Zacarias da Costa: Timor “está no rumo certo”, uma “democracia ao serviço do povo”

O diplomata timorense Zacarias da Costa recorda o dia 30 de Agosto de 1999, a data do referendo que, há 25 anos, garantiu a independência ao seu país. Momentos de ansiedade, mas também de alegria.

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Zacarias da Costa foi ministro dos Negócios Estrangeiros de Timor-Leste MANUEL DE ALMEIDA
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30 de Agosto de 1999 foi um dia muito especial para os timorenses, mas também para os portugueses que acompanhavam com paixão os acontecimentos em Timor-Leste. Era o dia mais aguardado, a data em que os timorenses iam decidir o seu futuro - se “aceitavam a proposta de autonomia especial ao Timor-Leste dentro do estado unitário da República da Indonésia”, ou se rejeitavam “a proposta de autonomia especial ao Timor-Leste, levando à separação de Timor-Leste da Indonésia”.

Zacarias da Costa, 60 anos, integrava então o núcleo da resistência timorense em Bruxelas, na Bélgica, mas no dia 30 deslocou-se a Lisboa para - como fez a esmagadora maioria dos timorenses, no território ou fora dele - votar no referendo. Ao PÚBLICO, lembra a grande ansiedade que viveu naqueles dias e a “grande alegria” quando, passada uma semana, se soube o resultado da votação: dos cerca de 451 mil inscritos para votar, 438 mil (98,60%) tinham ido às urnas. 78,50% rejeitaram a autonomia com a Indonésia, contra 21,50% que a desejavam.

Desde então, Zacarias da Costa tem sido um nome interveniente no caminho do jovem país, na política interna e nas relações externas de Timor-Leste. Nascido na localidade timorense de Remexio em 1964, licenciado em Humanidades pela Faculdade de Filosofia da Universidade Católica Portuguesa, ocupou o cargo de ministro dos Negócios Estrangeiros e Cooperação do IV Governo Constitucional, entre 2007 a 2012. Foi membro do Conselho de Estado, integrou o Conselho Superior de Defesa e Segurança e deputado do Parlamento Nacional. Foi um dos fundadores da Cruz Vermelha timorense. Actualmente cumpre o segundo mandato como Secretário Executivo da Comunidade dos Países de Língua Portuguesa (CPLP).

Passados 25 anos sobre o referendo, o antigo ministro acredita que, com "altos e baixos" pelo caminho, o país caminha no "rumo certo". E que Timor-Leste tem jovens políticos bem preparados para, quando chegar o momento, render a geração que lutou décadas pela independência ganha a 30 de Agosto de 1999.

Onde estava e como viveu o dia 30 de Agosto de 1999?
Nessa altura estava a residir em Bruxelas, integrava o núcleo da resistência timorense na Bélgica, mas nesse dia tive de vir para Lisboa para votar no referendo. Lembro-me também que nesse dia fomos a Fátima rezar por Timor.

E como viveu esse dia?
Com grande nervosismo e ansiedade. Sabia que o povo timorense queria muito a separação da Indonésia, mas temíamos que alguma coisa corresse mal, que houvesse mais actos de violência como os que foram ocorrendo ao longo dos anos e que se tinham acentuado nos meses que antecederam o referendo. No final tudo correu bem e alguns dias depois chegou a notícia que todos esperávamos: o povo timorense, de uma forma largamente maioritária, tinha votado pela separação da Indonésia. Tinha votado pela independência e isso deu-nos uma enorme alegria.

Qual foi o momento que considera decisivo para que tivesse havido um acordo entre Portugal e a Indonésia para que avançasse o referendo?
Acho que não houve um momento, mas vários momentos e esses ocorreram nas negociações que se verificaram entre os dois países. Foram reuniões muito duras, muito difíceis – eu participei em algumas -, mas Portugal nunca saiu do seu rumo de lutar pela realização do referendo, que a Indonésia acabou por aceitar. Estas negociações foram muito, muito importantes.

Como classifica a evolução política em Timor-Leste ao longo dos últimos 25 anos?
Uma evolução normal para um país que chegou à democracia há apenas 25 anos. Tem havido momentos altos e baixos, surgiram problemas, mas também surgiram soluções positivas e momentos de grande alegria. Uma evolução normal e igual aos outros países que chegaram à democracia há pouco tempo. O mais importante é que vamos no rumo certo.

E que rumo é esse?
O de garantir que a nossa democracia estará sempre ao serviço do povo, que garante melhorias no dia-a-dia das pessoas, que dá resposta aos seus principais anseios e que lutará sempre para que o povo tenha uma vida melhor. Que garanta o desenvolvimento sustentável do país, mas sempre a pensar no povo em primeiro lugar.

Timor tem actualmente Xanana Gusmão como primeiro-ministro e Ramos-Horta como Presidente da República. Um e outro já ocuparam estes cargos várias vezes. Que leitura faz deste facto? Timor tem tido dificuldades em encontrar uma nova geração de políticos?
Não, não tem. Neste momento há um largo número de jovens políticos a participarem na acção governativa e política, muito bem formados e com cargos importantes. Xanana Gusmão e Ramos-Horta são dois grandes nomes da resistência e da construção da nossa democracia. São duas pessoas em que o povo confia e que têm dado provas da sua dedicação a Timor-Leste. No momento certo vão aparecer novos e jovens políticos que os irão render. O povo entende que este ainda não é o momento.

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