Remessas de dinheiro entre Brasil e Portugal: que cuidados deve ter para evitar perdas

Diante do número cada vez maior de brasileiros morando e trabalhando em Portugal, o volume de dinheiro enviado para o Brasil tem crescido. Bancos e fintechs disputam esse mercado.

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Dinheiro não aceita desaforo: é muito importante escolher bem a instituição pela qual movimentará recursos entre Brasil e Portugal Leonhard Foeger
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A transferência de dinheiro entre Brasil e Portugal é uma necessidade comum para muitos brasileiros e portugueses que vivem dos dois lados do Atlântico. Seja para fazer remessas para familiares, quitar dívidas ou investir, é crucial escolher o método mais adequado para as operações, considerando custos, prazos, segurança e praticidade.

Ainda que a oferta de empresas que realizam essas transações seja grande, todo cuidado é pouco. O primeiro e mais importante passo é conferir se a firma escolhida está autorizada a operar nesse ramo. Essa informação pode ser obtida tanto no Banco de Portugal quanto no Banco Central do Brasil. Normalmente, as empresas estão ligadas a uma instituição financeira.

Mexer com dinheiro sempre causa preocupação. E não é diferente com o casal Renato Fraga, 48 anos, e Fernanda Werneck, 46 — ele, analista de TI, e ela, designer de interiores. Os dois estão há quase seis anos em Lisboa e, como deram início ao processo para a aquisição da cidadania portuguesa, cogitam vender o imóvel que têm em Petrópolis, cidade serrana do Rio de Janeiro, para dar de entrada em uma moradia em Portugal. Se o negócio for concretizado no Brasil, os recursos arrecadados com a venda serão remetidos para Portugal.

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O especialista em TI Renato Fraga e a mulher, Fernanda Werneck, design de interiores, estudam remeter dinheiro do Brasil para Portugal para comprar um imóvel Arquivo pessoal

Tradicionalmente, as remessas de dinheiro de um país para outro são feitas por meio de bancos comerciais. Essas instituições têm serviço de suporte presencial, como agências físicas e apoio de pessoal para auxiliar em caso de dúvidas e problemas. É comum que os bancos peçam comprovantes de renda para concretizar as transações, a fim de evitar a lavagem de dinheiro.

No caso dessas instituições, geralmente, os custos para as remessas são mais elevados do que naquelas que operam totalmente online. No Brasil, além das tarifas referentes ao serviço, há a cobrança do Imposto sobre Operações Financeiras (IOF), de 1,1% sobre o valor remetido. Outro dado importante: o prazo para efetivação da transferência varia de uma instituição para outra, podendo ir até 48 horas. Isso deve ser levado em conta em casos de urgência.

O baiano Régis Gomes, 38, sempre recorreu ao sistema tradicional para enviar recursos de Portugal, onde está há 17 anos, para a família que continua no Brasil. "Desconfio de tudo. Prefiro lidar com instituições que tenham representações físicas, onde haja pessoas com quem eu possa dialogar", afirma.

Ele acredita que, por isso, nunca teve problemas. "Consegui economizar uma boa quantia em euros. Além de dar suporte aos meus familiares, comprei uma fazenda no interior da Bahia, que está sob os cuidados do meu pai", relata. "Não podia colocar esse patrimônio em risco, pois foi construído com o suor do meu trabalho", acrescenta. "Isso não combina com instituições que só operam online. A internet é terra de ninguém."

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O baiano Regis Gomes sempre recorreu aos bancos tradicionais para enviar dinheiro a seus familiares no Brasil Arquivo pessoal

Mundo digital

Mas não há como negar que vivemos num mundo cada vez mais digital. E os bancos centrais têm autorizado as fintechs, instituições digitais, a operar no mercado de remessas de recursos entre países. Muitas delas asseguram que oferecem taxas de serviços mais competitivas do que as dos bancos tradicionais. Contudo, há vários pontos de atenção, entre eles, a segurança, pois nem todas as plataformas oferecem a solidez dos sistemas dos bancos.

A jornalista Lourdes Souza, 43, não vê problemas no fato de as operações das fintechs serem totalmente digitais. Ela recebe, mensalmente, dinheiro no Brasil e transfere os recursos para Portugal com o auxílio dessas empresas. "O custo da transação e a agilidade são os principais pontos que levo em consideração. Nunca houve contratempos e longas demoras nas operações, que têm se mostrado seguras", assinala.

