Partidos de esquerda consideram “imoral e abjecta” proposta do Chega para acesso às creches
A proposta do Chega é idêntica à já aprovada nos Açores e prevê, nas regras de inscrição nas creches, a prioridade para crianças com pais trabalhadores.
Os partidos de esquerda criticaram esta quarta-feira no parlamento a proposta do Chega para alterar as regras de inscrição nas creches, que prevê a prioridade para crianças com pais trabalhadores, considerando "imoral e abjecta".
No debate sobre a criação de uma rede pública de creches, a pedido do PCP, o deputado do BE José Soeiro afirmou que o "direito à creche é das crianças" e o que o Chega quer "é que os filhos dos desempregados vão para o fim da fila".
"A proposta do Chega é um ataque miserável às crianças, que passariam a ser discriminadas legalmente em função da condição laboral dos pais. É preciso ser desalmado para redigir a proposta que aqui hoje apresentam. É uma proposta, imoral, abjecta, símbolo da maldade dos discípulos de [André] Ventura", acusou o bloquista.
Antes da intervenção de José Soeiro, o deputado do PCP Alfredo Maia tinha dito que a aprovação do projecto-lei para criação de uma rede pública de creches impunha-se por "um imperativo de urgência".
"O PCP defende o direito de todas as crianças e jovens ao acesso à educação e ao ensino até ao mais elevado grau, em condições de igualdade e de equidade, o que implica que tal direito esteja assegurado desde a mais tenra idade", contextualizou. Alfredo Maia também reconheceu que o projecto do Chega "acrescenta injustiça à injustiça do desemprego".
"Persegue os pais, pune as crianças, discrimina de forma inconstitucional as crianças em função da condição dos pais. O direito à creche é um direito das crianças, intrinsecamente delas e de mais ninguém. E faz o que os senhores gostam de fazer, que é lançar pobres contra pobres", afirmou.
Também o deputado do Livre Jorge Pinto afirmou que o "arranque do ano lectivo está a ser uma grande dor de cabeça para muitos pais" e que "o direito à creche não deve ser um privilégio em detrimento de outros".
"Por isso, é injusto, discriminatório e imoral a proposta que o Chega hoje nos traz", disse, lembrando que a "falta de planeamento em políticas públicas" causou "vários entraves à sua execução", como aconteceu com o programa Creche Feliz.
Também a deputada única do PAN, Inês de Sousa Real, considerou que a proposta do Chega "constitui um atentado aos direitos das crianças".
"Não nos podemos esquecer que a creche, tal qual como a escola, é uma ferramenta de igualdade de oportunidades. Ouvimos também aqui a narrativa, então, mas os pais que trabalham são discriminados face aos pais que não trabalham. E eu pergunto, uma mãe que esteja em situação de pobreza, que esteja no desemprego, não tem igual direito a procurar uma oportunidade de trabalho e a ter uma creche gratuita onde deixar o seu filho?", interrogou. Para Inês de Sousa Real, "é da maior hipocrisia" a proposta o Chega.
Além do Chega e do PCP, também BE, Livre e PAN apresentaram projecto-lei para aumentar a capacidade da oferta pública de creches.
Em resposta, a deputada do Chega Felicidade Vital apelou ao "Governo que não tenha as palas ideológicas do passado". "O Chega defende aumentar a rede com recursos aos privados", disse, acrescentado que "a educação nos valores é da responsabilidade dos pais".
"Não toleramos a intervenção do Estado doutrinando as nossas crianças numa cultura que é apresentada como protectora dos marginalizados, sobre a capa da compaixão e justiça, sendo o seu único objectivo a destruição da cultura ocidental", realçou.
A deputada do PSD Sandra Pereira disse que o Governo não acompanha a proposta do Chega e que sempre defendeu a gratuitidade das creches.
"A principal preocupação do PSD e do Governo é aumentar o número de vagas, aumentar a resposta e não estar constantemente a falar em rede pública, quando existe capacidade instalada que pode e deve chegar às famílias e a todas as crianças", afirmou.
Já a deputada socialista Mara Lagriminha recordou que o Governo anterior "garantiu que o programa Creche Feliz seria implementado de forma faseada, permitindo que todas as crianças até aos 3 anos, nascidas a partir do dia 1 de Setembro de 2021", pudessem beneficiar do programa.
"Sempre que o PS teve responsabilidades governativas, não deixou de reforçar os apoios sociais à infância, assegurando o aumento do abono de família, majorando os apoios às famílias monoparentais ou com a criação da garantia para a infância", disse.