O grão-duque do Luxemburgo, Henrique, prepara-se para passar o testemunho ao filho nesta terça-feira, 8 de Outubro, numa cerimónia simbólica. O príncipe Guillaume, de 42 anos, vai assumir a regência do grão-ducado, mas sem se tornar, para já, o soberano, nem chefe de Estado. As novas funções são uma espécie de transição temporária, ainda que não estejam definidas todas as responsabilidades do herdeiro do trono.
Na prática, Guillaume passará a representar o pai em eventos oficiais, após jurar a Constituição nesta terça-feira, meses depois de o grão-duque de 69 anos ter anunciado a abdicação, a 23 de Junho, por ocasião do dia nacional do Luxemburgo. “Ainda não está clara qual será a responsabilidade de Guillaume, porque, entre outras coisas, o chefe do ducado assina as leis e realiza visitas de Estado e está representado na abertura do Parlamento”, explica a jornalista Ines Kurschat, responsável por cobrir a casa real no jornal Luxemburger Wort.
Doravante, Guillaume ficará encarregue de formar a sua própria equipa de trabalho no Palácio Grão-ducal, articulando as tarefas do quotidiano com os pais, Henrique e Maria Teresa, detalha o jornal Contacto. Em termos formais, o príncipe receberá o título de representante-tenente, dado aos herdeiros do trono que substituem os grão-duques temporariamente — o que já aconteceu por cinco vezes desde o final do século XIX, quando o Luxemburgo se tornou independente. Aliás, o próprio Henrique foi tenente do seu pai, João do Luxemburgo (1921-2019), entre Outubro de 1998 e Outubro de 2000.
“Embora o príncipe Guillaume esteja preparado para este momento praticamente desde a adolescência, pode ser surpreendente que esta fase seja considerada necessária, mas o pai dele também já passou por ela”, lembra Kurschat. A jornalista especula sobre quando poderá acontecer a mudança definitiva, mas sem certezas. “O próximo ano marca o 25.º aniversário da ascensão do Grão-Duque Henrique ao trono e esse poderá ser o momento da transferência definitiva do poder.” E acrescenta: “Ou talvez em 2026, mas do Palácio do Grão-Duque ainda não há confirmação.”
Além da preparação de Guillaume para o trono, poderá haver outra explicação para ser adiada a investidura “até três anos”, especula também o Contacto. O príncipe de 42 anos tem dois filhos pequenos, Charles, de 4 anos, e François, de 1 ano, fruto do casamento com a princesa Stephanie, natural da Bélgica, com quem se casou em 2012.
Guillaume é o mais velho dos cinco filhos do grão-duque e de Maria Teresa (cubana de nascença, que cresceu nos EUA). Os irmãos mais novos são o príncipe Félix (que vive em Frankfurt com a família), o príncipe Louis (trabalha em Paris), a princesa Alexandra (estagiou nas Nações Unidas, em Nova Iorque) e o príncipe Sébastien (que é oficial do exército).
Família quase perfeita
Já o príncipe Guillaume, depois da formação militar, estudou política internacional no Reino Unidos e depois em França, onde obteve uma dupla licenciatura em Letras e Ciência Política na Universidade de Angers, em 2009. Actualmente, além das actividades quotidianas do grão-ducado, dedica-se à presidência da Fundação Kräizbierg, que apoia pessoas com deficiência. Fora do trabalho, é amante da música (toca violão, tal como a mãe) e do desporto, praticando ténis, esqui ou natação, lê-se na página oficial da família real.
Recentemente, Guillaume anunciou que está a construir um novo palácio para a família na propriedade do Castelo de Berg, que é a residência oficial dos seus pais. A casa nova será financiada exclusivamente por fundos próprios, evitando gerar qualquer polémica sobre o uso do erário público. “Acreditamos que é a melhor forma de conciliar os nossos compromissos institucionais e a vida familiar”, informou em comunicado em Julho deste ano.
Os pais também estão de mudança. Em Setembro, numa entrevista à Paris Match, os soberanos Henrique e Maria Teresa manifestaram a intenção de se mudaram para o Castelo de Fischbach, no centro histórico do Luxemburgo — por agora é essa a residência oficial do príncipe herdeiro, pelo que, caso se venha a confirmar, será uma espécie de troca.
De acordo com Ines Kurschat, a monarquia constitucional é um sistema que deixa “satisfeitos” os luxemburgueses e “não existe qualquer movimento republicano”, apesar de o país também ter “partidos de esquerda antimonárquica”.
Tal não quer dizer que o grão-duque Henrique tenha sido sempre consensual. Em 2008, o grão-duque recursou-se a assinar a lei da eutanásia e do suicídio assistido por ser católico — recentemente, o Papa Francisco esteve de visita ao grão-ducado. O Parlamento não teve meias medidas: alterou a Constituição para evitar uma crise. Agora, o grão-duque apenas promulga as leis e não precisa de as aprovar.
Mais tarde, em 2019, o governo do Luxemburgo pediu um relatório sobre a gestão do pessoal da corte, onde se alegava que a grã-duquesa seria responsável pela rotatividade dos funcionários. Segundo descrevia o semanário The Lëtzebuerger Land, Maria Teresa é uma mulher autoritária e de temperamento forte.
O grão-duque não tardou a defender Maria Teresa num comunicado: “A sua dedicação ao serviço do nosso país, ao meu lado há 39 anos, é exemplar e é essencial para mim.”
A polémica adensou rumores de abdicação, que só se confirmaram neste ano, sem grandes surpresas. É que no Luxemburgo, ao contrário de outros países como o Reino Unido, a abdicação é uma tradição. Fica por saber quando Guillaume chegará ao trono e quantos anos reinará antes de chegar a sua vez de abdicar.