Mamíferos que respiram pelo ânus e trutas mortas: eis os Prémios IgNobel

A um mês do anúncio dos Nobel, são desvendados os prémios para a ciência mais inusitada. Além da respiração pelo ânus, há experiências com pombos dentro de mísseis para os tentar guiar.

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Os investigadores aceitaram o IgNobel pelo seu trabalho sobre a ventilação anal de mamíferos Brian Snyder/REUTERS
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Depois de uma série de testes em ratinhos, ratazanas e porcos, a descoberta de uma equipa de investigação científica do Japão não podia ser mais inusitada: os mamíferos conseguem respirar pelo ânus. Mais, aquando da publicação do trabalho, estávamos em plena pandemia de covid-19, com escassez de ventiladores – algo apontado pelos cientistas japoneses – e a ventilação pelo ânus mostrava algum sucesso na sobrevivência de animais com falhas respiratórias. Agora, esta equipa é uma das vencedoras dos prémios IgNobel.

Importa não confundir com os Prémios Nobel que distinguem descobertas científicas em Física, Química e na Medicina, atribuindo ainda prémios na área da Literatura, da Paz e da Economia. Os IgNobel são uma versão inusitada destes prémios. O mote diz tudo: querem destacar trabalhos que “primeiro fazem as pessoas rir e depois pensar”.

Ora, a respiração dos mamíferos pelo ânus é um desses casos. Parece um desperdício científico e risível à primeira vista, mas na verdade este é o trabalho que sustenta um ensaio clínico que verificará se o procedimento pode mesmo tratar a insuficiência respiratória. Publicado em 2021, na revista científica Med, o estudo sobre esta hipótese de ventilação está agora na fase 1 de ensaio clínico, já com humanos.

Este é um dos dez trabalhos premiados este ano, nos quais se incluem outros estudos fascinantes que têm sido publicados em várias áreas. Por exemplo, o Prémio IgNobel da Paz distingue o trabalho de B. F. Skinner que, em 1960, conduziu várias experiências para testar a hipótese de colocar pombos vivos dentro de mísseis para que os animais guiassem a trajectória de voo – o próprio B. F. Skinner intitulou o trabalho de “maluquice”. Nascido num projecto para a Segunda Guerra Mundial (com o pouco criativo nome “Projecto Pombo”), acabou por não funcionar.

Cara ou coroa e trutas mortas

Entre os dez premiados, está ainda uma equipa europeia que venceu a categoria de Probabilidade. Através de 350.757 experiências, os investigadores mostraram que quando se atira uma moeda ao ar, o mais certo é ela aterrar voltada para o mesmo lado para o qual se atirou. Ou seja, se lançarmos a moeda com “coroa” voltada para cima, é mais provável que saia “coroa” voltada para cima quando a moeda aterra.

James Liao, da Universidade da Florida (Estados Unidos), conquistou a distinção na disciplina da Física com um peixe morto – mais concretamente, uma truta. O intuito era demonstrar que para percorrer um longo caminho não é necessário gastar energia: “Estes resultados provam experimentalmente que, sob condições adequadas, um corpo pode seguir à distância ou mesmo alcançar outro corpo a montante sem gastar qualquer energia própria.”

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James Liao recebeu uma truta durante a cerimónia dos Ig Nobel REUTERS

Foram ainda premiados os estudos sobre uma planta sul-americana (Boquila trifoliolata) que copia as folhas das plantas de plástico se estas estiverem ao lado – algo que nos pode dizer muito sobre a visão e camuflagem destas plantas, bem como um trabalho sobre as pessoas com um tempo de vida extraordinariamente longo. Saul Newman, da Universidade de Oxford (Reino Unido), indica que muitas destas pessoas vivem em locais com uma esperança de vida curta, sem certidões de nascimento e onde os erros administrativos e fraudes para receber pensões abundam. No fundo, como referiu ao diário britânico The Guardian, “virtualmente nenhum dos dados sobre as pessoas mais velhas faz sentido”.

No campo da anatomia, um prémio capilar. Sabia que a direcção para a qual o cabelo se enrola depende do local onde está? Segundo o trabalho de Roman Khonsari, do hospital universitário Necker-Enfants Malades (Paris, França), no hemisfério norte, o cabelo curva-se no sentido dos ponteiros do relógio; no hemisfério sul, já se curva no sentido anti-horário.

Desde os anos 1990 que a revista (não-científica) Annals of Improbable Research organiza este prémio. A cerimónia desta 34ª edição dos Prémios IgNobel acontece, como habitualmente, a um mês dos muito aguardados Prémios Nobel, que serão atribuídos entre 7 e 14 de Outubro. Além das gargalhadas, esta cerimónia também permite dar a conhecer investigação científica pouco ortodoxa, mas cujo contributo pode, no futuro, ser valioso para a humanidade. Por exemplo, o cientista Andre Geim venceu o IgNobel em 2000 por um trabalho em que usou ímanes para levitar sapos, mas uma década depois venceu o Nobel da Física pela sua investigação em grafeno, uma forma cristalina do carbono (descoberta em 2004) altamente transparente, flexível e condutora – e com potencial de transformar o campo da tecnologia.

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