“Um esquilo tem mais direitos do que uma rapariga no Afeganistão”, acusa Meryl Streep

Actriz esteve num evento à margem da Assembleia-Geral da ONU, que se realiza em Nova Iorque, até segunda-feira, tendo chamado a atenção para a repressão dos direitos das mulheres no Afeganistão.

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Meryl Streep discursa ao lado da antiga directora-geral dos Direitos Humanos e da Mulher Asia Wardak (2.ª, esq.), da antiga ministra dos Negócios Estrangeiros da Suécia Margot Wallstrom (2.ª, dir.) e da antiga vice-presidente do Parlamento do Afeganistão Fawzia Koofi (direita) OLGA FEDOROVA/EPA
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Uma gata doméstica tem mais liberdade no Afeganistão do que uma mulher, afirmou a actriz de Hollywood Meryl Streep nas Nações Unidas, na segunda-feira, numa tentativa de levar os líderes mundiais a concentrarem-se na situação das mulheres e raparigas afegãs.

“A forma como (...) esta sociedade foi derrubada é uma advertência para o resto do mundo”, disse Streep num evento à margem da Assembleia-Geral da ONU para encorajar a inclusão das mulheres no futuro do Afeganistão.

Os taliban retomaram o poder em Agosto de 2021, quando as forças lideradas pelos EUA se retiraram após 20 anos de guerra. A ONU tem procurado uma abordagem global unificada para lidar com os taliban, que têm reprimido os direitos das mulheres.

A maioria das raparigas foi impedida de frequentar o ensino secundário e o acesso às universidades foi vedado pelos taliban. O grupo fechou os salões de beleza e restringiu as viagens das mulheres sem um tutor masculino.

“Actualmente, em Cabul, uma gata doméstica tem mais liberdade do que uma mulher. Uma gata pode sentar-se no alpendre da sua casa e sentir o sol na cara. Ela pode perseguir um esquilo no parque. Um esquilo tem mais direitos do que uma rapariga no Afeganistão de hoje, porque os parques públicos foram fechados às mulheres e às raparigas”, declarou Streep.

“Um pássaro pode cantar em Cabul, mas uma rapariga não pode e uma mulher não pode cantar em público. Isto é extraordinário”, afirmou, desafiando os líderes globais à acção: “A comunidade internacional, como um todo, se se unisse, poderia efectuar uma mudança no Afeganistão e parar a lenta asfixia de... metade da população.”

A posição da actriz foi reforçada pelas declarações do secretário-geral da ONU, António Guterres: “Sem mulheres instruídas, sem mulheres a trabalhar, incluindo em funções de liderança, e sem o reconhecimento dos direitos e liberdades de metade da sua população, o Afeganistão nunca ocupará o lugar que lhe cabe na cena mundial.”

Os responsáveis taliban tentaram justificar parcialmente as suas novas regras, afirmando que se destinam a proteger as mulheres. O regime também tem vindo a reprimir os homens mais recentemente, com a polícia da moralidade a ir bater às portas dos homens que não apareceram nas mesquitas recentemente ou a verificar aqueles que não deixaram crescer a barba. E afirmam que respeitam os direitos de acordo com a sua interpretação da lei islâmica.

No mês passado, o grupo codificou formalmente um longo conjunto de regras que regem a moralidade, com base num decreto do líder espiritual supremo dos taliban de 2022, que será aplicado pelo Ministério da Moralidade.

Muito antes da chegada dos taliban ao poder, o Afeganistão concedeu o direito de voto às mulheres em 1919, um ano antes dos Estados Unidos. Abriu as primeiras escolas para raparigas em 1921. Em 1950, o país aboliu um sistema que impunha uma segregação rigorosa entre os sexos e práticas de uso de véu, segundo a Amnistia Internacional.