No caso da publicitária Bárbara Simões, 39, já houve alguns transtornos com a fintech que escolheu para remeter dinheiro para o Brasil. "Fiz a transferência e os recursos demoraram dois dias para chegar ao destino. Só liberaram depois que enviei um e-mail relatando o fato", conta. "Mas continuo usando o mesmo aplicativo", ressalta.

Para a fotógrafa Isabela Rachide, 28, as operações de remessas via fintechs são mais ágeis. Ela afirma que nunca usou bancos tradicionais para enviar ou receber dinheiro em Portugal. E sempre leva em consideração as taxas de câmbio na hora das transações.​

Nesse mundo digital estão inseridas ainda as criptomoedas, que não dependem de bancos para ser transacionadas. É um sistema ponto a ponto, que permite a qualquer pessoa enviar e receber pagamentos de qualquer lugar. O problema é que não há nenhuma fiscalização nesse mercado. E as cotações das moedas digitais oscilam muito, podendo provocar perdas inesperadas.

Os especialistas explicam que as transferências de recursos por meio de criptomoedas ficam registradas em um livro contábil público, o que soa estranho para quem não tem familiaridade com esse mercado. Sendo assim, "caso se sinta inseguro se alguém lhe oferecer remessas via moedas digitais, recorra ao sistema tradicional", aconselha o advogado Bruno Gutman. Todos sabem que dinheiro não aceita desaforo.

Dinheiro vivo

Muita gente aproveita viagens para Brasil ou Portugal para carregar quantias de dinheiro que não querem enviar por intermédio do sistema financeiro. As legislações dos dois países permitem esse transporte físico em viagens internacionais. Mas atenção às regras: até 10 mil dólares (R$ 56 mil), não há exigência de declaração prévia dos valores à Receita Federal brasileira ou à Autoridade Tributária portuguesa. Acima desse volume, é obrigatória a declaração nos dois países. Como vantagens desta opção, a disponibilidade imediata do dinheiro.

Já entre as desvantagens está o limite restritivo. E, no item segurança, o transporte de dinheiro em espécie envolve riscos de perda, roubo ou apreensão, exigindo extrema cautela. Mais: as taxas para a troca dos recursos por moedas locais são desfavoráveis em aeroportos e mesmo nas casas de câmbio. Essa conversão pode gerar perdas.

A empresária Patrícia Lemos, da empresa Vou Mudar Para Portugal, é especialista em prestar serviços a brasileiros que se mudam para viver ou querem investir em terras lusitanas. Ela atua nas áreas de compra, venda e aluguel de imóveis e de câmbio. Em 2023, a empresa dela movimentou cerca de 100 milhões de euros (R$ 600 milhões). “É preciso ter educação financeira para viver em Portugal, pois estamos falando de custos em euros”, diz.

Na opinião dela, todo cuidado é pouco na hora de se fazer remessas de um país para outro, por causas das tarifas e das variações cambiais, e na aquisição física de moedas estrangeiras para as viagens. Nesse último caso, a dica é ir comprando aos poucos, com antecedência, para, ao final, ter uma taxa de conversão mais favorável.

PIX internacional

O mercado de remessas de dinheiro entre países deverá sofrer forte alteração com um mecanismo que vem sendo estudado pelo Banco Central do Brasil, o PIX internacional, que permitirá a transferências de forma instantânea, como já ocorre entre os bancos brasileiros.

Para o PIX funcionar no exterior, será necessário que as duas pontas da transação (o recebedor dos recursos e o remetente do dinheiro) tenham contas-correntes em instituições com atuação no Brasil.

Hoje, há uma alternativa ao PIX internacional. Um estabelecimento do exterior pode receber dinheiro por meio de um e-FX (facilitadoras de pagamentos internacionais). O remetente faz um PIX de sua conta-corrente no Brasil para o agente e-FX, que faz a remessa para uma instituição no país indicado.

Com a notoriedade do PIX no Brasil e sua ampla adoção pela população brasileira, tem sido cada vez mais comum as instituições ofertarem soluções voltadas ao mercado internacional. Há PIX sendo aceito na formatação alternativa em locais como Chile, Argentina, Estados Unidos e França. Isso ainda não acontece em Portugal.

O Banco Central brasileiro enxerga essas transferências como se elas estivessem ocorrendo no Brasil. Assim, tais soluções não se confundem com o produto previsto na agenda evolutiva do PIX, com interligação aos sistemas global de pagamentos instantâneos.

No curto prazo, o Banco Central vai acompanhar as iniciativas que estão em curso para avaliar as possibilidades de interligação no futuro. O Banco de Portugal não respondeu sobre possíveis conversações com a autoridade monetária brasileira para integrar o MBWay ao PIX Internacional.

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