho para a gargalhada geral. No momento em que o carro que transporta o dirigente chega à Alfândega do Porto, o ar enche-se de fumo azul e arranca a euforia. Já no interior da sala de congressos, mesmo com 1200 pessoas a encher por completo o espaço, consegue ouvir-se um alfinete a cair ao chão. Tudo para garantir que é possível ouvir todas as palavras que Pinto da Costa tem para dizer.

Pinto da Costa falou durante sensivelmente 90 minutos. Foi interrompido por ovações e cânticos de apoio perto de uma dezena de vezes. Houve pessoas a chorar, outras empoleiradas em cadeiras para ter uma melhor visão do dirigente. "Só temos um presidente", repetiram os presentes até à exaustão. "Não, temos dois. Um honorário e outro que é de todos nós. Temos de respeitar", respondeu Pinto da Costa. "Não queremos traidores", ripostaram imediatamente do público.

O livro arranca com o dia em que Pinto da Costa soube que tinha cancro. São relembradas as palavras do médico e o "choque" inicial da notícia. Três anos volvidos, o antigo presidente já consegue falar com naturalidade sobre o tema.

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Pinto da Costa apresentou um novo livro José Coelho/Lusa

Azul Até ao Fim, o quinto livro assinado pelo histórico dirigente, foi apresentado este domingo. Para muitos dos presentes, Pinto da Costa foi, ainda é e sempre será o presidente do FC Porto – independentemente da derrota eleitoral. Há quase três anos, Pinto da Costa foi diagnosticado com um cancro na próstata. Nos primeiros meses, escondeu da família, amigos e companheiros de direcção do clube. Conseguiu manter a doença escondida dos olhares públicos durante muito tempo, inventando que tinha uma condição chamada "prostatite". Apenas uma pessoa lhe apanhou a mentira.

"Escrevi [este livro] para mim, não era para ser editado. Não queria que ninguém soubesse [da doença]. Ainda hoje não sei o que é uma 'prostatite', mas todos engoliram [risos]. Menos a minha mulher, que foi pesquisar os remédios à Internet e descobriu logo o que eu tinha", relembrou.

O livro compila várias entradas de um diário esporádico de Pinto da Costa, escritas nos últimos três anos. Depois da conversa sobre o cancro, outro dos temas discutidos com naturalidade é o das cerimónias fúnebres. A capa do livro mostra uma fotografia de Pinto da Costa apoiado num caixão embrulhado com a bandeira do FC Porto. Na nota prévia que abre o livro, o ex-presidente deixa claro que a ideia da imagem de capa foi inteiramente dele – não fosse a editora receber comentários negativos. Não tem pressa que o momento da despedida chegue, mas clarificou algumas das coisas que deseja evitar.

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Livro apresentado este domingo na Alfândega José Coelho/LUSA

“Uma coisa que me irrita muito nos funerais é que, à parte das pessoas que estão junto do caixão, há sempre alguém a contar anedotas. Não queria que isso acontecesse no meu funeral. Não por mim, mas por respeito à minha família e amigos que naturalmente naquela hora vão sofrer por os ter deixado”, indica. "Também não quero ver lá ninguém de luto e vestida de preto. Quero ver-vos vestidos de azul. É a cor do céu, da manta da Nossa Senhora e a cor do FC Porto", finaliza, numa apoteose de aplausos.

Madureira relembrado

No momento em que aborda o funeral, Pinto da Costa deixa claro que não quer a presença de qualquer membro da actual direcção do FC Porto, afastando também vários jogadores antigos do clube que mostraram apoio a André Villas-Boas, adversário que venceu as eleições para presidente do clube com mais de 80% dos votos.

“Sei que a sua presença ia criar incómodo naqueles que me conhecem e que conhecem a minha vida”, resumiu, quando questionado sobre quem não queria no funeral.

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Esta é a quinta obra de Pinto da Costa José Coelho/Lusa

Na verdade, o círculo de pessoas que o presidente quer ter ao lado nos momentos finais é bastante restrito. Entre empresários e outras figuras ligadas ao mundo do futebol, a lista inclui ainda Fernando Madureira, ex-líder dos Super Dragões, e a mulher, Sandra, os principais arguidos da Operação Pretoriano, acusados de intimidar e coagir sócios do clube.

A mulher de Fernando Madureira marcou presença na Alfândega do Porto, com Pinto da Costa a deixar uma palavra de apoio ao líder dos Super Dragões, dizendo que é um dos responsáveis pelas vitórias portistas que não conseguiu marcar presença.

Ainda antes da apresentação oficial e ida para as livrarias, a nova obra do antigo dirigente portista já tinha causado polémica – e levou mesmo a uma queixa-crime. Várias passagens foram fotografadas e circularam nas redes sociais, motivando notícias em vários órgãos de comunicação social sobre os conteúdos do Azul Até ao Fim.

A editora Contraponto anunciou a abertura de uma investigação para apurar a origem da fuga de informação e uma queixa-crime relativa às notícias feitas sobre estes excertos. A obra chega esta segunda-feira às bancas em todo o país.

Da política ao futebol, foram várias as personalidades a marcar presença no evento de Pinto da Costa. Valentim Loureiro, antigo presidente da Liga e do Boavista, foi muito acarinhado pelo público presente. António Oliveira, Vítor Baía e Fernando Gomes foram os principais nomes ligados ao FC Porto. Do mundo das artes, o músico Quim Barreiros também fez questão de mostrar apoio a Pinto da Costa.

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