Suspensa pós-graduação sobre racismo ministrada só por pessoas brancas

A pós-graduação sobre racismo e xenofobia, que suscitou diversas críticas por integrar apenas formadores brancos, foi suspensa. Observatório responsável diz que não teve “intenção de discriminar”.

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O Observatório do Racismo e Xenofobia suspendeu uma pós-graduação fortemente criticada por ter apenas formadores brancos para abordar o racismo Daniel Rocha
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O Observatório do Racismo e Xenofobia e a Faculdade de Direito da Universidade Nova de Lisboa suspenderam uma pós-graduação fortemente criticada por ter apenas formadores brancos para abordar o racismo, anunciou, esta terça-feira, a directora da instituição.

Em resposta a um pedido de esclarecimento da agência Lusa, Margarida Lima Rego disse, por escrito, que "a faculdade e o Observatório não tiveram qualquer intenção de minimizar temas que são importantes e relevantes para qualquer sociedade, nem discriminar pessoas".

A reacção de Margarida Lima Rego surge após a notícia divulgada segunda-feira pela agência Lusa, dando conta da Pós-graduação em Racismo e Xenofobia, cujo painel de formadores era constituído por pessoas brancas, o que conduziu a muitas críticas nas redes sociais, em resposta às várias publicações que foram reproduzindo o anúncio do evento.

No esclarecimento, a directora da Faculdade de Direito da Universidade Nova de Lisboa refere que "a inclusão e diversidade são condições indispensáveis para o cumprimento da missão do Observatório do Racismo e Xenofobia, uma iniciativa de âmbito nacional prevista no Plano Nacional de Combate ao Racismo e à Discriminação 2021-2025, lançado pelo anterior Governo".

Para além disso, explicou que a pós-graduação em causa foi aprovada em Julho pelo conselho científico, mas com "um programa diverso e inclusivo, designadamente quanto à origem étnico-racial dos formadores".

"Entre o momento da aprovação e o da sua operacionalização, ocorreram diversas alterações. A principal foi a indisponibilidade de alguns formadores para leccionarem a pós-graduação. Isso motivou ajustamentos no programa que acabou por não reflectir os princípios da diversidade e inclusão", adiantou.

Garante Margarida Lima Rego que o programa publicitado, e que na segunda-feira já não estava a ser anunciado, depois das críticas que motivou, "era diferente do anteriormente apreciado pelo conselho científico".

"Tratou-se de uma falha interna e a Faculdade de Direito já está a tomar medidas para que tal não volte a suceder", disse, afirmando lamentar "a polémica criada com o anúncio da criação da pós-graduação".

"A Faculdade e o Observatório não tiveram qualquer intenção de minimizar temas que são importantes e relevantes para qualquer sociedade, nem discriminar pessoas e decidiu suspender a pós-graduação, que não irá avançar nestes moldes", indicou.

Questionada sobre as críticas à composição do Observatório, disse que este "foi uma criação recente e ainda em construção". "Aquando da sua criação, fora explicitamente referido em reunião do conselho científico desta faculdade que deveria ser garantida uma equipa que, na sua composição, se paute pelos valores da diversidade e inclusão, dando voz às principais categorias de pessoas historicamente discriminadas. Esta continua a ser a minha posição", referiu.

Além da escolha dos formadores, o tema de um dos painéis da pós-graduação ("O racismo existe mesmo?") também motivou várias críticas, com muitos afro-descendentes a queixarem-se de, mais uma vez, serem invisíveis.

Paula Cardoso, jornalista e criadora da rede Afrolink, foi das primeiras a denunciar o sucedido, que classificou como "chocante" e "insultuoso".

A autora disse à Lusa que a composição dos formadores e a abordagem de certos temas a chocaram, mesmo sendo uma criação de um Observatório que considera ter uma estrutura e práticas racistas.

Por isso acredita que agora será ainda maior a contestação à existência do Observatório como ele está, que já acontece porque a sua composição e liderança não respondem ao que foi defendido no Plano de combate ao racismo e discriminação.

"Não faz sentido nenhum. É como uma organização que combate a discriminação contra as mulheres ser composta apenas por homens", disse.