Procura dos serviços de urgência por estrangeiros triplicou no Santa Maria

Carlos Martins disse no Parlamento que entre 93% e 95% destes cidadãos “não têm qualquer seguro de saúde”, representando um acréscimo de custos para o hospital.

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O presidente do Hospital de Santa Maria negou qualquer intenção de limitar reclamações dos utentes e justificou o despacho que envolve publicações nas redes sociais com a necessidade de agilizar o recurso dos profissionais ao departamento jurídico direitos reservados
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A procura dos serviços de urgência por cidadãos estrangeiros provenientes de países fora da União Europeia quase triplicou no hospital de Santa Maria, passando de uma média anual de 900 para 2.500 nos últimos três anos.

Segundo o presidente do Conselho de Administração da Unidade Local de Saúde (ULS) de Santa Maria, Carlos Martins, entre 93% e 95% destes cidadãos "não têm qualquer seguro de saúde", representando um acréscimo de custos para o hospital, que não dispõe de qualquer mecanismo que o permita ressarcir destas despesas.

De acordo com dados da ULS de Santa Maria, os diversos serviços de urgência do hospital eram procurados por cerca de 900 cidadãos estrangeiros por ano. Em 2021 foram 940, em 2022 o hospital registou um aumento para 2.300 e, no ano passado, para 2.700.

As estimativas da ULS admitem que este ano o número possa chegar aos 2.900.

"O crescimento foi muito grande, não só na Obstetrícia e Ginecologia, mas também na área das doenças infecciosas", disse o responsável, considerando que muita desta procura é "fruto do crescimento da imigração em Portugal, designadamente [proveniente] da Ásia".

Carlos Martins, que falava aos deputados da comissão parlamentar de Saúde, disse que a preocupação se centra na segurança dos profissionais e no risco para o doente e, a este respeito, apontou a barreira da língua e disse que o hospital vai começar a disponibilizar em 10 serviços aplicações que, recorrendo a Inteligência Artificial, permitem a tradução simultânea.

O administrador hospitalar explicou que a aplicação permitirá a tradução de 12 línguas, com o computador a fazer depois a sugestão da prescrição na língua de origem do utente, além do português.

"Tudo para diminuir o risco e aumentar a segurança do acto [médico]", afirmou.

Nenhuma queixa sobre redes sociais

Na mesma reunião, o presidente do Hospital de Santa Maria negou qualquer intenção de limitar reclamações dos utentes e justificou o despacho que envolve publicações nas redes sociais com a necessidade de agilizar o recurso dos profissionais ao departamento jurídico.

"Foi um acto administrativo. (...) O departamento jurídico não toma decisões, quanto muito, propõe ao Conselho de Administração, que decidirá", afirmou o presidente a ULS de Santa Maria, Carlos Martins, explicando que desde a divulgação do despacho, há dois meses, não foi registado um único caso.

O responsável foi ouvido esta quarta-feira na Assembleia da República sobre um despacho publicado há dois meses que determina que o gabinete jurídico daquela unidade deve solicitar a instrução de processos contra utentes que façam publicações nas redes sociais atingindo a honorabilidade, reputação e bom nome da instituição ou dos seus profissionais.

Em resposta às questões levantadas pelos deputados, que o questionaram sobre a eventualidade de o despacho pretender limitar a liberdade de expressão dos cidadãos descontentes com os serviços prestados pelo hospital, Carlos Martins insistiu que o documento se enquadra na estratégia de segurança dos profissionais de saúde.

Explicou que "não há um único profissional da instituição a monitorizar as redes sociais", mas sim "a monitorizar as reclamações" feitas pelos utentes e insistiu que o despacho "serve apenas para o profissional de saúde, se assim entender, solicitar apoio directamente ao gabinete jurídico, sem ter de passar por todas as chefias".

Disse igualmente que esta foi uma forma de combater a burocracia: "Em vez de o profissional ter de percorrer seis ou sete patamares (...) pode solicitar apoio do departamento jurídico sem passar pelas chefias".

"Depois, o gabinete jurídico analisa e conclui se há ou não matéria, mas o Conselho de Administração é que decide", insistiu.

Questionado sobre se a ministra tinha tido conhecimento e tinha falado com o Conselho de Administração sobre o despacho respondeu: "Não falou. (...) É uma matéria no âmbito da autonomia [de gestão da Unidade Local de Saúde], ao abrigo da legislação".

Insistindo que o despacho visa "agilizar e conceder ao profissional de saúde ferramentas para ele próprio utilizar", acrescentou: "Não é o Conselho de Administração que usa o alcance do despacho. É o próprio profissional".

"Registamos com muito agrado que a Fnam [Federação Nacional dos Médicos], o Sindicato dos Enfermeiros, o SIM [Sindicato Independente dos Médicos] e a Ordem dos Advogados tenham feito um entendimento perfeitamente claro do que era o alcance do despacho", sublinhou.

Sobre a existência de algum caso reportado desde o início de vigência do despacho, há dois meses, Carlos Martins afirmou: "espero nunca ser confrontado com um único processo ao abrigo deste despacho. Seria grave".

Carlos Martins explicou ainda que o despacho se inseriu igualmente numa tentativa de inovar na gestão - reduzindo a burocracia -, lamentou: "Quando inovamos muito e saímos fora da caixa do que é o registo normal do requerimento ao enfermeiro chefe, ao enfermeiro gestor (...), somos mal interpretados".