Nunca subestimem um professor de uma escola pública

Elogiar a escola pública é um ato de reconhecimento do seu papel social e da sua mais-valia na educação das crianças e dos jovens.

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"A escola pública é um lugar com um importantíssimo significado social" Adriano Miranda
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“Nunca subestimem um professor de uma escola pública. Nunca.” Estas palavras — proferidas por Tim Walz, candidato à vice-presidência dos EUA pelo Partido Democrata — demonstram a importância do professor na educação, incluindo as suas diferentes vertentes de escolarização, bem como a base social da escola, por mais que na análise crítica dos anos de 1960-70 tenha sido apelidada de "Aparelho Ideológico do Estado", sobretudo nos escritos de Louis Althusser, remetendo este conceito para uma relação de classe social, que Pierre Bourdieu e Jean-Claude Passeron aprofundaram no livro La Reprodution. Éléments pour une théorie du systéme d’enseignement, dado à estampa em 1970.

Se o professor faz parte de um sistema em que existem organizações e práticas escolares bastante diferentes, o professor da escola pública internaliza ainda mais a função social que existe, quando trabalha numa escola que tem de aceitar qualquer aluno, não sendo erigidas quaisquer barreiras ou impostos critérios diferenciadores.

É nesse sentido que o professor da escola pública se distingue dos demais, embora todos os professores tenham um denominador comum que se relaciona com a sua ação pedagógica desenvolvida no sentido de organizar situações de aprendizagem em torno do conhecimento.

Face à preponderância do fator socioeconómico nos resultados escolares, o professor da escola pública pertence a uma outra escola, isto é, uma escola, como disse Tim Walz, que tem de “garantir que todas as crianças (…) tomem o pequeno-almoço e o almoço todos dias”, erradicando desse modo a fome na escola, como se expressou assim diretamente: “Enquanto outros estados baniam livros das suas escolas, nós estávamos a banir a fome das nossas.”

Na sua racionalidade social de uma integração completa das crianças e dos jovens, a escola pública não é comparável com outras escolas. É radicalmente diferente dessas escolas, não só porque utiliza como princípio de ação a linguagem da inclusão, da equidade e da justiça social, mas também tem uma outra visão sobre a linguagem da meritocracia, não a rejeitando, é mister afirmá-lo, mas adaptando-a às situações de cada aluno.

Jan Masschelein e Maarten Simons, professores da Universidade de Lovaina, escreveram, em 2013 (edição do Brasil), o livro Em defesa da escola: uma questão pública, com o propósito de destacar o seu papel central não como instituição do Estado, mas essencialmente como um lugar educacional, com as suas formas pedagógicas específicas.

Por isso, a escola pública é um lugar com um importantíssimo significado social, com a obrigação de trabalhar com todos os alunos e de os envolver em atividades educacionais, para além de promover e garantir o seu bem-estar. A escola pública centrada nas atividades instrucionais, de horário estrito ao “aprender oficial”, em função de um currículo nacional, já não existe num sistema educativo que seja amplamente integrador.

Não a condenando, defendem, pelo contrário, a sua absolvição, pois a escola pública, transformada num modo de socialização, tem uma língua própria que permite à próxima geração nomear o mundo e tornar-se na nova geração.

Neste caso, os autores consideram o aprender como um processo de mudança, razão pela qual a aprendizagem escolar estará sempre em jogo e sujeita a diferentes interpretações, mormente quando as crianças e os alunos são trazidos pela escola para uma posição de ser capaz de estudar e de aprender.

Se o debate sobre a escola pública tem sido continuamente adiado em Portugal, apesar de aproximações dispersas em textos e eventos académicos, assim como em publicações do Conselho Nacional de Educação, no caso do Brasil tem sido amplamente abordada, como é caso do livro Elogio da Escola, organizado por Jorge Larrosa, e publicado em 2013, com contributos de vários autores a partir de um seminário internacional, do filme Teoria da Escola, inserido numa mostra de cinema, e de uma exposição sobre um desenho de escola.

Trata-se de um livro que tem como foco de análise o livro Em defesa da escola: uma questão pública, trazendo para a discussão quer abordagens muito diversas, quer exercícios de pensamento sobre a escola pública, considerada nas suas dimensões democrática, inclusiva e crítica.

Com efeito, elogiar a escola pública é um ato de reconhecimento do seu papel social e da sua mais-valia na educação das crianças e dos jovens. A sua força está sobretudo no reconhecimento das suas fragilidades como lugar educacional, por um lado, apesar de ser uma voz pedagógica poderosa, que é a configuração do entrelaçamento de três vetores fundamentais: tempo, espaço e conhecimento; e também no reconhecimento das suas potencialidades como lugar social, mesmo que seja caracterizada pela artificialidade dos códigos que a caracterizam, por outro. É certo que a escola tem contribuído para favorecer os grupos sociais que mais facilmente se identificam com um código elaborado e não com um código mais restrito em termos culturais.

Destarte, o professor da escola pública tem um compromisso de integração dos alunos em contextos escolares que estejam simultaneamente na promoção do sucesso escolar e na criação de condições sociais para que a escola se torne uma realidade quotidiana com significado, resolvendo também os problemas mais prementes que são colocados às crianças e aos jovens que a frequentam.

Reconheça-se, no entanto, que todos os professores (dos ensinos público e privado) são insubstituíveis, pelo que, apesar de Tim Walz ter salientado o professor da escola pública, porque ele foi professor durante alguns anos da escola pública, é fundamental afirmar que nenhum professor de uma escola ligada à escolaridade obrigatória — tal como o docente da educação pré-escolar — deve ser subestimado. Nunca.


O autor escreve segundo o Acordo Ortográfico de 1990

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