Escola pública ou privada em Portugal?

A deterioração das escolas públicas brasileiras é tanta, que não há comparação com o ensino público português.

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Esta pergunta me tirou o sono algumas noites, e, volta e meia, ainda me inquieta.

Quem é brasileiro sabe que, infelizmente, no Brasil, não é possível contar com o ensino público. Refiro-me à formação anterior ao ensino universitário, e, principalmente, aos grandes centros, onde violência, abandono das escolas, falta de professores e de condições mínimas de trabalho destruíram o que um dia já teve qualidade. Eu nasci no interior do Rio Grande do Sul e estudei boa parte do ensino fundamental, o que aqui em Portugal chamam de ensino básico, em escola pública. Meu colégio, que era considerado um dos melhores da cidade, hoje, tem vidros quebrados, paredes pichadas, uma tristeza.

A deterioração das escolas públicas brasileiras é tanta, que não há comparação com o ensino público português.

Em Portugal, ainda há cobrança, e o que é mais importante, ainda há comprometimento com a educação dos alunos na rede pública. Falo com propriedade, porque tenho um filho matriculado em uma dessas escolas. Mas digo “ainda”, porque Portugal já enfrenta alguns problemas semelhantes aos que vimos no Brasil décadas atrás, mais precisamente a partir dos anos de 1980: salários baixos e, consequentemente, falta de professores.

Um dos grandes desafios no ensino público de Portugal é repor os funcionários que se aposentam, porque os novos professores não ganham o suficiente para pagar o custo de vida em centros como Lisboa, por exemplo, onde os valores dos aluguéis impossibilitam o sustento de muitos desses profissionais. O resultado disso é que, volta e meia, vemos paralisações, protestos e falta de docentes nas escolas durante o ano letivo. Já vivi essa situação com meu filho, mas, felizmente, a escola conseguiu solucionar rapidamente o problema.

Quando cheguei a Portugal, há pouco mais de três anos, a minha referência era de qualidade no ensino público do país, e algumas escolas classificadas como de excelência. De fato, algumas são, e nessas geralmente é difícil ter vaga.

No processo de matrícula, os pais podem escolher até cinco opções de escolas, e o endereço de residência é fator determinante para conseguir vaga na instituição desejada.

Como tudo na vida, há boas e más escolas, sejam públicas, sejam privadas. Pagar o ensino não é garantia de ser bom. Eu cheguei a pensar em investir no ensino privado, mas meu filho não quis, e decidi respeitar a decisão dele, que, no Brasil, sempre estudou em escola particular, com todos os recursos disponíveis. A escola onde ele foi inicialmente matriculado não tinha as melhores instalações, já estava desgastada pelo tempo, mas eu percebia que havia um carinho dos alunos, carinho esse que desculpava certos desconfortos em algumas salas de aula. Entendi isso como um bom sinal, porque, na minha opinião, o que determina uma boa escola é o comprometimento e o sentimento de felicidade dos alunos.

Mas a minha dúvida permanecia, e questionei muitos amigos portugueses e até professores sobre escolher uma escola pública ou particular. Nunca houve um consenso na resposta, mas ouvi de alguns pais e até mesmo de professores da rede pública que, se eu quisesse garantia de professor em sala de aula, deveria optar pelo ensino privado.

Decisão difícil! O peso da responsabilidade da escolha que envolve a vida de outra pessoa, e não é qualquer pessoa, é a vida de um filho.

Por não conhecer o funcionamento da educação em Portugal, a publicitária brasileira Juliana Barros optou pelo ensino particular assim que chegou a Cascais, onde vive há três anos. Este ano decidiu matricular os três filhos numa escola pública, e diz que não se arrepende. Diz ela: “Senti um acolhimento na escola pública e vejo experiência e profissionalismo no corpo docente. As instalações são muito similares às de escolas privadas e gosto dos livros/manuais fornecidos pelo Estado. O ensino tem o seu valor.”

Eu também gosto do material pedagógico oferecido nas escolas públicas, e há um sistema de reaproveitamento dos livros que acho muito interessante e positivo para evitar desperdícios.

Em Portugal, são as notas que os alunos têm na escola e nos exames nacionais prestados durante o ensino médio/secundário, que garantem o ingresso na universidade desejada, ou seja, se quer a melhor faculdade, tenha as melhores notas.

Ainda estou em fase de observação, mas o que posso dizer até agora é que, apesar dos problemas, sinto acolhimento no ensino público português, além disso, a dura realidade de alguns alunos, entre eles imigrantes, acaba por ser também uma boa escola.

Uma grande preocupação dos pais é com a oferta de drogas nessa fase da adolescência. Isso existe no público e no privado, e, provavelmente, é maior onde há mais dinheiro.

No meu entendimento, o que diferencia a realidade entre as escolas públicas e particulares são os desajustes sociais vividos por alguns alunos, e que são mais presentes no ensino público. Onde há menos igualdade social há, também, mais famílias desestruturadas, maior exposição às situações de vulnerabilidade e violência e as consequências que todos esses problemas trazem a nossa vida.

Mas, perceber essas realidades e, ao mesmo tempo, estar em um ambiente seguro, que é oferecido pela grande maioria das escolas públicas portuguesas, pode trazer uma importante “bagagem” para a vida, o que nem sempre acontece quando só convivemos com quem tem e pode.

Reconhecer as diferenças, as injustiças e as imperfeições do mundo proporciona outras formas de entendimento e de responsabilidade sobre a vida, que vai muito além do que os livros ensinam. O mundo precisa dessa sensibilidade, de que percebamos o que nos rodeia, o que gira ao redor da bolha onde muitos convenientemente vivem. Sem desconforto não há mudança, e, convenhamos, ainda há muito a se fazer e a avançar.

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