A vida do multimilionário Rupert Murdoch inspirou a série Succession, e a última reviravolta no mundo real poderia vir a ser o episódio mais aguardado, se a trama da HBO já não tivesse chegado ao fim: uma batalha judicial à porta fechada sobre o controlo do império mediático de Murdoch começa a 16 de Setembro e poderá determinar o futuro da Fox News e do Wall Street Journal.
Murdoch, de 93 anos, está a tentar alterar os termos do fundo irrevogável da família para garantir que os seus jornais e redes de televisão permaneçam sob o controlo do seu filho mais velho e herdeiro escolhido, Lachlan Murdoch, de acordo com o New York Times, que obteve um documento selado do tribunal que detalha o drama da sucessão.
A Reuters e outros órgãos de comunicação social estão a tentar obter acesso a registos judiciais selados e ter acesso às audiências do tribunal em Reno, Nevada, perante o comissário de sucessões Edmund J. Gorman Jr.
De acordo com uma fonte, que teve acesso aos documentos, o fundo de investimento apresenta um cenário sobre a forma como uma potencial aquisição poderia ocorrer. O fundo é o veículo através do qual o velho Murdoch controla a News Corp e a Fox, com uma participação de cerca de 40% nas acções com direito de voto de cada empresa. Murdoch detém também uma pequena quantidade de acções das empresas fora do fundo.
Após a morte de Rupert Murdoch, as acções com direito de voto da News Corp e da Fox serão transferidas para os seus quatro filhos mais velhos: Prudence, Elisabeth, Lachlan e James. Mas, potencialmente, três dos herdeiros poderiam unir-se e sobrepor-se a um quarto, criando uma batalha sobre o futuro das empresas. Isto mesmo que Lachlan Murdoch, o preferido do magnata para liderar o futuro das empresas, dirija a Fox e seja o único presidente da News Corp. Assim, a alteração proposta por Rupert Murdoch bloquearia qualquer interferência dos três irmãos de Lachlan, que são politicamente mais moderados, noticiou o Times, citando um documento confidencial do tribunal.
Lachlan Murdoch é visto como ideologicamente alinhado com o seu pai conservador. Já James Murdoch, que fez donativos a grupos políticos progressistas, demitiu-se em 2020 da direcção da News Corp, invocando divergências sobre o conteúdo editorial. James também criticou os media dos EUA por amplificarem a desinformação sobre os resultados das eleições de 2020 antes do ataque de 6 de Janeiro ao Capitólio. Organizou uma arrecadação de fundos para o Presidente dos EUA, Joe Biden, em 2021, antes que o democrata encerrasse sua campanha de reeleição.
A audiência para determinar se as alterações propostas por Rupert Murdoch ao fundo beneficiarão os seus herdeiros terá lugar numa sala de audiências de Reno, bem longe dos centros mediáticos a partir dos quais o conglomerado opera: Nova Iorque, Los Angeles, Londres e Sydney.
“Ele terá de provar que estas alterações estão a ser feitas de boa-fé”, disse Shane Jasmine Young, advogada do Nevada especializada em planeamento imobiliário. Isso significa demonstrar que quaisquer alterações não iriam “sacrificar os direitos ou discriminar qualquer uma das partes que este fundo se destina a proteger”.
Interesse público
Um grupo de organizações noticiosas, incluindo o New York Times, a CNN, a The Associated Press, a National Public Radio, o The Washington Post e a Reuters, pediram para intervir no processo, argumentando que o tribunal deveria abrir os registos e permitir o acesso aos documentos, já que o destino de uma empresa de comunicação social é de interesse público.
“Embora alguns litigantes possam desejar o secretismo e alguns tribunais satisfaçam esse desejo, este nível de selagem não passa no crivo constitucional”, escreveram os advogados da Coligação de Acesso de organizações noticiosas num memorando ao tribunal, argumentando que a Primeira Emenda exige que os processos e registos judiciais civis sejam abertos ao público.
As organizações noticiosas afirmam que o público tem interesse em saber qual dos filhos de Murdoch lhe sucederá na liderança do influente império de media, um resultado que afectará milhares de empregos, milhões de consumidores de media em todo o mundo e o panorama político.
Os porta-vozes de Lachlan, James e Elisabeth Murdoch não quiseram comentar. Um porta-voz de Rupert Murdoch remeteu as questões para o seu advogado, que não respondeu ao pedido de comentário. O advogado que representa James, Elisabeth e Prudence também não pôde ser contactado para comentar o assunto.
“A razão pela qual isto é interessante é o papel desproporcionado que a Fox (News) tem desempenhado no panorama político, nos EUA e em todo o mundo”, disse Paul Hardart, director do Programa de Entretenimento, Media e Tecnologia da Stern School of Business da Universidade de Nova Iorque. “Penso que isto é um reflexo do futuro não só do negócio, mas também da forma como os meios de comunicação conservadores serão tratados no futuro.”