Em Portugal, abre-se no sábado uma janela que quer reivindicar a paz

No Dia Internacional da Paz, a 21 de Setembro, o desafio passa por colocar à janela um pano, branco, chamando a atenção para a necessidade de valorizar a diplomacia na resolução de conflitos.

Foto
Rita Blanco, ProfJam e José Luís Peixoto são três dos porta-vozes da iniciativa #JanelaBrancaPelaPaz PÚBLICO
Ouça este artigo
00:00
04:26

O Índice Global da Paz 2024 não revela números animadores: não havia tantos conflitos desde a Segunda Guerra Mundial, e vários envolvem países de forma indirecta. Dos 195 países cuja soberania é reconhecida pela Organização das Nações Unidas (que reúne 193 Estados e ainda dois que actuam como observadores: Vaticano e Estado da Palestina), 92 estão envolvidos em conflitos fora das suas fronteiras, o maior número desde a criação do IGP. E, de acordo com a ONU, os conflitos afectam mais de dois mil milhões de pessoas, havendo actualmente perto de 120 milhões de pessoas em todo o mundo deslocadas devido a conflitos, perseguições, e outras formas de violência.

É neste contexto que nasceu um movimento, #JanelaBrancaPelaPaz, que uniu o Centro de Informação das Nações Unidas para a Europa Ocidental e a Unicef Portugal e que, no dia 21 de Setembro, próximo sábado, tem a ambição de, em vésperas do arranque da Assembleia da ONU em Nova Iorque, “apelar aos decisores mundiais, regionais e locais que privilegiem a diplomacia para resolver conflitos”, através de uma iniciativa que foi desenhada para ser “simples”.

“Qualquer pessoa, em casa ou no trabalho, com um simples pano branco — ou uma toalha, um napperon, uma fronha, um lençol — pode participar”, diz António Ferrari, assessor de comunicação para Portugal da ONU, contextualizando que “o pano branco é símbolo de tréguas, de paz, de fim das hostilidades”. No fundo, observa, em conversa com o PÚBLICO, a ideia passou por, por um lado, “lembrar a importância da paz e sublinhar que somos uns privilegiados por não termos guerra em território nacional” e, por outro, “recordar o impacto da guerra, como entrave ao progresso económico e social, como um retrocesso nos direitos humanos e um aumento da violência”. Isto, porque, lembra, “hoje, um quarto da população mundial vive em contexto de guerra e nunca houve tantos deslocados, sendo preciso sublinhar que ninguém sai de casa por capricho”.

Para ajudar os organismos nesta campanha, foram recrutadas figuras públicas, que, embora de diferentes quadrantes, consigam dar visibilidade ao movimento. “Há um grupo de porta-vozes”, começa por explicar António Ferrari, “mas a iniciativa é de e para todos.” Só que, observa, esse grupo de pessoas permite que, sobretudo através das redes sociais, se consiga chegar a mais gente. E todas, realça, não só aceitaram o desafio, como o abraçaram como uma causa própria. É o caso da actriz Rita Blanco, que, embora ciente de que não será um pano branco à janela que irá mudar o mundo, acredita que é preciso dar um primeiro passo. [Algo que dê a entender] aos grandes líderes mundiais que nós estamos atentos e que nós não estamos de acordo e que nós queremos que as coisas mudem.” E considera que o “nós” são muitos: “Ninguém hoje em dia pode estar sossegado com tudo o que está a acontecer: uma em cada cinco crianças está em situação de conflito, de guerra, com toda a violência que isso implica, o que quer dizer que, se as crianças são o futuro, o futuro do mundo está muito comprometido.”

O escritor José Luís Peixoto, que acabou por se ver contagiado pelo entusiasmo da amiga Marisa Liz, tornando-se um porta-voz do movimento, concorda com a necessidade de passar a mensagem de que há quem esteja atento e em desacordo com a via da guerra, porque, explica, “a dada altura, o conflito torna-se tão normal nas nossas vidas que dá a sensação de que estamos todos um bocadinho adormecidos”.

É o resultado, diz, de uma certa desumanização, também alimentada pela “banalização dos temas e da forma como os tratamos”. Mário Cotrim aka ProfJam vê nessa desumanização o reflexo “da paz orwelliana, onde a guerra é a paz e que a paz se faz pela guerra”. Claro, ressalva, o cenário “é muito mais complexo do que este pensamento. Mas temos de partir deste para depois conseguirmos desmantelar o sistema da guerra e perceber que a guerra realmente é guerra. E que a paz não é a guerra”, diz.

O músico, que vê neste tipo de iniciativa uma continuação daquilo que faz profissionalmente e do que é na esfera privada, admite que o género que trabalha, o rap, está muito associado a uma cultura de violência. No entanto, defende que “o rap pode fazer parte da cultura da violência como um elogio ou como um alerta”.

Já sobre o acto de colocar um pano branco à janela José Luís Peixoto valoriza o facto de constituir uma “declaração”. [É-o não só nas redes sociais, mas também para os] vizinhos, para com a nossa família, para com os que estão à nossa volta.” E Rita Blanco observa: “Se houver de repente [uma forte adesão] e nós percebermos que somos muitos e que estamos todos juntos contra isto, pode ser que isso leve a outras acções mais concretas.”

Sugerir correcção
Comentar